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sexta-feira, 27 de julho de 2012

Produção e Caracterização de Eritrócitos Humanos Produzidos in vitro


Fonte: Adaptado de Griffiths et al., Blood. 2012 Jun 28;119(26):6296-306.

Durante o Congresso da Sociedade Internacional de transfusão sanguínea que ocorreu de 7 a 12 de julho deste ano em Cancun no México, um dos temas bastante discutidos foi a produção e caracterização de eritrócitos humanos produzidos in vitro. Muitas são as razões para que esse tema seja relevante, dentre elas, podemos citar o aumento da taxa de transfusão sanguínea em indivíduos acima de 50 anos, cuja expectativa de vida tem aumentado nas últimas décadas, o problema perene de possibilidade de transmissão de doenças infecciosas por transfusões e a falta de estoques suficientes nos bancos de sangue. Na África subsaariana, por exemplo, cerca de um terço das mulheres que sofrem hemorragia durante o parto morrem, porque eritrócitos não estão disponíveis para transfusão.

Claramente, existe uma necessidade de alternativas para obtenção de eritrócitos por outra via que não a doação nos bancos de sangue. Uma das alternativas que vem sendo estudadas é a geração de eritrócitos transfundíveis a partir de células-tronco cultivadas in vitro em laboratório.

Alguns progressos importantes têm sido feitos. Em 2011, a equipe do Dr. Luc Douay do Serviço de Hematologia e Imunologia do Hospital Saint Antoine em Paris na França publicou na revista Blood, estudo mostrando que uma pequena quantidade de eritrócitos autólogos cultivados in vitro a partir de células-tronco adultas do sangue periférico CD34+ sobreviveu na circulação periférica de um voluntário do sexo masculino. Esse experimento constituiu-se na prova de princípio que eritrócitos humanos viáveis podem ser gerados a partir de células-tronco cultivadas in vitro em condições de boas práticas de manufaturação.

Um análise mais detalhada desses eritrócitos produzidos em laboratório revela que a maioria é constituída por reticulócitos em estágio tardio (reticulócitos R2) e não por eritrócitos maduros. Eles têm um volume celular médio maior, são menos deformáveis do que os eritrócitos e retêm organelas citoplasmáticas. Contudo, essas células têm um conteúdo normal de hemoglobina A e expressam todos os antígenos de grupo sanguíneo encontrados em eritrócitos normais. Elas também mantêm a expressão de CD36 e CD98 e se assemelham aos reticulócitos liberados da medula óssea na circulação periférica durante a eritropoiese normal.

A disponibilidade de se obter reticulócitos cultivados em quantidades de mililitros permite um estudo detalhado do processo de maturação de reticulócitos a eritrócitos. Já se encontra bem estabelecido que o reticulócitos precisa perder cerca de 10-15% de sua membrana plasmática, reduzir seu volume e expelir todas as organelas internas remanescentes para se transformar em eritrócitos. Entretanto, os mecanismos que promovem essas alterações ainda não estão claros. Em estudo publicado on-line em abril desse ano na revista Blood o grupo coordenado pelo Dr. David J. Anstee do Bristol Institute for Transfusion Sciences do Reino Unido elucidou uma parte desse mecanismo.

Diz o Dr. Anstee: “Nós examinamos reticulócitos cultivados in vitro,  usando microscopia confocal, após permeabilização da membrana plasmática para permitir a detecção de organelas intracelulares residuais. Nossos resultados revelaram que a membrana plasmática é incorporada no citosol dos reticulócitos por endocitose, onde forma grandes vesículas que se fundem com autofagossomos, contendo organelas remanescentes, como o aparato de Golgi e mitocôndria. Esses autofagossomos se fundem com os lisossomos, resultando em autofagolisossomos, que por sua vez, se fundem com a membrana plasmática, liberando seu conteúdo por exocitose.”

Ainda sobre os experimentos, o Dr. Anstee declara: "Esse processo explica a remoção das organelas remanescentes, mas nao define a perda da membrana plasmática. Entretanto, protuberâncias da membrana (“blebs”) são observadas em uma determinada proporção dos reticulócitos cultivados, sugerindo que a perda da membrana ocorre por meio desse mecanismo. Vesículas citosólicas contendo membrana plasmática e pequenas protusões de membrana plasmática também são observadas em reticulócitos circulantes no sangue periferico de pacientes esplenectomizados, sugerindo que a maturação final de reticulócitos a eritrócitos in vivo envolve passagem através do baço em um indivíduo saudável."

Esses resultados trazem evidências de que a produção de eritrócitos cultiváveis in vitro para terapia é um propósito alcançável no futuro. Atualmente, o principal desafio é desenvolver um processo capaz de produzir esse tipo de eritrócitos em quantidades terapêuticas.


Referências

- Griffiths RE, Kupzig S, Cogan N, Mankelow TJ, Betin VM, Trakarnsanga K, Massey EJ, Parsons SF, Anstee DJ, Lane JD. The ins and outs of human reticulocyte maturation: Autophagy and the endosome/exosome pathway. Autophagy. 2012 Jul 1;8(7).

- Griffiths RE, Kupzig S, Cogan N, Mankelow TJ, Betin VM, Trakarnsanga K, Massey EJ, Lane JD, Parsons SF, Anstee DJ. Maturing reticulocytes internalize plasma membrane in glycophorin A-containing vesicles that fuse with autophagosomes before exocytosis. Blood. 2012 Jun 28;119(26):6296-306.

Giarratana MC, Rouard H, Dumont A, Kiger L, Safeukui I, Le Pennec PY, François S, Trugnan G, Peyrard T, Marie T, Jolly S, Hebert N, Mazurier C, Mario N, Harmand L, Lapillonne H, Devaux JY, Douay L. Proof of principle for transfusion of in vitro-generated red blood cells. Blood. 2011 Nov 10;118(19):5071-9.

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