A primeira é que um novo modelo murino para a doença
de Huntington (HD) acaba de ser criado. Para quem não é familiarizado com o
tema, a HD é uma doença genética neurodegenerativa que causa
severo e progressivo declínio cognitivo e problemas psiquiátricos.
A doença é causada por uma mutação autossômica
dominante em ambas as cópias do gene da Huntingtina (acho que seria isso em português). Esse gene codifica para uma
proteína também denominada huntingtina (Htt) que é expressa em todas as células
de mamíferos, mas que é encontrada em maior concentração no cérebro.
O que leva à HD é o prolongamento de uma repetição dos nucleotídeos CAG
no gene da Htt durante a replicação do DNA. Esse prolongamento é causado por um processo conhecido como slippage da polimerase (a enzima que duplica o DNA durante a divisão celular) e resulta em uma extensão anormal da
sequência do gene. Slippage em inglês significa escorregar. E aparentemente é isso que acontece com a polimerase. É como se você estivesse lendo uma página cheia de repetições CAG (e.x. ... CAGCAGCAGCAGCAG...). Em um certo ponto da leitura você pode se confundir sobre quantos CAG você já leu, ou em que linha da página você estava e acabar incluindo ou excluindo alguns (ou muitos) CAGs extras. Por isso se diz que a polimerase escorrega na fita de DNA.
Normalmente, as pessoas possuem menos de 36 repetições
CAG no gene da Htt, o que resulta na produção da Htt normal no citoplasma das
células. Entretanto, uma sequencia de 36 ou mais repetições resulta na produção
de uma proteína Htt com diferentes características. Esta forma mutada da Htt
(mHtt) acelera a morte de alguns tipos de neurônios. Geralmente o número de
repetições está associado à gravidade e à precocidade com que os sintomas se
manifestam. Em alguns casos (7% dos casos) o número de repetições pode ser tal
que o indivíduo afetado morre antes mesmo de chegar a puberdade, o que para
muitos estudiosos é uma maneira seletiva de evitar que o gene seja passado para
a próxima geração.
Infelizmente a repetição CAG está amplamente dispersa
no nosso genoma, o que torna inviável um tratamento específico para a HD que
tenha como alvo essa repetição.
A função da Htt ainda não é exatamente clara, mas tem
sido implicada na transcrição de genes, na sinalização e transporte
intracelular. Várias funções foram descritas para a Htt a partir da observação
de camundongos geneticamente modificados
para exibir HD. O problema é que no camundongo, a Htt é importante para o
desenvolvimento embrionário e sua ausência está associada à morte dos animais ainda na
fase embrionária. Além disso, estudos em humanos revelaram que não é a ausência
da Htt que causa a doença, mas o aparente ganho de toxicidade na mHtt, a Htt
mutada. Esse aspecto é difícil de ser reproduzido em um modelo animal.
Sendo assim, até agora não havia ainda um modelo animal capaz de
recapitular a doença humana.
Felizmente agora, isso parece ser passado. Um estudo publicado em
Setembro de 2012 no Human Molecular Genetics mostra a construção do primeiro modelo
murino para a HD humana em que os animais possuem as duas cópias humanas do
gene da Htt e nenhuma cópia do gene murino. Estes animais apresentam muitas das
alterações e déficits de cognição associados com a HD humana e seu uso vai
permitir o acúmulo de novas informações que podem levar a um tratamento para
esta doença. Foi certamente um passo gigantesco nas pesquisas de HD.
Doenças como a HD são conjuntamente denominadas "trinucleotide repeate disorders" por serem causadas pelo elongamento de repetições de 3 nulceotídeos no genoma humano. Um outro exemplo desse grupo de doenças é a distrofia miotônica do tipo I (ou doença de Steinert) que também é causada por enlongamento de uma repetição CTG no gene da "myotonic distrophy protein kinase" (DMPK). Está é outra doença para qual ainda não há um tratamento inteiramente desenvolvido. Espero ainda falar mais dessa doença em uma outra oportunidade.
A 2a novidade é:
Recentemente li uma revisão escrita pela
dupla Romina Goldszmid e Giorgio
Trinchieri intitulada "The price of immunity" publicada na Nature Immunology de Outubro de 2012.
Quis dedicar a segunda parte deste post a essa revisão, por achar
que é uma revisão que todos os que se interessam por imunologia deveriam
ler.
A mim, impressionou como a revisão não só está
extremamente bem escrita, como também foi capaz de compreender um conteúdo muito
diverso em poucos parágrafos de forma clara e sucinta.
Na revisão os
autores discutem os atuais princípios sobre como se dá o intricado balanço
entre a ativação e a regulação da resposta imune para, ao mesmo tempo, combater
as infecções e minimizar o dano tecidual colateral. O duplo papel protetivo e
patogênico que resulta do mutualismo com nossa flora intestinal neste balanço
imunológico é o foco da revisão.
A riqueza da revisão está no fato de que, ao longo do
texto, os autores inserem diversos exemplos e modelos de patógenos e de doenças
em que a imunidade contra o patógeno resulta em inflamação sistêmica e dano
tecidual.
A revisão é muito completa e me senti como se
aprendesse algo novo a cada parágrafo lido.
Achei excelente e recomento a leitura.
REFERENCIAS:
Clique nos links para ter acesso aos artigos.
REFERENCIAS:
Southwell AL, et al.
A fully humanized transgenic mouse model of Huntington disease. Hum Mol Genet. 2012 Sep 21.
Goldszmid, R. S. & Trinchieri, G. The price of immunity.
Nat Immunol 13, 932–938 (2012).
Clique nos links para ter acesso aos artigos.
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