Desde sua
descoberta há 50 anos, as moléculas de IFN do tipo I tem sido descritas como
primeira linha de defesa em infecções virais. As principais moléculas de IFN do
tipo I incluem o IFN-α e IFN-β que são produzidos pela maioria das células. Essa
produção é desencadeada após o reconhecimento dos produtos virais e/ou
bacterianos por receptores específicos, entre eles estão os TLR3, TLR7, TLR8 e
TLR9, que em geral reconhecem o ácido nucleico viral. Este reconhecimento
também é efetuado por receptores presentes no citoplasma como MDA5 e RIG-1.
Após a produção e secreção do IFN-I pela célula, essa molécula liga-se ao seu
receptor específico e induz uma cascata de sinalização intracelular que culmina
na transcrição dos genes estimulados por IFN (ISGs). Estes genes, por sua vez,
estão envolvidos na produção de proteínas relacionadas com a resposta antiviral
como a proteína Mx que inibe a transcrição e o tráfego viral.
Por outro lado, as moléculas de IFN do tipo I
também apresentam uma função imunomoduladora como foi visto por Ziegler-Heitbrock et
al., onde
demonstraram que o IFN-α induz a expressão de IL-10 via recrutamento de IRF-1
e STAT-3. Em doenças humanas, o IFN-I tem demonstrado funções distintas: ora
protetor, como na esclerose múltipla, ora deletério, como no lúpus eritematoso
sistêmico. Em infecções virais crônicas como na hepatite C, o IFN-I tem sido
utilizado como estratégia de tratamento para estimular o controle da infecção
viral. No entanto, em alguns pacientes, esse tratamento não é eficaz e isso foi
observado principalmente naqueles indivíduos que já possuíam níveis aumentados
de IFN-I. Outro exemplo é a correlação entre a maior quantidade de IFN-I no
soro de pacientes infectados com HIV com a progressão da doença. Nesse sentido,
questionou-se o porquê dessa sinalização constante induzida por IFN-I não contribuía
para o controle viral. Neste contexto, dois grupos de pesquisadores publicaram
na revista Science em abril deste ano que a sinalização do IFN-I está envolvida
no estabelecimento da infecção viral persistente e está associada à
imunossupressão.
Em ambos os
trabalhos, os camundongos foram infectados com cepas diferentes do vírus da
coriomeningite linfocítica (LCMV): um grupo foi infectado com a cepa Armstrong
(Arm), que induz uma infecção aguda e é controlada dentro de 10 dias após a
infecção, enquanto o outro grupo de animais foi infectado com a cepa Clone 13
(Cl13) que induz infecção persistente por até 90 dias após a infecção,
mimetizando uma infecção crônica. Wilson et al. observaram uma maior e persistente expressão de ISGs
em camundongos com infecção crônica e não em camundongos com infecção aguda.
Ainda Teijaro et al. demonstraram
que as respostas do IFN-I também estavam elevadas na infecção persistente, e
ambos os grupos associaram essa persistência na sinalização do IFN-I durante a
infecção crônica com o aumento da expressão de moléculas imunossupressoras,
como IL-10 e PD-L1.
Com o objetivo
de avaliar se havia uma relação entre a expressão prolongada de ISGs e a
imunossupressão, os camundongos foram tratados com anticorpos bloqueadores do
receptor do IFN do tipo I (IFNRA1) um dia antes da infecção com a cepa Cl13 ou Arm.
O bloqueio da sinalização do IFNRA1 na infecção com Cl13 foi capaz de reduzir
os níveis de IL-10 no plasma e o número de células dendríticas imunossupressoras
expressando PD-L1 no baço, aumentou o número de células no baço (incluindo
células: DC, NK, B e T CD4 produtoras de IFN-γ), restaurou a arquitetura dos tecidos linfóides (que
normalmente é desarranjada na infecção crônica) e facilitou a eliminação do
vírus em aproximadamente 30 dias após a infecção.O controle da
infecção persistente foi associado com o aumento dos níveis plasmáticos de IFN-γ e células T CD4 específicas ao vírus, indicando que
as respostas prolongadas do IFN-I podem ter um papel no estabelecimento das
infecções virais crônicas. Entretanto o bloqueio do IFNRA1 comprometeu o
controle da cepa Arm, evidenciando a importância da sinalização do IFN-I com
potente atividade antiviral durante as infecções agudas.
Os dois
grupos ainda testaram o potencial terapêutico do bloqueio do IFNRA1 em animais
com a infecção crônica (Cl13) já estabelecida. A administração de anticorpos
anti-IFNRA1 tanto 10 dias (Teijaro et al.)
quanto 25 dias (Wilson et al.) após a infecção promoveu a eliminação da infecção
persistente. Juntos, estes dois trabalhos demonstraram o paraxodo da
sinalização do IFN-I nas infecções virais, tendo uma potente atividade
antiviral durante os estágios iniciais da infecção aguda, mas também contribuiram
para o estabelecimento e manutenção da infecção viral crônica.
Fig. 1. Balanço das funções do IFN-I. Os interferons do tipo I
(IFN-α/β) podem
controlar a replicação viral e a disseminação do vírus por meio de dois mecanismos:
respostas antivirais incluem a expressão de genes antivirais e ativação de
células imunes, e respostas imunomoduladoras incluem a expressão de moléculas
imunossupressoras, inibição de células imunes e morte celular. O saldo dessas
respostas pode variar prevalecendo os mecanismos antivirais durante as
infecções agudas e os efeitos imunomoduladores durante as infecções crônicas (Odorizzi
PM & Wherry EJ).
Post
de Luana Soares e Naiara Dejani (FMRP-IBA).
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