O papel da vitamina A como
micronutriente essencial para a visão é conhecido há muito tempo. Seres humanos necessitam de vitamina A mas não são capazes de
sintetizá-la e portanto, é obtida somente através da dieta. A deficiência em
vitamina A é um problema de saúde público sério, especialmente em países em
desenvolvimento. A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que entre 250.000
e 500.000 crianças nos países desenvolvidos ficam cegas por ano como resultado
da falta de vitamina A.
A importância da vitamina A em
outros processos fisiológicos como reprodução, imunidade e manutenção de
mucosas já foi demonstrado mas outros estudos são necessários para o melhor
entendimento dos mecanismos envolvidos. Diversos estudos demonstram que a
vitamina A tem um papel importante na infecção e manutenção de mucosas por
influenciar certos subtipos de células T e B. A deficiência de vitamina A está
associada com defeitos na imunidade e aumento do risco de doenças infecciosas.
Esses efeitos da vitamina A são creditados ao ácido retinóico
(RA), um hormônio que controla a transcrição gênica de diversas moléculas. Na
última década, estudos têm tentado entender os mecanismos pelos quais o ácido retinóico
afeta a diferenciação celular e consequentemente o desenvolvimento do embrião. Um
recente estudo publicado na Nature mostra que a deficiência na sinalização por
ácido retinóico durante a gestação pode levar ao desenvolvimento incompleto do
sistema imune do feto com consequências irreversíveis para a vida adulta.
Já foi demonstrado que a formação de órgãos linfoides
secundários depende de um subtipo de células linfoides inatas do tipo 3 (ILC3),
as chamadas LTis ou células indutoras de tecido linfoide. Essas células, as LTi4,
são diferenciadas a partir de células ILC4 neg que recebem estímulos
locais dentro dos órgãos linfoides secundários. O estudo mostrou que a
estimulação in vitro com ácido
retinóico de células de linfonodo de embriões levou ao aumento da diferenciação
em células LTi4. Embriões de fêmeas grávidas que receberam uma dieta
rica em RA apresentaram maior proporção de células LTi4 enquanto que
a administração de um inibidor da sinalização por RA levou a diminuição dessas
células. Além disso, apesar dos embriões não apresentarem tamanho reduzido, a
inibição da sinalização por RA levou a geração de linfonodos menores e ao
incompleto desenvolvimento de placas de Peyer.
As células ILC4 neg e LTi4 expressam os
receptores de RA em maiores níveis e são capazes de responder fortemente ao
estímulo por RA. O próximo passo do estudo foi gerar um modelo animal em que o
receptor de RA (RAR) fosse nocauteado nas células envolvidas no desenvolvimento
dos órgãos linfoides no período embrionário. Foi observada uma redução no
número de LTi4 nos embriões dos camundongos nocautes. Culturas de
células ILC4 neg purificadas de animais nocautes não foram capazes
de se diferenciar em LTi4 indicando que esse processo é controlado
por sinalização celular autônoma por RA. O trabalho também demonstrou que a
regulação do fator de transcrição RORγT por RA é crítica para a diferenciação
das células LTi4.
Camundongos adultos que nasceram de fêmeas grávidas que
receberam dietas ricas em Vitamina A até o momento do nascimento da ninhada
apresentaram órgãos linfoides secundários maiores enquanto que as fêmeas que
receberam dieta deficiente em vitamina A geraram filhotes com órgãos linfoides
reduzidos. A suplementação de uma dieta com níveis normais de Vitamina A a
partir do nascimento não teve efeito no tamanho dos órgãos linfoides. Para
analisar as possíveis consequências de uma disponibilidade baixa de RA no útero
para o sistema imune, animais WT e nocautes para RAR irradiados e que receberam
células de medula óssea de animais WT duas semanas após o nascimento foram
infectados com um vírus que causa infecção pulmonar aguda. As quimeras de
animais nocautes apresentaram expansão reduzida de LTCD8+
específicos para o vírus e consequente menor capacidade de eliminação viral indicando que a eficiência das respostas imunes pode ser pré-definida no início
da vida através de sinais provenientes da dieta materna.
Estudos anteriores mostram que o desenvolvimento de órgãos
linfoides secundários é um processo rigorosamente programado. O estudo
publicado na Nature é o primeiro a sugerir que esse desenvolvimento pode ser
afetado pelo comportamento da mãe durante a gravidez. Mudanças dramáticas no
status sócio-econômico e na agricultura, tradições culturais e o aumento da
população estão afetando as dietas no mundo todo. Entender como nosso status
nutricional pode influenciar o sistema imune representa uma área de grande
importância científica.
J. RODRIGO MORA,
MAKOTO IWATA, ULRICH H. VON ANDRIAN. Vitamin effects on the immune system: vitamins
A and D take centre stage, Nat Rev Immunol., September ; 8(9): 685–698, 2008.
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