Que a matemática está presente em
nosso cotidiano nós já sabemos, mas e em nossas pesquisas? Não me refiro aqui apenas
a cálculos para ajuste de concentração de drogas, diluições de anticorpos ou
mesmo cálculos de médias e desvios padrões. Refiro-me, sim, às pesquisas e
resultados baseados quase que exclusivamente em equações matemáticas.
De fato, análises in silico (simulação computadorizada),
baseadas em extensos cálculos matemáticos estão cada vez mais presentes nos
trabalhos da área biológica. E parecem ter grande importância em direcionar
pesquisas, reduzindo o uso de animais de laboratório, reagentes e tempo, além
de possibilitar a descoberta de novos alvos terapêuticos, indicação de toxicidade,
interações entre estruturas e mecanismos de ação.
Além disto, análises in silico podem também confirmar dados
já descritos, reforçando a consistência dos mesmos. Um exemplo disto é o
trabalho publicado recentemente na Plos
Computational biology, onde Song e colaboradores relatam, utilizando
análises in silico, a importância da
migração de neutrófilos no prognóstico da sepse grave induzida por CLP em ratos.
Baseado em longas e complexas equações, os autores avaliam a participação de
neutrófilos, bactérias, mediadores pró e anti-inflamatórios e marcadores de
dano tecidual em três compartimentos: cavidade peritoneal, sangue e pulmão, este
último considerado como um órgão passível de dano tecidual. Resultados in
silico indicam que durante o evento séptico, a ativação de neutrófilos na
circulação torna-os irresponsivos a migrar para o local da infecção e estes são,
consequentemente, sequestrados em órgãos secundários à infecção, contribuindo assim
para o dano tecidual e mortalidade na sepse grave. O interessante é que isto tem
sido demonstrado claramente, in vitro
e in vivo, em estudos desenvolvidos pelo
nosso grupo de pesquisa. O trabalho de Song e colaboradores ainda sugere que a
purificação extracorpórea do sangue aumentaria a sobrevida em torno de 18%, por
aumentar a migração de neutrófilos para o local da infecção e reduzir o sequestro
de neutrófilos para o pulmão.
É, de fato, interessante, pensar
que várias equações matemáticas juntas possam vir a nos ajudar a entender a
fisiopatologia da sepse ou outra desordem e nos direcionar para alguma terapia
realmente efetiva. Para isso, com certeza, precisaremos da ajuda de matemáticos,
físicos e estatísticos.
Fabiane Sonego
Doutoranda do Laboratório de Inflamação e Dor
Departamento de Farmacologia - FMRP/USP
Referências:
Song, S.O.K. et al. Ensemble
Models of Neutrophil Trafficking in Severe Sepsis. Plos Comput Biol (8)3,
1002422 (2012).
Shen, Y. et al. Blueprint for
antimicrobial hit discovery targeting metabolic networks. Proc. Natl Acad. Sci.
USA 107, 1082–1087 (2010).
Ellison, C.M. et al. A review
of the use of in silico methods to predict the chemistry of molecular
initiating events related to drug toxicity. Expert Opinion on Drug Metabolism
& Toxicology (7), 12, 1481-1495 (2011).
Matthews E.J. et al. Identification
of structure activity relationships for adverse effects of pharmaceuticals in
humans: C: Use of QSAR and an expert system for the estimation of the mechanism
of action of drug-induced hepatobiliary and urinary tract toxicities. Regul Toxicol
Pharmacol 54, 43–65 (2009).
Alves-Filho J.C. et al. Neutrophil paralysis in sepsis. Shock 34, 15-21 (2010).
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