A
tolerância oral é um estado de não resposta do sistema imunológico, tanto local
quanto sistêmica, induzida pela administração oral de antígenos inócuos como as
proteínas que estão no alimento. No ambiente intestinal existem quatro
populações de células fagocíticas: células CD103+ CD11c+
CD11b+ e CD103+ CD11c+ CD11b-.
Ambas as células tem capacidade de migrar do intestino até o linfonodo
drenante, sendo que as células CD103+ CD11c+ CD11b+
induzem a diferenciação de células T reguladoras pela liberação de ácido retinóico
e TGF-β. As outras duas populações de fagócitos presentes no intestino são as
células dendríticas CD11c+ CX3CR1low e os macrófagos
CD11c+ CX3CR1high. As DC CD11c+ CX3CR1low
são ativadas durante uma resposta inflamatória intestinal e produzem IL-12,
IL-23, iNOS e TNF, além de ter a capacidade de induzir o desenvolvimento de uma
resposta de tipo Th1. Por outro lado, os macrófagos CD11c+ CX3CR1high
são de natureza anti-inflamatória, caracterizados pela produção de IL-10 que é
uma citocina necessária na reestimulação in
situ de Treg e a inibição de células T efetoras. Os macrófagos CX3CR1high
não migram para o linfonodo em condições não inflamatórias, no entanto
apresentam uma alta capacidade de capturar antígenos solúveis no lúmen do
intestino.
Mas
qual seria o mecanismo pelo qual as células dendríticas CD103+ CD11c+
CD11b+ induzem tolerância oral, sendo que essas células não conseguem
capturar antígenos solúveis? O trabalho de Mazinni e colaboradores publicado em
2014 na Immunity (Mazzini E et al., 2014)
mostra que macrófagos CD11c+ CX3CR1high capturam
o antígeno solúvel OVA por uma via dependente de CX3CR1. Uma vez
capturado, esse antígeno é transferido para as células dendríticas em um
processo dependente da formação de gap
junctions (GJ) entre ambas as células. Essas estruturas de comunicação
entre os fagócitos são constituídas principalmente pela conexina 43 (Figura 1). Mazini
e colaboradores mostram, de forma elegante, que a formação de GJ são
importantes na transferência unidirecional de antígenos solúveis e de moléculas
de MHC dos macrófagos CX3CR1high para a célula dendrítica CD103+
CD11b+. Essa transferência de antígeno dependente de GJ é importante
para a ativação de células Treg e a geração de tolerância oral frente a
antígenos de alimentos. Na ausência dessas junções do tipo gap, ou mesmo da
molécula CX3CR1, camundongos que foram submetidos a um protocolo de
indução de tolerância
oral com OVA
desenvolveram uma resposta de hipersensibilidade de tipo tardio, quando o
antígeno foi administrado na presença do adjuvante CFA.
Em
síntese, o trabalho de Mazini mostra, de uma maiera bastante elegante, como macrófagos
e células dendríticas se inter-relacionam na captura, transferência e apresentação
de antígenos solúveis, assim como na indução de tolerância oral.
Figura 1. Macrófagos intestinais e células dendríticas
colaboram na captura de antígenos presentes no lúmen intestinal. Macrófagos CX3CR1+ F4/80+
emite dendritos transepiteliais em direção ao lúmen intestinal capturando
antígenos oriundos da alimentação e os transferem para células dendríticas
CD103+CD11b+ presentes na lâmina própria. Essa
transferência de antígenos depende da molécula Cx43, que forma as gap junctions. Interessantemente, a
conexina parece participar da troca de peptídeos já complexados às moléculas de
MHC de classe II, num processo que envolve transferência de membrana. As
células dendríticas CD 103+ migram para os linfonodos mesentéricos
drenantes carregando o antígenos e, sob condições não inflamatórias, induzem
tolerância oral.
Post de Annie Pineros e Taise Natali Landgraf
(doutorandas IBA , FMRP-USP)
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