BLOG DA SOCIEDADE
BRASILEIRA DE IMUNOLOGIA
Acompanhe-nos:

Translate

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Mais leseiras orientais

Por Sérgio Lira

O meeting é Engenharia em imunologia, aconteceu agora em novembro em Kyoto. Uns  gringos e uns japoneses.

Tenho pena dos gringos que chegaram ontem. Eu, old monkey, cheguei há 4 dias atrás. Ja tomei uns belos banhos (japoneses e turcos são fissurados na matéria; eu prefiro os banhos japoneses). Andei tirando uns retratos. Chegar assim de vez, de supetão, como se fala no nordeste, é pra quem não tem mãe. Isso não se faz, principalmente se você tem mais de 38 primaveras.

Vai comecar. Takeshi Watanabe abre a sessão. Ele e Youske Takahama organizam o meeting desde 2010.

Tematicamente o encontro foi organizado para discutir o uso de tecnologia pra reconstituir, ou expandir celulas imunes. Exemplo, como usar as tais IPS (induced pluripotent stem cells), tornadas realidade por Yamanaka. Falar nisso, antes do meeting passamos pelo prédio dele. Dizem que ele é detestado aqui. Levou a grana toda depois do Nobel. Kyoto é um lugar tão antigo que dizem que o Nobel é apenas um prêmio dado pelos escandinavos... O primeiro talk foi precisamente sobre células IPS.  Achei fascinante desenvolver buckets de células T citotóxicas com o intuito de atacar células cancerosas. Mas me pergunto o quanto melhor é essa abordagem comparada com os CARs (chimeric antigen receptors), desenvolvidos por June e Sadelain? Depois falaram vários engenheiros interessados em construírem órgaos linfóides usando ink-jet printers. Trabalho igualmente fascinante. Não se brinca com japonês nesse quesito.

Por fim vieram os velhos biologistas, minha turma. E aí uma constatação. Os convidados americanos foram  piores que os japoneses. Uma americana insossa. Outro cara veio e falou sobre como crescer células do fígado em linfonodos, um lugar supimpa, i wonder why.

Mas os japs deram shou de bola. Eles são difíceis de entender, mas perguntam bem, participam. O cara do IPS talk toca na banda do meu amigo Youske, que já falei aqui, trabalha no timo. E a banda dele, é lógico, se chama negative selection. O outro cara da banda deu o melhor talk. O cara é o cão. Fez um trabalho focado no desenvolvimento do baço. E o cara é um butoh dancer. Vá ver o clip do negative selection que tem ele personificando a morte de uma célula T. No intervalo fui falar com ele e descobrimos uma conexão. Gosto de um fotógrafo japonês chamado Eikoh Hosoe, que fotografou o cara com quem ele estudou....

Depois veio Toshiro Taniuchi, que fez post doc com Dan Littman e colabora com Daniel Mucida. Outro cão. O cara faz bicho como eu tiro retrato. Rapaz, o sujeito estuda regulação de transcrição no camundongo fazendo knockins como a gente fazia transfection nos anos 80. O cão, period. Veio Takeshi e mostrou como fazer um baço na cápsula renal com células do estroma do baço recém nascido. Muito bonito o trabalho dele. Ele trabalhou no Basel Institute. Conheceu os bandidos todos. Hoje tem uma posição na Universidade em Kyoto, depois de aposentar em Fukuoka. Uma posição simples, um lab pequeno, mas ainda faz coisas interessantes. Conheci Takeshi em 2012 num meeting em Hannover. Ficamos amigos. Trouxe pra ele um livro de fotos que fiz de um lugar espetacular nas montanhas chamado Koyasan.

Ele e Youske fizeram esse meeting. Youske e eu colaboramos na caracterização de ccr7 knockout mice. Gosto de Youske porque ele é um cientista sério, e porque tem um lado artístico. Ele toca baixo, e toca shamisen, aquele violão de três cordas típico do Japão. A mãe dele ensinava. Ele começou com 3-4 anos. Depois foi pro baixo. E voltou pro shamisen. É a estória do eterno retorno...

Ato 2. Fomos comer com os gringos. Os japs sabem receber. Não tem lugar melhor no mundo. Nos levaram prum restaurante pra comer comida kaiseki. A mais gloriosa comida japonesa. Ainda bem que não tinha um cricri falando de ciência a noite toda. Acho insuportável.

Ato 3. No fim de semana, fomos ver o templo Shoji-in, ou o Kokedera, o templo do musgo, onde o gramado é lindo, as cores lindas, e onde passamos meia hora escutando os monges cantarem. O Japão é incrivelmente foda.

Fomos prumas outras vilas. Fomos pra mais templos. Kyoto tem 1700 templos, 400 shrines. Uma Roma.

Depois de várias andanças fui falar no último dia, na imunologia, na Universidade de Kyoto. Meu talk tava programado pras 5, o que é rotina uma vez que ninguém quer interromper o dia de trabalho pra escutar besteira de seu ninguém. Falei sobre o trabalho mais recente do laboratório, envolvendo IL-23 e células linfóides inatas. Depois saímos pra comer com Takeshi e ele nos levou num lugar muito simples. A conversa foi boa. Ele falou de Jerne, Coutinho, Tonegawa, que conheceu quando trabalhava no Basel Institute, e de suas opiniões secretas sobre o futuro da imunologia. Ele já escutou vários futuros. Nesse de IPS ele não acredita muito. Depois eu disse que nós tínhamos visto umas gueixas. Mostrei o retrato e ele disse que elas eram fake gueixas. Rarará. Eu estava disposto a crer. Ele disse não, essa aí ta vestida de maiko (aprendiz de gueixa), mas já dobrou o cabo da boa esperança.

Fake. Uma falsa gueixa, uma falsa baiana. Falar em falsa baiana, aquela que vira os oinho, o distintíssimo compositor da dita cuja, Geraldo Pereira, gênio supremo da MPB (será que vocês sabem o que é MPB?) morreu depois de levar um murro de Madame Satã. Mas, aí também existem controvérsias, não se sabe ao certo. Aé eu fiquei pensado: zen, né nao? Tudo ilusão.

A verdade às vezes se veste de maiko e te prega uma peça.

E aqui eu me despeço, lembrando que não pode existir, fora o Recife, um lugar melhor do que o Japão.

Em que lugar do mundo você escuta o povo lhe dizendo: Gozai-mais, tá?

Comente com o Facebook :

2 comentários:

  1. Show mesmo é o Sergio Lira. O cara escreve muito! Que ritmo frenético, que paradoxo com a quietude dos japs... AWESOME!!!!!!

    ResponderExcluir
  2. O povo de Recife agradece o ultimo comentario. Abracao!

    ResponderExcluir

©SBI Sociedade Brasileira de Imunologia. Desenvolvido por: