O propósito da memória imunológica é proteger eficientemente o hospedeiro frente uma reinfecção e controlar infecções persistentes, e isto só é possível graças ao elevado potencial citotóxico, produção de citocinas, e rápida resposta destas células comparada às células naive. No entanto, estas características são válidas especialmente para as infecções agudas, onde as células T CD8+ de memória foram e ainda são, de fato, melhor estudadas e caracterizadas. Porém, recentes estudos começam a abordar as células T de memória nas infecções crônicas, visando gerar conhecimentos que auxiliem no desenvolvimento de vacinas e/ou terapias eficazes para infecções como HIV, HCV, HTLV-1 entre outras.
Mas afinal, o que há de diferente na resposta das células de memória durante uma infecção crônica? Nestas condições, onde a infecção persiste após a fase efetora da resposta imune, fatores como a carga viral, o contínuo estímulo das células T por estes antígenos e/ou a perda do auxílio das células T CD4+, leva ao estado de exaustão celular (Wherry, 2011). As células T exauridas apresentam uma disfunção, caracterizada pela perda da capacidade funcional, onde linfócitos T passam progressivamente a expressar múltiplos receptores inibidores e um estado transcricional distinto das células T efetoras funcionais e de memória, o número destas células diminui e a deleção de células T vírus-específicas ocorre em estados mais avançados de exaustão.
A expressão de receptores de inibição como o PD1, tem sido postulado como marcador do estado de exaustão de células T CD8+ HCV-específicas durante infecção crônica pelo vírus da hepatite C. De fato, análises de pacientes com infecção crônica pelo HCV demonstraram altos níveis de expressão de PD1 nas células T CD8+ HCV-específicas e o bloqueio da sinalização PD-1 restaurou as funções efetoras destas células. Ainda neste contexto, outra molécula co-estimuladora identificada em células T CD8+ vírus-específica exauridas, é o receptor de células NK 2B4 (CD244), que embora inicialmente descrito como ativador da função efetora das células NK e de célula T, aparece em trabalhos recentes como um receptor de papel duplo, podendo ativar ou inibir a função de células NK.
Uma vez que 2B4 está expresso em células T CD8+ vírus-específicas exauridas, seu papel no controle da função de células T CD8+ durante infecções crônicas foi investigado por Schlaphoff et al., 2011. O trabalho demonstrou que o receptor 2B4 está expresso em células T CD8+ vírus-específicas durante infecções agudas e crônicas, no entanto os níveis de expressão de 2B4 foram maiores durante as infecções crônicas. Além disso, Schlaphoff et al. demonstraram que a ligação de 2B4 pode tanto ativar quanto inibir as funções das células T CD8+ vírus-específicas, como proliferação, citotoxicidade e produção de citocinas. Esta função dupla de 2B4 está diretamente relacionada com os níveis de expressão desta molécula na superfície celular (altos níveis de 2B4 inibem as funções efetoras celulares enquanto baixos níveis aumentam) e a disponibilidade intracelular da molécula adaptadora SAP (responsável pela sinalização ativadora das funções celulares). Estes resultados apoiam a hipótese que 2B4 desempenha um papel na regulação das funções de células T CD8+, podendo desta maneira, servir como um novo marcador de exaustão celular e ainda como uma molécula alvo para o desenvolvimento de novas terapias para a infecção crônica pelo HCV.
Em encontro a estes dados, e indo mais além nesta discussão envolvendo células T de memória em infecções crônicas, West et al. (2011) vem confrontar nosso pré-conceito de que as células T de memória são sempre melhores que as células naive no combate as infecções. No trabalho, os autores investigam o papel das células T CD8+ de memória e naive durante ambas as infecções aguda e crônica pelo vírus da coriomeningite linfocítica (LCMV) clone 13 e pela primeira vez investiga o papel das células T CD4+ na resposta secundária, chamando a atenção para este subtipo celular no desenvolvimento de futuras vacinas. Os resultados demonstraram que as células T de memória são melhores que as naive SE estiverem em um número suficiente para resolver rapidamente a infecção. Porém, quando a infecção não é controlada rapidamente, devido à alta carga viral ou persistência, a eficácia das células de memória é diminuída, ao contrário do que acontece com as células naive que se mostram melhores no combate a infecção neste cenário. Esta disfunção das células de memória se deve ao bloqueio da proliferação, acompanhado da regulação seletiva do receptor 2B4. Os autores mostraram ainda que a capacidade citotóxica das células de memória é recuperada quando existe um número suficiente de células T CD4+ auxiliando o curso da infecção.
Post de Gabriela Scortegagna; Thais Herrero e Eduardo Crosara
Referências
Hill. When the Going Gets Tough, Memory T Cells Check Out. Immunity, 35, 158-160, August 26, 2011.
West et al. Tight Regulation of Memory CD8+ T Cells Limits Their Effectiveness during Sustained High Viral Load. Immunity 35, 285–298, August 26, 2011.
Schlaphoff et al. Dual Function of the NK Cell Receptor 2B4 (CD244) in the Regulation of HCV-specific CD8+ T Cells. Plos Pathog 2011 May; 7(5):e1002045
Wherry. T cell exhaustion. Nature Immunology 12, 492–499 (2011).
Hansen et al. Profound early control of highly pathogenic SIV by an effector memory T-cell vaccine. Nature 473, 523–527. (2011).
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