Nov 6. Na minha cabeça de menino, o Japão era a terra do National Kid, de
Godzilla, dos terremotos, e das ondas gigantes que eu via na TV. Mais tarde descobri que o Japão era isso e muito mais… O Japão é a terra da beleza, da
delicadeza, e da elegância.
A primeira vez foi em 88. Acordei e da cama e ao esticar o braço bati na parede. Pobreza. Comia
curry com arroz na estação, porque era mais barato. Fui pra Kyoto pro congresso mundial de
endocrinologia, falar dos primeiros bichos que tinha feito. Do meeting não me lembro muito. Lembro dum calor
federal. Lembro de ver o agora imperador Akihito e sua mulher, na recepção do congresso. Recepção na qual também vi médicos brasileiros jogando moeda pra
engasgar os peixes ornamentais. Lance só suplantado em elegância pelo berro de um compatriota, reverberando nas paredes dos
Invalides em Paris: não te disse que aquele filho da puta do Napoleão tava enterrado aqui?
Que mais lembro? Lembro de
pachinko, das lojas de jogo, das grandes lojas onde podíamos comprar tudo, até um mini saxofone elétrico que comprei e que nunca
aprendi a tocar. Só encher o saco das minhas filhas. E de comprar uns pratos bonitos. Lembro
de voltar e ir comer num grego. E me sentir um porco ocidental. E de trabalhar
como um mouro pra escrever minha tese de doutorado em um mês.
Depois em 2002, aí feito bacana, como convidado, pra
falar na Sociedade Japonesa de Imunologia. Foi em Tóquio em Shinjuku. Muito
tratamento. Depois fiz uma pequena
tour, falando, vendo. Kyoto, onde vi outra vez os templos e fui levado para
jantar num buraco na parede onde me serviram a comida mais fantástica da vida: Kaiseki.
Dessa vez, em Tóquio, a primeira descoberta foi uma
sopa de cogumelos. Calma aí. É outono. Uma sopa com aqueles espaguetes calibrados, udon. Maravilha,
maravilha. Andamos por Ginza, e fomos a Tsukiji, o grande mercado de peixes,
que não aceita mais turista. Turista só às 9. E eram cinco e meia. Fomos
comer um sushi de café da manhã ali perto, e de lá fomos ate Asakusa, ver o grande templo. Pegamos um metro pra o Meiji
shrine que é um dos lugares que eu mais gosto em Tóquio, e vimos as crianças mais lindas, vestidas de kimono,
festejando os aniversários de 7-5-3 anos de vida (mês que vem boto um link pras fotos.
Tirei 6 mil dessa vez, umas duas vão prestar).
Esta viagem foi uma mistura de férias e alguns talks. Depois de Tóquio, Gláucia e eu fomos pra Kanazawa, que
fica na costa oeste. Naofumi Mukaida, diretor do instituto do câncer da Universidade de Kanazawa,
foi nos pegar no aeroporto. Acordamos chumbados, tomamos um café no hotel e estamos até hoje pagando a conta. Pior não foi isso. Chovia. Chovia e eu
pensava, que merda. Fomos passear assim mesmo, na chuva, no Kenrokuen, um dos 3
jardins mais bonitos do Japão.
Mukaida veio nos pegar às 3 e fomos lá pro instituto dele. Ele nos levou
a uma sala grande da diretoria e nos serviu um chá verde. Ai veio um assistant
professor dele (mais sobre a vida acadêmica japonesa abaixo) e mostrou seu trabalho. Interessante, tinha que
ver com o papel de CCR2 no controle do influxo das células dendríticas no timo. Bom, aí veio o talk. Fomos jantar num lugar legal, e lá pelas tantas, depois do saquê, a baba escorria e eu estava semi
comatoso. No dia seguinte, acordei como um Apolo (acho que foi o cogumelo com o
saquê), e fomos passear pela cidade.
Entramos no mercado onde vimos mais cogumelos e uns caranguejos gigantes. Vimos
caranguejo a 200 dólares. Sério. Fomos em direção ao museu de arte moderna e no caminho, batemos, puro instinto, num
shrine. Ah, lá tinha mais criança no 7-5-3, e em determinado momento descobrimos um jardim graças a um japonês que insistia em nos apontar o
lugar. Caraca. O lugar era lindíssimo, dessas coisas de cair o queixo. Fomos pro museu que
foi meio decepcionante, exceto que tinha uma instalação no meio de um pátio. Uma sala de vidro no centro,
com um microfone. Do lado de fora uma guarda chuva aberto que rodava, e uma
bacia de água com uma mangueira dentro. Pra ativar a "arte" você tinha que falar no microfone. Veio
uma japonesa, gritou e nada. Cantou e nada. Depois veio um grupo de meninos e
um sussurrou, o guarda chuva rodou, rodou e a mangueira bateu desesperada
dentro da bacia. Eu fiquei olhando ali, besta. Demos uma volta, vimos outras
leseiras mais e ao sair me deu vontade de ser artista. E resolvi testar se “a arte” era universal, se entendia português e tal. Não tive dúvida. Fui lá e disse bem quietinho no
microfone: bundinha. Um delírio, "a arte" alucinou…
Nov 14. Em Osaka, demoramos feito baratas jetlegadas para encontrar
o hotel que ficava em cima da Namba station. Deixamos as malas lá e saímos em direção a Koyasan, na montanha. Chegamos
ao nosso destino por volta das 3, um mosteiro budista, perto de uma das grandes
atrações de Koyasan, Okunoin, um mausoléu enorme numa floresta de ciprestes
altíssimos. Caminhamos na chuva,
maravilhados. Voltamos ao mosteiro às 4 e meia, tomamos um banho quente, vestimos nossos quimonos e os
monges nos serviram um jantar vegetariano, maravilhoso. No outro dia de manhã, acordamos às seis e fomos ver um ritual
budista, 40 minutos de incenso, com direito a gongo, cantoria, e uma profunda
paz. Saímos pra passear e ver templo, jardins, etc. Vimos o Kongobuji onde está o maior jardim de pedras do Japão. Vimos as cores mais lindas, as
maple trees incendiando o azul do céu de vermelho, as ginko trees de amarelo. Um negócio lindíssimo. Toda Koyasan é patrimônio da humanidade, esta completando
1200 anos de existência. Voltamos pra Osaka, contraste maior impossível. O hotel era muito bom, 32o
andar, dava pra ver a cidade se estendendo sem fim. Osamu Yoshie, veio nos
encontrar. Osamu descobriu muitas quimiocinas, incluindo aí CCL21, CCL20, CCL28, receptores, o
escambau. E escreveu com Albert Zlotnik, a famosa revisão na Immunity (que repetiram esse
ano), onde propunham a atual nomenclatura das quimiocinas que nos livrou pra
sempre de IP-10, MIG, MCP, RANTES e outras leseiras mais.
Saímos pra jantar lá perto. No pequeno trajeto, uma
outra observação. A cidade tem um edge diferente, é também enorme. Tokyo-Yokohama e
Osaka-Kobe, são megacities sendo que Tóquio ganha, é a maior cidade do mundo. No dia seguinte saímos cedo pra Nara. Embaixo de
chuva. Vimos o grande Buda, o Kasuga shrine lindíssimo, com suas mil lanternas de
pedra e bronze, e Narimachi, onde almoçamos num lugar muito tranquilo e fomos atendidos da maneira mais gentil.
Sem duvida, o melhor lugar para turismo é o Japão. Não existe serviço melhor no mundo. Ponto. Voltamos a Osaka e pegamos os ônibus para Tokushima. Yousuke
Takahama veio nos pegar. Yousuke é meu colaborador e trabalha no timo. Conheci dois professores que
trabalham no departamento dele.
Depois dei meu seminário e fomos jantar e ele nos apresentou a um troço chamado Chouchou, um drink.
Fiquei muito fã não. Falamos de ciência no Japão. Carreiras. Aqui todo mundo tem
salário pago pelo governo, não vem da grant. Depois do postdoc você passa pra assistant e depois pra associate
professor debaixo de um lord shogun. Mais tarde, quando alguém muda de cidade, ou morre, abre
vaga e você pode então mudar, virar professor, e aí então ter sua linha própria de pesquisa. Meio brutal, não acham? Yousuke toca baixo e tem uma banda chamada, pra variar, Negative selection. Tocou em Kobe no congresso internacional. Ele me mostrou
uns resultados interessantes com um cre knockin em células epiteliais do córtex. Os caras que são professores independentes também mostraram muita coisa
interessante. Um descobriu que uma mutação em Tyk2 causa hyper IgE syndrome.
O outro trabalhou com Honjo, muito bom mesmo. Ele nos deu uma recomendação de um restaurante kaiseki em
Kyoto, pra onde fomos a seguir...
Mas
isso fica pro próximo post….
PS. Daniel Mucida, Bernardo, Fred,
Gláucia e eu fomos anteontem ao Carnegie Hall ver o nosso príncipe do samba (samba é uma palavra meio japa). A elegância no título desse post é Japão e é Paulinho. Sumário de um mês de sonho. Viva o Japão, viva Paulinho da Viola!
Bah, eu sabia que este post seria o máximo... e 100% agree Paulinho rules! bjs
ResponderExcluirGrande Sergio! Concordo totalmente com suas impressoes sobre o show otimo e o Japao. Apenas tive mais sorte sobre o mercadao de peixes, quando consegui visita-lo na otima companhia do Basso e do Francisco Quintana, as 6 da manha, depois de dormir numa capsula-hotel (afinal la eh caro e nao estavamos com a mordomia toda :-)
ResponderExcluirAbraco!
Ah Cris, foi bom mesmo. Ferias e show. E vejo que voce, Fred, eu, (e o resto do Brasil), amamos Paulinho.
ResponderExcluirDr Sergio, fiquei curioso para ver as 6 mil fotos. Acredito que muito mais do que duas vão prestar (rs).
ResponderExcluirOpa Walter, espero que sim...abracos
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