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quarta-feira, 5 de junho de 2013

-Imunologia, epigênese e preformacionismo


Volto a insistir em um par de ideias que, levadas a sério, demandariam uma revisão da maneira de ver e de ensinar a imunologia. Proponho brevemente uma maneira de ver a atividade imunológica como um processo epigenético. Para tanto, vou inicialmente resumir a forma tradicional de ver a atividade imunológica - a imunidade anti-infecciosa e seus deslizes: imunodeficiência, alergia e autoimunidade patogênica - para em seguida propor um modo de ver alternativo.

No entendimento tradicional, a reatividade imunológica é altamente específica e progressiva (memória imunológica) e está dirigida a antígenos que são materiais externos ao organismo (separação próprio/estranho); a maioria dos materiais estranhos estaria associada a agentes patogênicos: vírus, bactérias e parasitas. Vacinas anti-infecciosas atuariam pelo aumento desta reatividade progressiva que, porexemplo, faz com que as respostas sejam mais rápidas, intensas e duradouras. Esta é não apenas a maneira de ver do público e não-especialistas, como também da grande maioria dos imunologistas. E, apesar de ter se expandido e sofisticado imensamente no último meio século, esta tem sido a maneira dominante de ver durante muitas décadas.

Fisiologia da atividade imunológica 
A meu  ver, é necessário um entendimento alternativo que enfatize a convivialidade entre os seres vivos e ao mesmo tempo critique e justifique o abandono da noção de “tolerância imunológica específica”, que é central no entendimento moderno a partir dos anos 1950-60. Originada na Bacteriologia médica, a imunologia se desenvolveu como uma ciência dita “biomédica”, diferente de outros ramos da Biologia, como a Genética e a Bioquímica, que nasceram do estudo de plantas e de animais. Não surpreende, portanto, que em sua maioria as discussões na imunologia sejam voltadas a processos patológicos, como doenças infecciosas, alérgicas e autoimunes, e abordem menos seus aspectos fisiológicos, ligados por exemplo às relações com um imenso microbioma dito “comensal”, e com a variedade de produtos antigênicos na alimentação diária. Evidentemente, esta atividade mais fisiológica e cotidiana é aquilo que se rompe durante os episódios em que a integridade do corpo é ameaçada por doenças. Ou seja, necessariamente, o adoecer é visto como a ruptura de uma fisiologia e é esta que merece nossa atenção primária.

Na maneira de ver dominante, as doenças de fundo imunológico surgem por insuficiência (imunodeficiência), excesso (alergia) ou desvio inadequado para alvos internos (autoimunidade patogênica) de respostas imunes específicas  A ideia de “tolerância imunológica especifica”, introduzida como parte importante da teoria dominante (a teoria de selecão clonal, de Burnet, 1959), sugere que a reatividade imunológica do corpo ditigida contra seus próprios componentes é inibida (auto-tolerância), e que também seria inibida a reatividade a antígenos contatados por vias mucosas (tolerância oral, ou toleriancia mucosa). Na realidade, como discutido adiante, esta reatividade não está inibida, mas sim robustamente estabilizada, geralmente em baixos níveis e isto tem um significado completamente distinto.

Um obstáculo inevitável à clareza é a nomenclatura imunológica, que está totalmente polarizada no sentido da defesa do organismo contra um meio agressivo, como se deduz da própria ideia de “anti-corpos” e do sentido de “imunidade” como proteção anti-infecciosa. A ideia de um mundo perigoso repleto de agressores microscópicos foi herdada do período anterior à caracterização a vastidão do microbioma, quando também não conhecíamos o papel dos vírus na ontogênese e na filogênese dos vertebrados (Ryan, 2009), e não entendíamos o parasitismo como uma forma de simbiose (Gilbeert, Sapp and Tauber, 2012). O cenário atual requer uma visão mais “assimiladora” que “interceptadora” (Parnes, 2004).

Epigênese, preformacionismo e a imunologia
Um dos maiores debates da Biologia, aquele entre o preformacionismo e a epigênese, algumas vezes citado como o problema nature/nurture (herança/aprendizagem) pode ser ilustrado de forma dramática na descrição do desenvolvimento embrionário, como fizeram Mohun e Smith (2000):

“Qualquer pessoa que tenha examinado a reprodução das rãs com uma lente terá visto como os embriões aparecem rapidamente a partir de aglomerados ou pequenas bolas de muitas células aparentemente similares e formam estruturas complexas contendo  tecidos diferentes que possuem uma forma cada vez mais reconhecível. Uma questão que intrigou filósofos naturais muito antes do advento da biologia experimental é se cada célula sempre soube para quais tecidos ou órgãos ela contribuirá a formar, ou, se  cada célula “aprende” seu destino através de sua posição no embrião.” 

e então colocam a distinção entre a solução preformacionista e a proposta epigenética:

Em um extremo, podemos imaginar que o plano do corpo inteiro está preformado de alguma maneira dentro do ovo fertilizado (preformacionismo). A visão alternativa é de que as células “aprendem” seu destino durante o curso inicial do desenvolvimento embrionário, através de interações com células vizinhas e com seu meio (epigênese). Em vez de seguir independentemente baseada em instruções herdadas do zigoto, as células do embrião em desenvolvimento podem interagir com seus vizinhos, e esta comunicação pode fornecer a base para o estabelecimento de seu destino subsequente” (Mohun & Smith, 2000).

Se optarmos pela visão epigenética, que foi a adotada pelos embriologistas modernos (Mohun and Smith, 2000) reconheceremos que toda a sofisticação estrutural de um embrião surge por processos internos de interação entre suas próprias células. Se aceitarmos esta visão tão formidável em sua complexidade, por que teríamos dificuldade em imaginar que os subsistemas que compõem o organismo vertebrado, como o sistema nervoso e o sistema imune, também surgem por mecanismos “internos” ao próprio sistema e ao organismo?

Epigênese na atividade imunológica
Uma dificuldade séria e comum é supor que não há uma incompatibilidade básica entre os dois modos de ver. Poderia haver processos biológicos que se iniciam em um molde preformado, por exemplo, de DNA, e, daí em diante, ter um desenrolar epigenético. Isto é um equívoco, a epigênese e o preformacioinismo são incompatíveis. No preformacionismo, o passado continha o presente e o presente contém o futuro. Na epigênese, o que se passa é determinado instante a instante, e não há algo que “se desenrole” (como no termo desarollo, ou desenvolvimento em espanhol. 

Outra dificuldade comum é um atitude em relação ao acaso, como se o que se passa na atividade imunológica fosse determinado (especificado, guiado) por ocorrências fortuitas, ocasionais. O modo de ver epigenético é histórico, pois o que se passa é determinado instante a instante, mas depende do que se passou no instante anterior.  Não temos cinco dedos nas mãos e nos pés por acaso, mas sim por motivos históricos. A epigênese não depende de moldes preformados e não se dá ao acaso.

O conceito de epigênese era invocado por Aristóteles ao observar que o desenvolvimento de um embrião de pinto se baseava em uma sequência ordenada (histórica) de acontecimentos, na qual cada mudança dependia da mudança anterior. Neste ensaio, defendo para a imunologia um modo de ver a atividade imunológica por um prisma histórico-sistêmico no qual uma sequência histórica é decisiva e também há necessidade de inseri-la na entidade global, o ser vivo, o organismo no qual tudo isso se passa. Na imunologia tradicional, um sistema imune ainda mal definido sistemicamente, como que “habita” o organismo e o defende, sem participar de outras maneiras em sua dinâmica interna.

Trata-se também de evitar aquilo que, infelizmente, passou a se denominar “epigenômica” e que consiste em influências sobre o material nucleico (DNA, RNA) que não dependem de alterações na sequência de nucleotídeos - por exemplo, a interferência de histonas ou da metilação do DNA. Haveria, portanto, um determinismo “epigenômico”, sobeposto ao determinismo genético. Esta é uma forma de ver fundamentalmente diferente, que não reconhece as transformações estruturais contínuas, características do determinismo epigenético. Epigenética e “epigenômica”, portanto, são termos com signifcados bem diferentes.

A imunologia ainda é fortemente influenciada pela teoria de seleção clonal, de Burnet, na qual a individualidade é criticamente dependente do que se passa enquanto o organismo é imunológicamente imaturo. No período embrionário ou peri-natal, se estabeleceria a chamada “tolerância natural”, que proibe a atuação de clones “auto-reativos”, supostamente necessária para evitar as agressões e doenças “auto-imunes”. Na epigênese, os períodos iniciais são críticos porque afetam tudo o que se passa daí em diante, embora não determinem (especifiquem, guiem) o que efetivamente se passa. Assim, o que se ocorre durante a gravidez vivípara, influencia a atividade do organismo adulto através de sua epigênese.

Atualmente, existem fortes argumentos contrários à “tolerância natural” e à ideia de que exista um “discriminação self/nonself” - uma separação entre o que é próprio e o que estranho ao organismo - pois grande parte (em certo sentido, todos) os linfócitos e todas as imunoglobulinas se conectam entre si e com o organismo do qual fazem parte. Estas conexões não são patogênicas (“auto-imunes”). A noção de auto-imunidade patogênica pertence a um outro modo de ver. A própria constatação de que a especificidade dos receptores linfocitários (BCR e TCR), assim como das imunoglobulinas é muito degenerada (“poli-específica”) obriga ao abandono da “discriminação self/nonself” (Wucherpfennig et al, 2007; Wooldridge et al., 2011).

Queremos evitar o uso do conceito de “tolerância”, mas é preciso notar que além da “tolerância natural”, ou auto-tolerância, os imunologistas também falam de uma “tolerância oral”, ou “tolerância mucosa”, que descreve as consequências de contatos antigênicos iniciados por via das mucosas, principalmente pela mucosa digestiva. Estão nesta categoria os contatos diários com componentes da dieta e com produtos de um imenso microbioma com o qual o organismo convive harmonicamente. A dieta e o microbioma são, de longe, as fontes mais abundantes e contínuas de contato com materiais antigênicos. Mas o que se passa nestes contatos (via mucosas) não é o que se imagina como regra de reação: em geral, não ocorrem “respostas imunes”, nem se estabelece uma reatividade progressiva ao antígeno (“memória imunológica”). São criados patamares robustamente conservados de reatividade específica. O que ocorre nos contatos por via mucosa, portanto, não é nem imunidade, nem tolerância - no sentido de inibição da imunidade; é uma outra coisa que depende de um novo modo de ver.

Finalmente, o conceito de que antígenos e anticorpos se relacionam de forma bi-unívoca (um-a-um), que pode estar oculto no entendimento da atividade imunológica, é um sério impedimento a ser descartado. Todos os eventos imunológicos naturais são “multívocos” (muitos-a-muitos) e envolvem centenas, milhares de clones linfocitários. Esta diversidade clonal é característica da fisiologia imunológica em uma rede complexa e multiconectada. Na realidade, há indicações abundantes de que grande parte dos processos patológicos envolvem reduções da diversidade clonal, nas chamadas expansões “oligoclonais”, uma espécie de liberdade espúria na qual parte dos linfócitos se liberta de restrições impostas por suas conexões com o todo. Este modo de ver possibilita, por exemplo, uma nova interpretação do modo de ação das vacinas anti-infecciosas que não se baseia na “memória imunológica” (Pordeus et al, 2009).

Em estado nascente, as imunoglobulinas não são anticorpos
Toda criança aprende na escola que o corpo responde com a produção de anticorpos específicos quando é invadido por materiais estranhos, como nas infecções por vírus, micróbios e parasitas. Como professores, imunologistas e trabalhadores em laboratórios, nós legitimamente vemos e fazemos com que outras pessoas também vejam que, bioquimicamente, anticorpos são imunoglobulinas. Entretanto, raramente notamos que imunoglobulinas e anticorpos são entidades diferentes. Todos os anticorpos são imunoglobulinas, mas, ao surgir no organismo, nenhuma imunoglobulina deveria ser considerada um “anticorpo” porque, ao surgir, ela não possui a direcionalidade (a especificidade) que é característica dos anticorpos. Ao surgirem, as imunoglobulinas não estão dirigidas a nenhum alvo particular (um antígeno), como imaginamos que os anticorpos estejam. O processo pelo qual as imunoglobulinas são produzidas se dá independentemente de qualquer contato com o antígeno, ou antígenos, com os quais estas imunoglobulinas eventualmente reagirão. Este conhecimento é consensual e firmemente estabelecido na imunologia; não restam dúvidas quanto a isso. A ideia de que a formação de imunoglobulinas que podem servir como anticorpos precede a chegada do antígeno específico (Jerne, 1955) é, talvez, a ideia mais importante de todoa a imunologia.

Por sua vez, minha afirmação de que as imunoglobulinas nascentes não são (ainda) anticorpos, e de que elas só se tornam anticorpos durante nossas observações imunológicas (Vaz, 2011a,b) está longe de ser consensual. Esta, porém, não é uma afirmação trivial e tem várias consequências para o entendimento da atividade imunológica.

Imunoglobulinas naturais
As imunoglobulinas nascentes não são (ainda) anticorpos e em sua maioria nunca serão vistas como anticorpos, a não ser que tenham suas especificidades testadas. As chamadas de “imunoglobulinas naturais” são aquelas que podem ser colhidas em organismos sadios e não vacinados e, como veremos, não está claro que elas surjam “em resposta” ao contacto com antígenos. Por exemplo, a produção de IgM prossegue emníveis normais em animais “antigen-free”, mantidos livres do contato com antígenos (Bos et al., 1986; Haury et al., 1997).
Quando testadas em sua reatividade, essas “imunoglobulinas naturais” reagem fracamente com praticamente tudo aquilo que é experimentado, inclusive com outras imunoglobulinas (Stewart and Varela, 1989) e componentes do próprio corpo (Avrameas et al, 1981). Em testes especialmente montados para isso, testaram a reação destas imunoglobulinas simultâneamente contra grandes coleções de proteínas (“antígenos”) (Nóbrega et al., 1993; 2002; Mirilas et al., 1999; Cohen, 1993). Notou-se então que existem “padrões”, regularidades na forma com que elas reagem com estes grandes painéis de ligantes. 

Esses padrões de reatividade não se formam ao acaso. Procurados em linhagens isogênicas de camundongos eles se repetem em indivíduos geneticamente idênticos e há características nos padrões de cada linhagem. Os padrões são influenciados por genes que afetam a atividade imunológica, como genes do MHC, do Sistema Complemento, etc. (Vasconcellos et al., 1988). Os padrões estão presentes também em seres humanos, se estabelecem cedo na ontogênse e daí em diante são robustamente conservados (Mouthon et al., 1995; 1996; Lacroix-Desmazes, 1996). Mais ainda, como citamos, eles aparecem também em condições “isentas de antígenos” (antigen-free) (Bos et al, 1986; Haury et al., 1997).

Univocidade versus poli-especificidade
Como vimos, é falsa a ideia de que o organismo forma um anticorpo para cada antígeno (epitopo), e que existe uma relação bi-unívoca (um-a-um) entre antígenos e anticorpos. Nada poderia estar mais distante da realidade: existem centenas, milhares de anticorpos a reagir com cada antígeno (epitopo) e, reciprocamente, uma mesma imunoglobulina (monoclonal) pode reagir com centenas de antígenos (epitopos) diferentes; e algo similar se passa com os receptores usados pelos linfócitos T (TCR) (Wucherpfennig et al., 2007; Wooldridge et al., 2011). No jargão imunológico, diz-se que a especificidade imunológica é degenerada; ou que os receptores linfocitários são poli-específicos.

A dieta e o microbioma
Em seu viver normal, o organismo está continuamente exposto a uma enorme variedade de materiais antigênicos provenientes de duas fontes principais: sua dieta e seu microbioma. Além disso, desde que os testes de imunoglobulinas com painés de antígenos mostram que elas reagem igualmente com proteínas externas e proteínas do próprio corpo (Cohen, 1993; Madi et al., 2012;Quintana et al., 2012; Bransburg-Zabary et al., 2013), é preciso considerar também uma terceira fonte: a imunogenicidade dos componentes do próprio organismo. E, como um somatório destes dois aspectos (a multivocidade e a pluralidade de contatos), podemos imaginar que, em condições normais, a cada instante, há centenas, milhares de imunoglobulinas diferentes a reagir com cada um destes milhares de antígenos (epitopos).

A “tolerância” nunca é absoluta
Na visão tradicional, diz-se que tolerância imunológica específica é uma inibição da reatividade específica a um dado antígeno, mas este modo de ver é enganoso. Nenhum estado de “tolerância” é absoluto, sempre existe uma população, comumente reduzida de anticorpos (ou linfócitos) a reagir com um material “tolerado”. O que realmente se passa, portanto, não é uma inibição mas sim manutenção robusta de baixos níveis de reatividade a estes materiais (Verdolin et al., 2001). Assim, todo organismo normal possui abundantes “auto-anticorpos”, mas eles são formados em baixos níveis e sua concentração é robustamente estável através do viver sadio.
Respostas imunes como expressões de imunopatologia
A situação, portanto, é muito diferente da imagem clássica de que existe um repouso imunológico no qual o organismo está pronto a produzir anticorpos contra qualquer material antigênico que o penetre. O que se passa é mais fielmente representado com uma rede complexa e multiconectada de linfócitos e imunoglobulinas, em contínua reação com componentes do próprio organismo, proteínas da dieta e produtos do microbioma. Esta dinâmica de imensa complexidade tem sido analisada há décadas, por exemplo, por Irun Cohen e associados que expoem as imunoglobulinas circulantes a micro-chips onde estão ordenadas centenas de proteínas diferentes (Madi et al., 2012; Quintana et al., 2012; Bransburg-Zabary et al., 2013).

Das informações já obtidas podemos concluir que em situações fisiológicas estão sendo sempre mobilizados centenas de linfócitos e imunoglobulinas e que esta mobilização coletiva não pode ser analisada por reações diretas com um dado antígeno (epitopo, peptídeo). Este cenário ramificado contrasta com a ideia “respostas imunes específicas”, nas quais um pequeno número de clones linfocitários se expande - uma situação denominada expansão oligoclonal. Na verdade, há centenas de registros de expansões oligoclonais em uma variedade de situações patológicas, que variam de imunodeficiências congênitas (Wong and Roth,2007), a formas graves de infecções (Finger et al., 2005), a doenças alérgicas (Davies and  O’Hehir, 2004) e autoimunes (Takahashi et al., 1999).

O que não existe ainda mas é profundamente necessário, é o entendimento de que as chamadas “respostas imunes específicas” são manifestações da patologia do organismo e não de sua fisiologia. Que a fisiologia imunológica nunca está em repouso e mobiliza a rede complexa e multiconectada de linfócitos e imunoglobulinas que mantém um nível reduzido de ativação durante o viver sadio. A visão tradicional tem uma explicação histórica: a imunologia não nasceu do estudo da fisiologia do organismo, como a Bioquímica e a Genética, mas sim do estudo de doenças humanas; a própria denominação de “anti-corpos” denuncia o carácter bélico com que os fenômenos imunológicos foram incialmente descritos.

Vivemos atualmente um momento no qual as evidências de associações espantosas entre os seres vivos são de tal monta e de tal complexidade, que demandam uma revisão de nossas crenças fundamentais sobre a natureza dos animais (Gilbert, Sapp and Tauber, 2012). A imunologia pode colaborar nesta revolução conceitual com o esclarecimento de uma fisiologia baseada em uma complexidade multiconectada, que pode sofrer distúrbios patológicos quando se simplifica em expansões oligoclonais. Neste novo modo de ver, termos como “anticorpo” e “tolerância” precisarão ser reavaliados e colocados em sua devida proporção; não serão mais elementos decisivos no entendimento do que se passa. 

Bibliografia
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