Muito se discute a respeito da validade dos modelos
experimentais nos estudos imunológicos e de sua eficácia em explicar os
fenômenos biológicos envolvidos. Nesse sentido, a discussão pode não ser tão
simplória e envolver todo um contexto evolutivo. Podemos nos indagar sobre os
“porquês” da presença e persistência de tanta variação imunogenética
associadas, por exemplo, às doenças autoimunes em camundongos e humanos. “Por
que” começa a fazer sentido quando pensamos que a história evolutiva de um
grupo ocorre num ambiente bastante diverso em termos de complexidade e pressão
seletiva. Em relação ao sistema imunológico, muito dessa pressão é ocasionada
por parasitos, os quais, sabidamente, interagem com a imunidade do hospedeiro.
É de se supor que as respostas imunológicas observadas em
populações de ambientes naturais difiram daquelas observadas no ambiente
controlado, como o laboratorial. Tudo isso pode ser explicado baseado em uma
espécie de gradiente pautado na própria seleção natural e na “artificialidade
do ambiente”. Dessa forma, temos em extremos opostos animais
domésticos/laboratoriais, os quais estão poucos expostos à seletividade natural
e muito expostos a condições ambientais artificiais como limpeza, oferta de
alimento, etc. No outro extremo, animais selvagens, os quais estão expostos a
pressões seletivas e ambientes ditos naturais, numa condição altamente susceptível
às infecções parasitárias e escassez alimentar. A título de exemplificação
desses extremos, é relatado que populações selvagens tendem a ter uma maior
concentração de imunoglobulinas e células NK responsivas em relação às
linhagens laboratoriais. Uma explicação seria a perda da capacidade de resposta
em vista dos múltiplos intercruzamentos aos quais tais linhagens são expostas. Também
é relatado que um loci associado ao desenvolvimento de doenças inflamatórias
intestinais está relacionado à proteção contra microbactérias em ambientes naturais.
Desse modo, as variações imunogenéticas assumem um papel adaptativo importante na
natureza.
Se pensarmos na espécie humana como apenas um raminho da
imensa árvore da biodiversidade que já habitou o planeta terra, em que ponto do
gradiente ela estaria? A espécie é exposta a todo momento a condições próximas
às naturais, artificiais e a todo tipo de stress típico da modernidade. Dessa
forma, a velha discussão sobre experimentação animal e sua aplicabilidade na
saúde humana torna-se mais complexa, uma vez que é inerente à espécie utilizada
como modelo um histórico de condições que o tornam muito destoante do histórico
de condições da própria espécie humana. Nesse
contexto, tem se tornado cada vez mais evidente a importância de se mudar, ou
mesmo, adicionar um novo foco no entendimento do surgimento das doenças,
deixando um pouco de lado a perspectiva médico- epidemiológica e evidenciando o
entendimento da doença no contexto ecológico/evolutivo da espécie em questão.
Post de Murilo Solano
Dias FMRP/USP/IBA
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