Na figura, um
microscópio acoplado a um citômetro de fluxo e a imagem de cada célula
individual na tela de um iPad. O que poderia ser mais
super-multi-“high-troughput” do que isso?
Uma das
palestras mais interessantes a que assisti durante minha participação no
Keystone Symposia on Advancing Vaccines, de 31/10 a 4/11/2013, foi certamente a
do “The Love Lab”, com o perdão do trocadilho (O Laboratório do Amor, numa
tradução literal). O Dr Christopher Love é o chefe desse laboratório, inovador
até no nome. Coincidentemente, esta palestra apareceu em um momento em que eu
me questionava e questionava o futuro da ciência no Brasil. Já comentei com
alguns e à medida em que o tempo passa, penso que, se nossa geração brasileira atual
não fizer nada, continuaremos nossa vocação de eternos colonizados, meros reprodutores,
repetidores de tecnologias importadas. Numa das salas de espera da FIOCRUZ,
deparei-me com uma revista de NEGÓCIOS, que normalmente eu não pararia para ler,
a não ser pelo título sugestivo: “INOVAÇÃO – a solução pode estar na sala de
aula”… Mas isto é assunto para outro post – Imunologia nas escolas...
Uma comparação que eu costumo fazer, guardadas as devidas proporções, é em relação ao transporte público ou algum equipamento (seja médico, industrial ou um simples computador), por exemplo. Penso que quando formos capazes de fabricar uma ferramenta 100% nacional, os alemães e os japoneses
já terão fabricado os carros voadores. Se já não estiverem praticando o
teletransporte até lá… Contentemo-nos, por ora, em contemplar e relembrar a
palestra, que nos inspire a caminhar em direção a esse nível de
evolução técnico-científica. Lembrem-se, meus queridos Cientistas e
Imunologistas do Brasil: nossa tarefa vai além de apenas publicar artigos
científicos de alto impacto!
Resumo da palestra “Microferramentas
para avaliar respostas de linfócitos T”, apresentada na seção “Genômica das
Respostas de Linfócitos T à Vacinação”, no dia 01/11/2013, para o “Keystone
Symposia on Advancing Vaccines in the Genomics Era” (31/10-04/11/2013):
Você ou seu laboratório precisam conduzir
múltiplos experimentos em uma única célula e em tempo hábil? Que pena! As
amostras de pacientes humanos utilizados para a investigação clínica são muitas
vezes limitados em tamanho e disponibilidade, e as células de particular
interesse são geralmente raras e têm curta viabilidade.
A avaliação das respostas funcionais desencadeadas
por linfócitos T durante as intervenções e estudos clínicos de doenças humanas
dependem predominantemente das medições integradas de uma única célula, como a coloração
intracelular por citometria de fluxo ou ELISpot, ou em ensaios de massa, usando
células do sangue. Novas abordagens para a análise de célula única de linfócitos
T, utilizando matrizes densas para poços de subnanolitros (nanowells) permitem
novas classes de medições baseadas em respostas dinâmicas e acomodam um pequeno
número de células a partir de amostras limitadas, como as biópsias teciduais. O
palestrante Chris Love descreveu uma variedade de modalidades para medir a resposta de linfócitos
T antígeno-específicos usando nanowells, bem como aplicações para essas
ferramentas em doenças humanas crônicas. Estes exemplos, combinados com
análises computacionais correspondentes dos dados resultantes, proporcionam uma
visão no sentido de uma abordagem quantitativa sistemática da monitorização
clínica avançada. Assim, poderão ser melhor avaliadas respostas de linfócitos T
aumentadas por vacinas e compostos imunoterapêuticos, bem como melhor
compreendidas as respostas específicas a antígenos em doenças como o HIV, a esclerose
múltipla e o diabetes.
No nível celular, como observadores,
temos somente uma visão ampla, porque as ferramentas atualmente disponíveis
para os biologistas mostram apenas populações inteiras de uma única vez. Mas de
forma muito semelhante ao que acontece com as pessoas, as células individuais também
se comportam de maneira diferente, e cada uma pode mudar o destino de muitas
outras. Assim, C. Love, um químico do Massachussets Institute of
Technology (MIT), que virou imunologista, desenvolveu uma técnica para dar um
“zoom” em uma célula individual. Seu objetivo é "tirar uma fotografia de
uma célula, perguntar quem é ela", como ilustrado na figura acima. A
localização das peculiaridades únicas de uma célula ao longo do tempo poderia
resolver mistérios médicos de longa data: a forma como o sistema imune responde
à infecção pelo HIV (e outras), quais métodos os médicos devem usar para
diagnosticar alergias mortais, e porque a produção de drogas é tão inconsistente,
e, portanto, tão cara.
Por décadas, os biologistas que queriam
saber quais proteínas uma única célula estava produzindo só podiam dar um
“tiro”, porque os testes padrão matam as células. O método de Love pode
localizar as secreções de uma célula ao longo do tempo. Ele usa o equivalente
a uma microscópica fôrma de cubos de gelo e preenche cada pocinho com uma ou duas células
vivas do sistema imune. Durante o curso de 1h, ele transfere as células com um
material que captura as substâncias químicas que são liberadas, semelhante a um
experimento de Western Blot. Repetido ao longo do tempo, o processo pode identificar
as secreções e como elas mudam.
Usando esta técnica de “imprinting”
(impressão digital), Love descobriu que os imunologistas que avaliam a efetividade
do tratamento de infecção por HIV frequentemente estavam olhando pros
indicadores errados, e agora ele está ajudando a desenvolver um teste melhor. Ele
também descobriu um novo método de análise de marcadores, indicadores de quais
células do sistema imune liberam o quê na presença de um alérgeno alimentar, e
em quanto tempo. Isso poderia levar a melhores testes de alergia, que são de
outra maneira imprecisos cerca de um quarto do tempo.
Mas o trabalho de Love não está focado
somente em humanos. Em março de 2013 ele descobriu uma curiosidade importante
sobre as propriedades de uma levedura. Muitas companhias farmacêuticas usam-nas
para produzir drogas baseadas em proteínas como fatores de crescimento e
anticorpos. Embora as populações das leveduras que elas usam sejam
geneticamente idênticas, as células não se comportam como se fossem idênticas;
Love descobriu que algumas leveduras secretam grandes quantidades de um
composto desejado, outras não fazem nada. Ele e seu grupo estão agora
procurando entender o que causa estas discrepâncias, na esperança de melhorar o
rendimento, o que poderia diminuir significativamente o preço de algumas
drogas. Como ele demonstrou em seus trabalhos e na brilhante palestra, com uma
didática incomum, o mundo é um lugar de nuances, e cada indivíduo, seja uma
célula do sistema imune ou uma levedura – tem algo a dizer.
Portanto, um desafio importante para o
avanço da imunologia clínica é o desenvolvimento de novas tecnologias que
tornam possível a coleta de dados quantitativos para um grande número de
células primárias individuais (104-106) num experimento
que equivalha a uma série de ensaios independentes (citometria de fluxo,
ELISPOT e genotipagem). Estas e outras tecnologias permitiriam a construção de
conjuntos de dados altamente correlacionados que detalhariam o estado do
sistema imune celular. Tais perfis 1) facilitariam o desenvolvimento de novas
imunoterapias antimicrobianas e 2) melhorariam a vigilância imunológica para o
diagnóstico de uma doença; e para análise da eficácia de imunoterapias ao longo
do tempo.
Para ler mais:
http://web.mit.edu/lovelab/
Referências:
1. Love KR, Love JC
et al. Microtools for single-cell
analysis in biopharmaceutical development and manufacturing. Trends
Biotechnol 31, 280-286, 2013.
2. Torres AJ, Gordo
S, Love JC et al. Functional single-cell
analysis of T-cell activation by supported lipid bilayer-tethered ligands on
arrays of nanowells. Lab Chip 13, 90-99, 2013.
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