Colegas,
alguns cobram que o SBlogI deveria abordar mais o que é feito dentro dos nossos próprios laboratórios, ao invés de comentarmos trabalhos de outros grupos.
Neste sentido, pedi para alguns dos nossos alunos escreverem um texto simples, abordando o contexto que estudamos por aqui, no Laboratório de Imunoparasitologia "Dr. Mário Endsfeldz Camargo", Instituto de Ciências Biomédicas, Universidade Federal de Uberlândia.
Espero que seja informativo aos demais. Estamos abertos a sugestões/comentários/críticas de vocês.
Abraços, Tiago.
Post por Caroline Mota
Marcela Davoli
Murilo Silva
Patrick Barros
Neospora
caninum é um protozoário
intracelular obrigatório, que se assemelha em termos estruturais e em alguns
aspectos de sua biologia ao Toxoplasma
gondii. Este protozoário
(desconhecido por muitos!) provoca distúrbios neuromusculares em cães, seus hospedeiros
definitivos, bem como abortos em bovinos, o que resulta perdas econômicas
gigantescas. Para se ter uma ideia, estima-se que as perdas globais provocadas
pela neosporose são superiores a US$ 1 bilhão/ano. No Brasil, onde a infecção é
largamente negligenciada, bem como nossos mecanismos de controle da população
bovina nacional, o prejuízo é estimado em R$ 100 milhões/ano. Contudo, deve-se
salientar que temos o maior rebanho bovino comercial do mundo (algo em torno de
220 milhões de animais), o que leva a crer que esta cifra é certamente
subestimada.
No
entanto, apesar dos importantes danos que a neosporose pode causar na indústria
agropecuária, poucos grupos têm se dedicado ao estudo dos mecanismos imunológicos
relacionados à resistência contra N.
caninum, com o intuito de se desenvolver uma vacina eficiente, capaz de evitar a infecção primária e a recrudescência do
parasito.
Nesse sentido, nosso grupo (que faz parte dessa minoria...) tem como
objetivo determinar o papel dos diversos receptores de reconhecimento de padrão,
as cascatas de sinalização intracelulares ativadas, bem como as moléculas
efetoras produzidas durante a infecção pelo protozoário, a fim de entender como
o parasito é reconhecido, interage e/ou evade o sistema imune, para que assim
métodos profiláticos e terapêuticos eficazes possam ser desenvolvidos.
Descrevemos nos últimos anos que
receptores do tipo Toll, bem como a molécula adaptadora Myd88, são cruciais
para a resistência dos hospedeiros frente à infecção aguda pelo protozoário,
uma vez que a ausência dessas proteínas tornam camundongos geneticamente
deficientes mais susceptíveis à infecção. Neste sentido, resolvemos investir no
estudo de outras classes de receptores inatos.
Receptores tipo Nod, mais
especificamente Nod2, bem como receptores
de glicídios, como Dectina-1, também parecem
participar da resposta inflamatória contra o parasito. Em ambos os casos,
animais deficientes para estes receptores e/ou tratados com inibidores químicos
específicos para os mesmos mostram-se mais resistentes frente à infecção por N. caninum. Possivelmente, porque a
ausência das primeiras proteínas impede uma resposta inflamatória exacerbada
frente à infecção, enquanto a ausência do receptor Dectina-1 gera proteção
justamente porque o parasito parece utilizar esta molécula como ferramenta para
modular a resposta inflamatória gerada pelo hospedeiro.
Além disso, nossos trabalhos também têm evidenciado
que esse protozoário ao ativar PI3k e fosforilar p38 em macrófagos
infectados, regula a resposta imune a seu favor, uma vez que a
ausência dessas moléculas durante a infecção induz aumento da resposta
pró-inflamatória. Adicionalmente, moléculas efetoras, como NO, não se mostram
necessárias apenas no controle e na eliminação de parasitos intracelulares, mas
também parecem ser crucias na regulação do perfil de citocinas pró-inflamatórias
por macrófagos.
Bem,
ainda há muito a ser estudado para que possamos montar o imenso quebra-cabeça
dessa interação N.caninum-sistema
imune. Então, mãos à obra, né?
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