Os ITAMs (ImmunoreceptorTtyrosine-based
Activation Motif) localizados nas cadeias CD3 associadas ao TCR são
críticos para o processo de sinalização desencadeado após a interação entre os complexos
TCR:CD3 e MHC:peptídeo (MHCp). A fosforilação de seus resíduos de tirosina gera
sítios de ancoramento para tirosina-quinases, principalmente a ZAP-70,
iniciando uma cascata de eventos que culminam na ativação das células T. Estes
domínios estão amplamente distribuídos entre receptores de células hematopoiéticas,
incluindo células T e B, macrófagos e células NK. Contudo, o complexo TCR:CD3
apresenta 10 ITAMs, enquanto os outros receptores não contém mais do que 3. Este
grande número de ITAMs provavelmente exerce um importante papel em auxiliar as
células T na sua magnífica tarefa de detectar quantidades mínimas de peptídeos
estranhos associados ao MHC nas APCs.
Questões que surgem naturalmente a respeito dessa
elevada multiplicidade de ITAMs nas células T referem-se à ativação de vias de
sinalização específicas, redundância na ativação celular ou existência de
efeitos aditivos. Holst e colaboradores (2008),
utilizando camundongos retrogênicos que expressavam de 0 a 10 ITAMs funcionais
nas cadeias CD3, demonstraram que existe uma relação linear entre o número de
ITAMs funcionais e o potencial proliferativo das células T respondedoras,
enquanto a capacidade de secretar citocinas como IL-2 e IFN-γ não foi afetada.
Esta observação sugere que em algum ponto da sinalização desencadeada pela
ativação do TCR, as vias que levam à proliferação celular e à produção de
citocinas são dissociadas.
Para avaliar como as células T com baixos números de
ITAMs (2 ou 4) mantêm a capacidade de produzir citocina e verificar quais são
as vias que requerem alta multiplicidade de ITAMs, Vignali D.A.A. e colaboradores (2013) isolaram células T
CD4+ contendo 2, 4 ou 10 ITAMs funcionais para observar essas
diferenças.
Como já observado nesse modelo, células com baixa
multiplicidade de ITAMs apresentam menor proliferação, o que foi acompanhado
com menor expressão de c-Myc, uma proteína que confere sinais de sobrevivência
e proliferação. A expressão de c-Myc é regulada por sinais mediados por membros
da família de receptores Notch, entre outras vias. Células com baixa
multiplicidade de ITAMs apresentam menor expressão de Hes, indicador downstream
da ativação de Notch, além de menor quantidade de domínio intracelular ativo (transcriptionally active intracellular
domain - NICD), um fragmento observado após ativação do TCR. A
indução da expressão de c-Myc por tamoxifeno restaura a capacidade
proliferativa das células T com baixa multiplicidade de ITAMs.
Para avaliar o papel de Notch em maiores detalhes, os
genes responsáveis por codificar Notch e ADAM10, metaloproteinase responsável
pela clivagem da subunidade extracelular de Notch, foram flanqueados com loxP e após transdução com retrovírus
contendo Cre-recombinase, esses genes foram deletados. As células que não
apresentam Notch ou Adam10 demonstram deficiência na capacidade proliferativa,
porém a produção de citocinas não foi alterada. Células que apresentam Notch
mutante, incapaz de reconhecer o ligante, apresentam menor expressão de c-Myc,
demonstrando que indução de c-Myc mediado por Notch requer a ligação de Notch
ao seu ligante.
Sabendo
que Notch1 acumula no cSMAC (central supramolecular cluster), os autores
avaliaram a formação da sinapse imunológica. Analise temporal da formação da
sinapse imunológica mostram que o número de microclusters formados e a
velocidade da migração de microclusters foram similares entre células T
expressando diferentes quantidades de ITAMs. Porém as células que apresentam
baixa multiplicidade de ITAM foram incapazes de contrair, um indicativo de
sinapse madura, mesmo após 60 minuto. Esse resultados sugerem que a ausência da
formação de cSMAC prejudica a ativação de Notch e expressão de c-Myc.
Um
defeito na associação entre TCR e Vav1, proteína envolvida na reorganização do
citoesqueleto, foi o responsável pela maturação incompleta da sinapse
imunológica em células com poucos ITAMs. ZAP-70 apresenta maior afinidade por
resíduos de tirosina fosforilados e requer dois resíduos para a ligação ao TCR,
dessa forma essa quinase é capaz de deslocar Vav1 do complexo TCR. Como células
com poucos ITAMs funcionais apresentam menor número de resíduos de tirosina,
ZAP-70 se liga preferencialmente, o que impede a ligação de Vav1 ao TCR e
consequente reorganização do citoesqueleto.
Para determinar quais vias garantem a produção de
citocinas, a fosforilação de ZAP-70 e ERK foram analisadas. Tanto as células
com alta multiplicidade de ITAM como as células com baixa multiplicidade de
ITAMs apresentam similar fosforilação de ZAP-70 e ERK, o que explica por que a
produção de citocinas não foi afetada em células com poucos ITAMs funcionais.
Esses
resultados sugerem que as vias induzidas pelo TCR que culminam na produção de
citocinas e proliferação são divergentes, o que permite ao complexo TCR-CD3
promover funções efetoras limitadas. O programa completo de diferenciação e
função de células T pode ocorrer após estimulação ótima do TCR, como observado
nas respostas de células com 2, 4 e 10 ITAM a agonistas forte e fraco. Isso habilita
o complexo TCR, e talvez outros complexos de receptores de sinalização, a orquestrar
uma série de eventos funcionais, fornecendo ao TCR o controle como “reostato”
sob a qualidade de resposta efetora.
Post
de Mariana Benício e Thaís Bertolini (IBA- FMRP-USP)
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