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segunda-feira, 2 de julho de 2012

Foco na Focis


Entre 19 e 23 de junho estive no congresso da Focis (Federation of Clinical Immunology Society). Já estive em várias Focis, e sempre fica uma impressão um pouco estranha. A idéia é ser um congresso “translacional”, mas a minha impressão e de que fica assim, meio no ar… Não que não tenha palestras excelentes, mas não existe realmente uma unidade de tema(s), e ao final do programa, fica a pergunta: mas qual foi a mensagem do congresso mesmo?

Imagino que é difícil mesmo fazer um congresso sobre a transição bancada/tratamento, em qualquer área. Mas acho que um dos problemas da Focis é que tenta ser muito para todos, e acaba não trazendo muito para ninguém. Afinal, é transição em autoimunidade, alergia, cancêr, reumatologia, doenças infecciosas, transplantes? E óbvio que não se pode cobrir todas estas áreas, mas acabamos tendo palestras em todas elas. De certa forma, até que é interessante, porque dá uma geral em várias áreas que não acompanho de perto. Mas o problema é que, se fosse realmente sobre transição, haveria até uma unidade entre as áreas diferentes. Mas a maioria das pessoas dá a sua apresentação de sempre, e mesmo sendo uma palestra excelente, acaba sendo assim, coisas que você poderia ter no congresso de imunologia, ou de reumatologia, ou alergia, e num contexto muito mais rico.

É pena, porque um dos aspectos que eu gosto da Focis é que é um congresso menor e com poucas sessões plenárias em paralelo, assim dá para assistir quase tudo. Enfim, talvez estou sendo muito crítica, mas na última vez que estive no Focis foi em 2007, e agora, 2012, parece que não mudou. E conversando com outras pessoas o sentimento parece ser mútuo.

Mas enfim, o congresso foi em Vancouver, Canadá, foram 3 dias lindos, depois choveu mas por pouco tempo. E Vancouver é maravilhosa, visitem se puder.

E apesar das tentações, assisti as palestras direitinho para poder contar para vocês. Como sempre na Focis, as células Treg foram as estrelas. Várias palestras sobre o potential de uso como imunoterapia (Kathryn Wood, Maria-Grazia Roncarolo, Kevan Herold). A da Maria-Grazia foi a mais interessante,  discutindo a indução das Treg 1 in vitro para terapia. Ela mencionou que apesar da terapia com Tregs (em transplante de medula óssea com doador haploidêntico) ter se mostrado segura, o problema tem sido obter células suficientes in vitro para a terapia.  Os protocolos de expansão que o grupo dela usa resulta em uma alta contaminação (~ 80%) de células efetoras, e ela disse que não existem marcadores efetivos para diferenciar células Treg1 de outras células como as T efetoras. Assim, o grupo dela partiu para um estudo de expressão gênica para identificar os marcadores (achei estranho que isto só esta sendo feito agora, depois de tanto tempo, mas enfim…). Em colaboração com o Richard Flavell, eles descobriram que usando CD49b e LAG3, tanto em gente quanto em bicho (camundongo), é possível se identificar Treg1 in vitro.

Houve também várias palestras sobre os diferentes ‘subtipos’ de Treg, as chamadas Th1-Treg, Th2-Treg, Th17-Treg etc, e de como estes subtipos teriam uma regulação preferencial para cada resposta, quer dizer, a Th1-Treg agiria preferencialmente sobre células Th1, etc. Enfim, Treg para todos os gostos.


E teve uma palestra ótima do Shimon Sakaguchi sobre FoxP3 e metilação em Tregs. Basicamente, ele falou sobre qual é o papel do FoxP3 em estabelecer o fenótipo da Treg, porque as células  inseridas com FoxP3 não são tão imunossupresoras quanto as Treg “naturais”, não-induzidas (nTreg). Como diferenciar entre funções independente e dependentes do FoxP3? O grupo dele descobriu que as nTreg são hipometiladas em genes associados com a função Treg, e estas mudanças epigenéticas são independentes de FoxP3. Se estas regiões são metiladas a supressão das Tregs diminui. Ele citou que a instabilidade dos marcadores Treg em Treg induzidas pode estar relacionada ao padrão epigenético destas iTreg. Ele não sabe exatamente o que induz as mudancas epigenéticas nas nTreg, mas ele disse que a ativação crônica do receptor de célula T induz parcialmente estas mudanças epigenéticas. O papel da IL-2 também não está claro. Ele concluiu dizendo que Foxp3 contribui para a intensidade, e as mudancas epigenéticas, para a duração, do fenótipo das nTreg.

Outro ponto interessante foi uma palestra da Raphaela Goldbach-Mansky sobre doenças autoinflamatórias monogênicas (as mais conhecidas são provavelmente  a Febre Familial Mediterrânea (FMF), com mutações na pyrin (pirina?), e a NOMID, com mutações no inflamasoma NLRP3), incluindo novas descobertas como a DIRA, com mutações no IL-1receptor antagonista (IL1ra), e a  DITRA, mutações na IL-36, parte da família da IL-1, e que estimula DCs e células T. Tem também a CAMPS, psoríase associada à CARD14/CARMA2, e que responde a anticorpos anti-p40 (parte da IL-12 e IL-23), e a PRAAS/CANDLE, associada com mutações em PSMB8, um dos componentes do proteasoma, e que não responde a terapia anti-IL1. Vamos descobrir relações que nem imaginávamos…

Também se falou sobre a polarização dos macrófagos/monócitos (M1, M2 e derivados), com o Alberto Mantovani falando sobre o receptor de quimiocinas atípico D6, e de que camundongos D6-/- tem um aumento de monocitos inflamatórios (Salvino et al, 2012). Outro tema que está aparecendo são as Myeloid Derived Suppressor Cells (MDSC), que talvez se tornem as Treg do futuro.

Tak Mak deu uma palestra divertida, sobre os últimos transgênicos do seu lab, mas que não teve muito de transição. Mas como ele é provavelmente o imunologista canadense mais famoso, claro que não podia faltar.

Acho que estes foram os destaques. Talvez o resumo poderia ser, a dificuldade de se levar a pesquisa da bancada para o tratamento…

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4 comentários:

  1. Claudia,

    Muito legal o post, principalmente essa associaçao entre epigenética e Tregs. Esses dados já foram publicados?

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  2. Oi Pedro,

    Que eu me lembre o Sakaguchi disse que eram dados ainda nao publicados.

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  3. andamos lendo um monte sobre isso, e ja vi o lafaille e o ahmed falarem coisas semelhantes... e esse negocio da T reg especifica pra subpopulacao de TH, hein? mto legal... Valeu Claudia!

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  4. Olá, Cláudia, tudo bem? Muito interessante o post!

    Tenho algumas dúvidas, não sei se foi mencionado no congresso, mas esses níveis de metilação de Foxp3 se referem aquela região TSDR (Treg specific demethylation region)? Porque tem trabalhos interessantes saindo nessa área falando que o nivel de metilação ou demetilação dessa região está associado a expressão de foxp3 e consequente estabilidade de Tregs...

    E essa história de Tregs específicas pra subpopulações de TH se refere a fatores de transcrição? Ou seja, para suprimir respostas Th2, por exemplo, Tregs passam a expressar o fator de transcrição IRF-4; para suprimir respostas Th1, passam a expressar t-bet, e assim sucessivamente? Desculpe o tanto de perguntas, é que são tantas coisas saindo sobre Tregs, que fica difícil me manter informado!

    Muito obrigado!

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