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domingo, 27 de dezembro de 2015

Caspase-11 requer panexina-1 e o receptor P2X7 para mediar piroptose e choque endotóxico




É classicamente descrito que o inflamassoma não canônico induzido pela presença intracelular de lipopolissacarídeo (LPS) é importante em promover piroptose e choque endotóxico de maneira dependente de caspase-11, mas os mecanismos envolvidos nesse processo ainda não haviam sido caracterizados. Dahai Yang e colaboradores demonstraram em trabalho recentemente publicado na revista “immunity” que o canal de panexina-1 e o receptor purinérgico P2X7 estão estritamente relacionados nesse contexto.
O mecanismo descrito pelos autores demonstra que o estímulo intracelular desencadeado por LPS é capaz de ativar caspase-11 com consequente clivagem de panexina-1, que conduz a liberação de ATP, que por sua vez ativa o receptor P2X7, importante na indução de citotoxicidade. A ausência de Panexina-1 ou P2X7 foi capaz de inibir a formação de piroptose induzida por LPS citosólico.
Camundongos wild-type submetidos a dois desafios (LPS+LPS) ou (Poly IC+ LPS) sucumbiram em até 30 horas após o segundo desafio, ao passo que animais deficientes para caspase-11, panexina-1 e P2X7 permaneceram resistentes ao choque endotóxico, indicando que a ativação de caspase-11 por LPS in vivo induz rápida mortalidade de maneira dependente de panexina-1 e P2X7. Esse estudo sugere que o bloqueio de panexina-1 e P2X7 pode desempenhar papel benéfico em casos de sepse desencadeada por bactérias gram-negativas.


Referência: Dahai Yang, Yuan He, Raul Munoz-Planillo, Qin Liu, and Gabriel Nunez. Caspase-11 Requires the Pannexin-1 Channel and the Purinergic P2X7 Pore to Mediate Pyroptosis and Endotoxic Shock. Immunity. 2015 Nov 17;43 (5):923-32. doi: 10.1016/j.immuni.2015.10.009. Epub 2015 Nov 10.


Post de Pedro Alexandre Sampaio Oliveira (mestrando FMRP/USP-IBA)


sexta-feira, 25 de dezembro de 2015

Tabu na pós-graduação: a pesquisa fora da academia

Muitos de nós, pós-graduandos, iniciamos nossa carreira na pesquisa científica ainda muito jovens ao ingressar na iniciação científica durante a graduação. Apesar do começo precoce pouco conhecemos sobre as opções de empregos que o mercado nos oferece. A área acadêmica é vista como a melhor, se não a única atuação de um pesquisador. No Brasil essa associação é fortalecida, pelo fato dos investimentos em tecnologia serem provenientes de recursos públicos e em sua maioria estarem vinculados às universidades. Entretanto, a atuação na academia exige aptidão e perfil profissionais muito específicos, que a maioria dos pós-graduandos não possue ou não se identifica. Esse conflito é tão frequente, que a pesquisadora Nadia Jaber (National Cancer Institute), desenvolveu, durante sua pós-graduação, um programa de carreira para doutorandos (The PhD Career Ladder Program-PCLP). Esse programa, além de incentivar o autoconhecimento profissional, visa informar que a pesquisa possui um universo muito maior do que realmente é divulgado. O programa e a história da pesquisadora já foram tema no TED TALKS (https://www.youtube.com/watch?v=rHItLGBPsJ8)

Nadia ressalta três fatos: (i) não são todos os estudantes que se sentem realizados profissionalmente atuando na área acadêmica, (ii) nem todos possuem habilidades necessárias para isso e, (iii) não há, nas universidades, lugar para todos os doutores. Pela lógica meritocrática, você deve ser esforçado e dedicado o suficiente para ter um currículo competitivo, se destacar, superar a pressão e conseguir sua vaga. Todavia, na prática muitos estudantes estão frustrados, desmotivados, permanecem na pós-graduação “por falta de opção” ou acabam desperdiçando anos de investimentos ao desistirem do curso ou não continuarem trabalhando com pesquisa. 
Os pós-graduandos podem ser bons pesquisadores sem necessariamente se encaixarem no modelo acadêmico. Identificar uma vocação diferente e ter interesse em outros campos não deve ser visto como fracasso e vergonha, mas sim como oportunidade de contribuir com a Ciência de outras formas. Esse assunto não costuma ser abertamente discutido entre alunos, orientadores e programas de pós-graduação. Deveríamos criar espaço e até mesmo disciplinas para discussões sobre o tema. Dessa forma, teríamos maior aproveitamento das habilidades individuais e de recursos públicos investidos na pesquisa, incluindo os investimentos em intercâmbios, como o programa Ciência sem Fronteiras. 

Esse cenário se deve à desvalorização, generalização e falta de informação sobre diversos cargos como: especialista em suporte técnico, vendedor de produtos relacionados à Ciência, administrador de laboratório, empreendedor em Ciência, docente dentre outros. O Science Careers, outro site sobre o assunto, disponibiliza um teste que combina habilidades, interesses, valores pessoais e sugere carreiras para doutores seguirem (https://myidp.sciencecareers.org/). Além disso, o site dispõe relatos sobre carreiras e instruções de como se preparar para atuar em cada uma. 

A busca de informação sobre a profissão, os contatos ou networking e o preparo para atuação nos diversos campos da pesquisa, devem ter início no doutorado ou pós-doutorado, fazendo parte da formação individual de cada estudante. Reconhecer as virtudes e esclarecer os objetivos profissionais, leva à motivação e à satisfação dos discentes durante a pós-graduação. Não devemos desperdiçar mentes pensantes que poderiam ser produtivas para a Ciência, devido um modelo limitado de pós-graduação.


Post por Natalia Martinez Araújo

Doutoranda em Bioquímica e Imunologia
ICB/ UFMG

quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Benefícios da Exaustão Celular


                                                  
                                         Célula T. AJC ajcann.wordpress.com, 2007.


O curso clínico de doenças infecciosas e autoimunes varia significativamente, mesmo entre indivíduos apresentando uma mesma condição. A compreensão das bases moleculares para presença dessa heterogeneidade poderia trazer melhorias consideráveis para sua monitoração e tratamento.

Durante infecções crônicas virais, a exaustão de células T promove persistência viral e está associada com pior desfecho clínico. Contudo, não estava claro se exaustão de células T desempenharia um papel relevante em autoimunidade. Em artigo publicado na revista Nature em Julho de 2015, o grupo liderado pelo Dr. Kenneth G. C. Smith do Departamento de Medicina da Universidade de Cambridge, Cambrige, Reino unido, mostrou por análise transcriptômica que existe uma assinatura de exaustão de células T CD8+ que está associada com um clareamento pior da infecção viral e que está inversamente associada com a assinatura de coestimulação de células T CD4+, sendo capaz de predizer uma menor taxa de reincidência de doenças inflamatórias e autoimunes. Para investigar os mecanismos responsáveis pela autoimunidade reincidente, os autores analisaram o transcriptoma de células T CD4+ e CD8+ isoladas de 44 pacientes com vasculite associada a anticorpos anti-citoplasma de neutrófilos (VAA) ativa e não tratada e 24 pacientes com lúpus eritematoso sistêmico (LES) ativo e não tratado.

Utilizando diferentes estratégias de análises, eles encontraram que a assinatura gênica de células T CD4+ está associada com coestimulação e correlacionada com reincidência das doenças, enquanto a assinatura gênica de exaustão de células T CD8+ está correlacionada com baixo risco de reincidência e, dessa forma, tem prognóstico melhor. Esses dados sugerem que a assinatura transcripcional de exaustão de células T CD8+, em conjunto com a assinatura de baixa coestimulação de células T CD4+ pode estar associada com um desfecho clínico de longo prazo favorável em doenças autoimunes.

Sabe-se que a estimulação persistente do receptor de células T promove exaustão celular. De forma interessante, os autores do trabalho mostraram que coestimulação via CD2 previne o desenvolvimento do fenótipo de exaustão em células T CD8+ humanas in vitro. Esse efeito inibidor da sinalização via CD2 na exaustão poderia ser revertido por estimulação do receptor inibitório PD1. Portanto, a indução da exaustão poderia ser manipulada, pelo menos in vitro, por meio de PD1 e CD2. Analisando a expressão de assinaturas gênicas para coestimulação/exaustão em um grupo de dados independentes foi confirmada a associação entre assinatura de coestimulação e não exaustão de células T com desfechos clínicos favoráveis para terapêutica de infecção viral (vírus da hepatite C) e vacinação (febre amarela e influenza), mas desfechos clínicos pouco favoráveis para doenças inflamatórias e autoimunes (diabetes tipo 1, VAA, LES, fibrose pulmonary idiopática e dengue hemorrágica).

De forma geral, o estudo mostra que ao contrário de infecções virais, a exaustão de células T CD8+ está associada com um bom desfecho clínico em doenças inflamatórias e autoimunes. Dessa forma, a manipulação da exaustão pode ser futuramente um mecanismo terapêutico possível para suprimir autorreatividade.

Desejo a todos Boas Festas. Até o nosso próximo encontro em 2016.

Referências:
McKinney EF, Lee JC, Jayne DR, Lyons PA, Smith KG. T-cell exhaustion, co-stimulation and clinical outcome in autoimmunity and infection. Nature. 2015 Jul 30;523(7562):612-6. doi: 10.1038/nature14468. Epub 2015 Jun 29.
Wherry EJ, Kurachi M. Molecular and cellular insights into T cell exhaustion. Nat Rev Immunol. 2015 Aug;15(8):486-99. doi: 10.1038/nri3862. Review.


domingo, 20 de dezembro de 2015

ImmuNet: Uma nova ferramenta para entender o sistema imunológico humano.


       O rápido desenvolvimento de métodos de High-Throughput Sequencing, gerou o crescimento exponencial de dados públicos de diferentes ensaios experimentais de genoma em larga escala. Porém, obter informações relevantes à partir de um output obtido de diversos experimentos com questões imunológicas distintas, transforma o acesso livre aos dados de high-throughput um obstáculo. Para desobstruir o "big Data", pesquisadores da Universidade de Princeton (GORENSHTEYN et al., 2015) desenvolveram uma nova ferramenta online que prediz o papel de proteínas e genes do sistema imunitário humano em vias de sinalização e associados a doenças, o ImmuNet, disponível em: http://immunet.princeton.edu/.
            O ImmuNet é um website de acesso público e usa os dados de 38,088 experimentos, incluindo sequenciamento de larga escala e interação física de proteínas, assim, faz uma predição de novas redes de sinalização, e da interação entre os genes de interesse no contexto de processos imunológicos. Essa ferramenta vem para facilitar o uso dos dados disponíveis para geração de hipóteses, especificamente para linhas de pesquisa na imunologia. O objetivo dessa plataforma online é o de encontrar a rede mais provável de interdependências entre, por exemplo, assinaturas gênicas associadas a doenças compatíveis com os dados obtidos sob várias condições experimentais, e assim explorar a network da sinalização celular para entender o funcionamento do sistema imune (Figura 1).


Figura 1: ImmuNet, desenvolvimento e aplicações. Dados de mais de 38,000 ensaios experimentais foram coletados a partir de repositórios públicos e processadas de forma sistemática. Estes dados revelam vias de sinalização do sistema imune, e são de conhecimento prévio a partir da KEGG, e GO, assim, foram usados como input para inferir 15 networks imuno-específicas em um contexto global de relacionamento. Cada rede funcional imuno-específico prevê a associação funcional entre entidades moleculares (genes ou proteínas) específicas, a um processo biológico imunológico particular, por exemplo, processamento e apresentação de antígenos.

            Segundo os autores, a integração e interpretação do enorme conjunto de dados necessita de métodos estatísticos bem estabelecidos, que neste caso, a abordagem por inferência Baysiana seleciona primeiramente as informações conhecidas, como uma via imunológica específica, e avalia a melhor  forma de reconstruir a via alvo com as novas informações, assim, cada conjunto de dados  acrescenta novas relações funcionais entre as entidades moleculares necessárias para a via de sinalização ou processo de interesse.
            Na perspectiva de praticar a imunologia, o ImmuNet tem o potencial de acelerar a descoberta, e tornar a análise de dados de bioinformática mais acessível, além de ajudar o pesquisador a aproveitar ao máximo o conhecimento contido nos banco de dados disponíveis.

Referência:
GORENSHTEYN, D. et al. Interactive Big Data Resource to Elucidate Human Immune Pathways and Diseases. Immunity, v. 43, n. 3, p. 605–14, 15 set. 2015.


Post de Ítala Cristine Silva (mestranda FMRP/USP-IBA)


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