BLOG DA SOCIEDADE
BRASILEIRA DE IMUNOLOGIA
Acompanhe-nos:

Translate

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Os herois que não estão nas camisetas


















Outro dia no meu lab meeting, uma pessoa estava mostrando um paper e fez um comentário…Também, esse paper é de 95…Pudera, um troço antediluviano…Nessa época o povo do Facebook não tinha nem nascido…Isso sem falar que o Brasil não tinha nem sido descoberto…Mas, convenhamos, o fato do paper ter sido publicado ontem não significa que esteja certo…Nem que o de 95 esteja errado…Bob Coffman (o do Th1/Th2), me disse uma vez que o que ele tinha feito de importante na vida se devia a imunoarqueologia. Simples: os problemas estão ai há muito tempo, não surgiram hoje. Ele, vivíssimo, deu umas garimpadas nessas minas velhas. Os métodos eram diferentes, os nomes idem. Mas os problemas eram (e são) os mesmos.

Começei com essa estória, porque o que eu quero falar mesmo hoje é sobre o passado (embora falar sobre o futuro seja sempre mais tchan, se é que voces entendem o que é tchan). Esse negócio de sistema, de “oma”, parece o negócio mais moderno do mundo. Não é. Nossos colegas americanos estão sempre botando apelido nas coisas. E apelido é nome novo. Suspeito que um grego na antiguidade deve ter pensado no conceito de sistema…No século 18 Alexander von Humboldt (o sujeito da foto aí de cima) já tinha dito: Tudo é interconectado.

Fora essa sacação que tudo está conectado, Humboldt pensou e viveu a ciência de um jeito extraordinário. Foi multiplo. Contribuiu para mineralogia, geologia, botânica, zoologia, geografia, antropologia, etc. A ambição dele era explorar, entender, e fez da America Latina (Venezuela, Peru, Colombia, Equador, Cuba, Mexico) o seu laboratório. Pelo que fez pela America Latina, dá de dez a zero em muito superheroi latinoamericano. Em Berlim, embaixo dessa estátua está escrito: A Humboldt, segundo descobridor de Cuba, homenagem da Universidade de Havana. Na cidade do México, outro monumento o chama de benemérito da patria. Se voce não leu ainda sobre o camarada, de uma olhada nesse livro: Humboldt's Cosmos de Gerald Helferich. Humboldt foi decisivo pra que Darwin resolvesse ser naturalista. Palavra do próprio Darwin.

Para Humboldt ciência e vida eram um continuo, parte do tudo. Ele mostrou que a paixão pelo desconhecido não tem data, nem moradia. Se meteu pela América, sem lenço, com documento, e principalmente, com muito mosquito. Teve sorte (conseguiu um salvo conduto do rei da Espanha para explorar o novo mundo), teve azar (um pedaço do tesouro botânico que ele embarcou se perdeu no meio do mar) e deixou muitas coisas escritas no tempo. Uma delas é que pra fazer grande tem que se meter de cara no mundo. E não dicotomizar: tipo isso aqui é minha vida e isso aqui é minha ciência. Que eu saiba, minha ciência toma banho de mar comigo… Lendo sobre ele refleti mil vezes sobre os meus professores, sobre os biólogos brasileiros. Quando estive na UFPE recentemente fui dar uma palestra no LIKA. No auditório havia uns retratos enormes de Pirajá da Silva, Carlos Chagas, Oswaldo Cruz, e outros cientistas. Esses cientistas ajudaram muito a biologia brasileira, fizeram descobertas fundamentais num tempo em que os recursos eram risíveis, e estudaram muitos problemas que ainda hoje estão em aberto. Outros herois latinoamericanos. Mas, que eu saiba, não tem nenhum livro sobre a vida deles. Nao tem nenhuma novela, nenhum Carlos Chagas, filho do Brasil… Há cem anos (+1) Chagas descrevia a doenca que leva seu nome, há cinquenta anos morria Pirajá…A gente sabe muito pouco sobre eles…O Barral, porque voce não se anima a escrever essas historias?

Comente com o Facebook :

13 comentários:

  1. Pra maioria dos cientistas de hoje, talvez falte o entusiasmo pela descoberta em si, por explorar o desconhecido com prazer, pela própria ciência. Porém, nos vejo constantemente contaminados pelo sistema que se tornou a pesquisa. Não que não seja importante defender teses, publicar... isso é essencial! Contudo, a cartilha que somos obrigados a seguir e a pressão que isso desencadeia, faz-nos cada dia mais distantes de nos tornarmos um desses heróis do passado.

    ResponderExcluir
  2. Uma boa lembrança de que precisamos conhecer e reconhecer os nossos heróis brasileiros, na ciência e fora dela.
    O estudo “Percepção Pública da Ciência e Tecnologia”, realizado pelo MCT no fim de 2010 com mais de 2 mil pessoas em todo o país, mostra um crescente interesse dos brasileiros pela ciência. Contudo, poucos se lembram dos nomes de cientistas brasileiros.
    Quanto a escrever estas histórias, gostaria de ter esta capacidade....

    ResponderExcluir
  3. Excelente post. Achei o máximo a "idéia" que as "omas" não são estudos de hoje, e que integração já é uma abordagem antiga, mas com embalagem nova :)
    Sobre os pesquisadores "antigos" sempre viajo nas fotos deles quando assisto palestras no auditorio citado. Fico imaginando como se comportavam no lab, como eram com os orientandos... Alguem ja deve ter dito que com um passo para trás avançamos ate dois para frente - olhar para o passado pode ensinar muito com seguir melhor para o futuro.

    ResponderExcluir
  4. Pessoal, obrigado pelos comentarios. Aqui vai o link pro livro:

    http://www.amazon.com/Humboldts-Cosmos-Gerard-Helferich/dp/1592401066

    ResponderExcluir
  5. Professor Segio,
    Seus textos são sempre um enorme prazer de serem lidos. Obrigada!

    ResponderExcluir
  6. Excelente post Professor Sergio. Fiquei muito curioso e interessado pelo livro.
    Segue no link abaixo uma indicação de um livro sobre Carlos Chagas

    http://revistapesquisa.fapesp.br/?art=6364&bd=3&pg=1&lg

    ResponderExcluir
  7. opa Rodrigo, muito obrigado pela dica. Quando eu for ao Brasil vou procurar.Voce ja leu? O que vc achou? Escreva pro Blog..
    Abracos

    ResponderExcluir
  8. A Editora FIOCRUZ tem 3 livros sobre Oswaldo Cruz
    "Conheça três livros da Editora Fiocruz que retratam o patrono da Fundação"
    http://www.fiocruz.br/ccs/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=616&sid=9
    Louis Pasteur & Oswaldo Cruz: inovação e tradição em saúde

    Nísia Trindade Lima e Marie-Hélène Marchand (Orgs.)

    Organizado como parte das comemorações do Ano do Brasil na França, o livro é fruto da cooperação entre a Fundação Oswaldo Cruz e o Instituto Pasteur. Apresenta a história da contribuição científica de Pasteur e Oswaldo Cruz, relata os desafios atuais para as relações entre pesquisa em saúde e melhoria nas condições de saúde das sociedades em desenvolvimento, aborda os investimentos em políticas de saúde em nível internacional e o papel do Instituto Pasteur e finaliza relembrando a histórica parceria entre os dois institutos.
    ISBN: 85-7541-067-9. 2005. 340p., il. Co-edição com a Fundação BNP Paribas - Brasil.

    Vida e obra de Oswaldo Cruz

    Clementino Fraga

    Lançado após três décadas de sua primeira e única edição pela Livraria José Olympio Editora, este livro retrata um extraordinário momento da saúde pública brasileira. Trata-se de uma reedição da biografia de Oswaldo Cruz escrita por Clementino Fraga e lançado no ano de 1972. Representa uma bela e delicada homenagem do discípulo a seu mestre, ambos imortalizados na história da saúde pública no Brasil.
    ISBN: 85-89697-04-5-. 2005. 2ª edição. 240p.il.

    Oswaldo Cruz: a construção de um mito na ciência brasileira

    Nara Britto, 1ª reimpressão revista

    A autora retoma um tema recorrente da vida social, o da construção ideológica do mito, através da figura de Oswaldo Cruz, em quem realidade e imaginário se misturam de maneira inextricável. Conduz-nos ao momento em que, morto, Oswaldo Cruz passa a vivenciar um processo de mitificação, de canonização, e de sua transformação em totem da tribo dos médicos sanitaristas. Contextualiza a obra no interior do movimento nacionalista despertado pela guerra mundial, na crença ingênua no poder da ciência e no movimento de interiorização brasileiro, terreno fértil para criação das bandeiras de Oswaldo Cruz e do movimento sanitário nacional.
    ISBN 85-85676-09-4. 1995. 111p.

    ResponderExcluir
  9. Maravilha esse post do Sérgio. Já estou aguardando o próximo.

    ResponderExcluir
  10. Adorei o post !!!
    É normal que as gerações mais novas pensem ser mais geniais que as anteriores devido principalmente a tecnologia. Estou lendo um livro que conta um pouco sobre a história da imunologia e a relação (problema) com as emoções:
    The Balance Within: The Science Connecting Health and Emotions. Esther M. Sternberg MD (amazon)

    ResponderExcluir
  11. Excelente post!
    Recomendo a leitura de Sonhos Tropicais, um romance do Moacyr Scliar que aborda a trajetoria de Oswaldo Cruz.

    ResponderExcluir
  12. Todo dia a gente descobre uma coisa nova...Obrigado Patricia, Rodrigo, Barral, e anonimo pelas dicas dos livros que nao conhecia e obrigado Joao pelo comentario tao gentil.
    O placar agora e' O. Cruz 4, Chagas 1 e Piraja, zero... Ainda e' muito pouco...Injustica braba com eles...

    ResponderExcluir

©SBI Sociedade Brasileira de Imunologia. Desenvolvido por: