A maioria dos casos detectados em nosso território são causados pelo Plasmodium vivax, mas também temos P. falciparum e alguns casos de P. malariae. São vários os grupos que estudam aspectos epidemiológicos, clínicos, sociais, econômicos, culturais, e outros tantos estudam a imunologia da malária no Brasil. Eu tive a oportunidade de passar pela experiência de tentar estudar malária nas comunidades ribeirinhas em Rondônia. A foto abaixo mostra a nossa equipe em uma casinha à beira do Rio Preto, tratando toda uma família infectada com P. vivax. O maior problema que encontrei foi a logística mesmo. É tudo muito isolado e montar um laboratório no meio dessas comunidades não é nada fácil. E quando a gente percebe in situ como as pessoas se comportam e como as coisas funcionam nessas regiões, a gente enfim se toca que a implementação de medidas preventivas é quase somente utópica.
Medidas de intervenção profiláticas e terapêuticas inovadoras são então fundamentais para dar uma virada nessa situação. E como todos nós sabemos, a junção de observações vindas de modelos experimentais com abordagens clínico-epidemiológicas pode certamente ser uma ferramenta potente de geração de conhecimentos chave para guiar tais medidas de intervenção. Foi então que conheci os trabalhos de um jovem pesquisador brasileiro lá de Minas. E decidi falar sobre ele, ao invés dos PI's, para servir de incentivo e mostrar quanto promissora é essa moçada aí no Brasil. Bernardo Franklin publicou o primeiro paper em um modelo de malária murina em 2007, e o foco do trabalho foi mostrar que a ativação de células dendríticas e linfócitos T CD4+ via MyD88 pode mediar sintomas da doença, mas não é requerida para o controle imunológico dos parasitas (ver o abstract aqui). Dois anos depois, o Franklin veio mostrar, em um paper no PNAS com dados em camundongos e humanos, que o TLR9 e MyD88 são essenciais para indução inicial de IL-12 e IFN-gama e que a ativação desses mediadores favorece a hiperresponsividade aos agonistas de TLR, o que resulta em uma produção aumentada e não balanceada de mediadores pró-inflamatórios e nos sintomas sistêmicos graves da malária (esse paper você pode ver aqui). Foi então que o cara passou a seguir nessa linha “translational” e foi tentar aprofundar mais aspectos da malária humana. E então publicou outro paper bem interessante mostrando que micropartículas plasmáticas são abundantes durante a malária causada pelo P. vivax, sugerindo que, assim como na malária falciparum, essas micropartículas, na verdade vesículas liberadas por células ativadas ou em apoptose, apresentam potencial de serem biomarcadores de infecção e talvez de gravidade na malária (já este paper encontra-se ali). Mais recentemente, o Bernardo foi adiante e mostrou que níveis circulantes de ácidos nucléicos estão aumentados de acordo com a morbidade da malária causada pelo P. vivax (veja acolá), uma outra investigação claramente focada na identificação de biomarcadores da malária grave. Dentre os diversos papers desse jovem pesquisador, o que mais causou furor foi um bem recente publicado também no PNAS (veja o resumo no Pubmed). Esse paper do Franklin recebeu comentário na Nature (aqui) e também já foi comentado no nosso Blog (veja a postagem). Nesse paper em modelo experimental de malária por P. berghei ANKA, os caras mostram que a neutralização de TLR que reconhecem ácidos nucléicos tem o potencial de servir como ferramenta terapêutica na malária. Eu não conhecia o Bernardo e conversei com ele via email depois de ver a sua produção. Acho que esse espaço do SBlogI deve ser também para divulgar e disseminar gente boa com idéias legais. Resumindo, Bernardo é mais um jovem brasileiro com grande potencial e que deve ser bastante incentivado a dar contribuições cada vez mais relevantes à malária ou o que quer que seja. Vocês poderão ver o CV do Franklin no lattes. E quem sabe surgem colaborações? Boa sorte Bernardo!
Bruno, fico muito feliz pelo post e a homenagem. Principalmente vindo de um outro jovem pesquisador brilhante que admiro muito.
ResponderExcluirRealmente, enfrentar essa barra que é implementar uma base de pesquisa em área endêmica que gere conhecimento com alta qualidade científica não é pra poucos.
Já é uma tarefa difícil em qualquer área endêmica. Na Amazônia brasileira então, nem se fala. E você merece muito reconhecimento por ter realizado esse feito. Parabéns. Infelizmente os papers não são nosso diário de bordo e a grande maioria dos leitores não faz idéia da infinidade de obstáculos traspostos que estão por trás daquelas 5 ou 6 páginas de um artigo.
Espero ansioso para juntarmos nossos esforços.
Um grande abraço e o meu muito obrigado.
Bernardo S Franklin
bernardo@cpqrr.fiocruz.br
Legal. Vamos colaborar no futuro sim. Temos que valorizar o que o Brasil tem de bom e temos que fazer propaganda mesmo.
ResponderExcluirParabéns
Sei que soa como jargão, mas talvez o principal entrave para o controle da malária na Amazônia Legal seja a velha falta de vontade política.
ResponderExcluirOi Tiago
ResponderExcluirClaramente, a falta de vontade política é um importante fator contributótio para o controle não só da malária, mas de muitas doenças infecciosas no Brasil. Se a gente listar as doenças infecciosas de maior impacto na saúde pública brasileira (e issos é facilmente verificado nos sites oficiais) vamos ver que esse panorama é infelizmente uma triste verdade. Se isso é jargão ou não não importa. Se for preciso ficar batendo na tecla infinitamente também não importa. O que importa é mostrar soluções plausíveis pro nosso cenário.
Um abraço
Concordo com você, Bruno.
ResponderExcluirAliás, falei sobre a falta de vontade política porque já presenciei por diversas vezes o despreparo das autoridades quando o assunto é "malária na Amazônia Legal".
Mas você está certíssimo na sua colocação. Parabéns pelo texto.
A propósito, parabéns também ao Bernardo Franklin pela contribuição significativa para a ciência brasileira. Não o conheço pessoalmente, mas tive a oportunidade de ler vários dos seus trabalhos.
Abraços.