A ativação de mecanismos de
imunidade inata após o reconhecimento de patógenos resulta na expressão de
diversos genes, como os de citocinas por exemplo, sendo que as vias de
sinalização celular bem como os fatores de transcrição envolvidos já são muito
bem descritos e um conceito bem conhecido na imunologia. No entanto, os fatores
de regulação epigenética, responsáveis pelo controle da expressão gênica, ainda
são pouco explorados. A metilação do DNA, modificação de histonas ou até mesmo
RNAs não codificantes são mecanismos críticos para o controle da expressão
gênica, e já bem descritos nos processos de diferenciação celular. Outro aspecto
muito interessante, e que vêm sendo cada vez mais estudado, são as modificações
epigenéticas induzidas por patógenos. Em 2008 o grupo do Dr. Steve Kunkel,
utilizando modelos experimentais de sepse, demonstrou que animais que
sobreviveram ao choque séptico apresentavam células dendríticas cronicamente
deficientes na produção de IL-12 e consequentemente susceptíveis à infecção por
Aspergillus fumigatus. Essa imunossupressão pós-sepsis foi explicada
devido à redução de H3K4me3 e aumento de H3K27me3 no
promotor da Il12, que
são modificações de histona relacionadas à ativação e à repressão da
transcrição, respectivamente (Blood. 2008 Feb 15;111(4):1797-804). Em 2010, o mesmo grupo também demonstrou que células Th1 e Th2
perderam a capacidade de ativação e função efetora devido a presença de
H3K27me3 nas regiões promotoras de Ifng e
Gata3, respectivamente.
Em uma publicação mais
recente, Schiehe e colaboradores (Nat Immunol. 2015 Jan;16(1):67-74.) demonstraram que mecanismos de regulação epigenética estão
envolvidos na susceptibilidade à infecções bacterianas pós-infecção pelo vírus Influenza.
O grupo demonstrou que IFNs do tipo I produzidos em resposta ao vírus induzem
maior expressão da metiltransferase Setdb2. Esta enzima é responsavel por
metilar H3K9, resultando na supressão da expressão gênica, incluindo genes
alvos de NF-kB e ainda CXCL1, levando à redução da migração de
neutrófilos para o pulmão. Como resultado, há uma maior susceptibilidade à
pneumonias bacterianas, conforme demonstrado no modelo experimental com Staphylococcus pneumoniae. Embora já fossem conhecidos
os tipos celulares e citocinas envolvidas na susceptibilidade à infecções
bacterianas induzidas por vírus, este trabalho foi o primeiro a demonstrar os
mecanismos moleculares envolvidos na deficiência de migração de neutrófilos
para o pulmão.
(a) Infection with S. pneumoniae (1) leads to the recognition of bacterial ligands by
pattern-recognition receptors (PRRs) (2), which triggers activation of NF-κB
and its translocation to the nucleus (3). NF-κB-mediated induction of Cxcl1 (4) leads to the production and
secretion of CXCL1 and to the recruitment of neutrophils (5), which control
bacterial spread and eliminate bacteria (6). (b) During coinfection, infection with influenza virus (1) leads to
the production of type I interferons (INF-α and IFN-β) by
infected airway epithelial cells (2) and other cells, which induces Setdb2
production in lung macrophages (3) and other cells. Recognition of the
secondary infection with S. pneumoniae
(4) activates the NF-κB pathway, but NF-κB-mediated induction of Cxcl1 is reduced by the repressive
histone mark H3K9me3 established by Setdb2 at the Cxcl1 promoter (5). Reduced production of CXCL1 leads to reduced
recruitment of neutrophils (6) and bacterial outgrowth due insufficient
bacterial control (7). IFN-α/βR, receptor for IFN-α and IFN-β.
Os mecanismos epigenéticos
envolvidos no desenvolvimento tumoral já vêm sendo muito estudados, sendo que
alguns fármacos como inibidores de DNA metiltransferases e Histona
Acetiltranferases já estão em uso na clínica, e uma outra série estão nas
diferentes fases de estudo clínico. Na imunologia, ainda há muito a ser
explorado, especialmente no que se refere à especificidade das alterações
induzidas por patógenos, ou na estabilidade destas modificações a longo prazo e
como podem afetar progenitores hematopoiéticos. Na minha opnião, um campo rico
para ser explorado por nós imunologistas.
Seguem alguns outros artigos
interessantes para leitura:
Epigenetic regulation of immune cell functions during post-septic immunosuppression.
Epigenetics.
2011 Mar;6(3):273-83. Epub 2011 Mar 1.
Epigenetic control of myeloid cell
differentiation, identity and function. Nat Rev Immunol. 2014 Dec
23;15(1):7-17. doi: 10.1038/nri3777.
Epigenetic
programming of monocyte-to-macrophage differentiation and trained innate immunity.
Science. 2014 Sep 26;345(6204):1251086. doi: 10.1126/science.1251086.
Patricia Assis
Pós-doutoranda no Laboratório de
Imunopatologia
CpqRR-Fiocruz/MG
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