Desde
a sua descoberta por Steinman e Cohn no começo dos anos 70 [1, 2], as células dendríticas (DCs) apresentam papel chave na coordenação da
resposta imunológica desenvolvida pelas demais células. Classicamente, todas as
DCs presentes nos indivíduos adultos derivam de uma origem comum: os
progenitores mielódes/linfoides presentes na medula óssea dos indivíduos
adultos [3]. No entanto, a exemplo do acontecido com os macrófagos nos últimos anos,
esse dogma imunológico também está sendo revisto, e trabalhos recentes sugerem
que alguns subtipos de DCs derivam diretamente do saco vitelínico, ainda
durante a fase embrionária [4]. Independente da sua origem embriológica, as DCs
presentes nos tecidos apresentam fenótipos bem determinados e podem impedir ou
auxiliar o desenvolvimento de doenças autoimunes [5].
Em
um trabalho publicado em 2012 [6], Zangi e colaboradores caracterizaram um novo subtipo de DCs (CD11cHIMHC-IIHIperf1+granA+).
Essas células são capazes de induzir a deleção de clones autorreativos de
linfócitos T CD8+ após interação com antígenos cognatos. A ativação de TLR7 e
TREM1 nas DCs resulta na liberação de granzima A e perforina na superfície dos
linfócitos, contribuindo diretamente para diminuição da inflamação tecidual e
manutenção da tolerância periférica.
Paralelamente,
ao longo dos últimos anos diversos trabalhos publicados na literatura têm
evidenciado o papel da resposta imunológica no desenvolvimento da síndrome
metabólica (conforme já discutimos outras vezes aqui, aqui e aqui no
Blog da SBI). De forma geral, a expansão patológica do tecido adiposo é
acompanhada pela ativação crônica da resposta imunológica, intensificando as
alterações sistêmicas encontradas nos indivíduos obesos, podendo ser associado
ainda a outras co-morbidades (como Diabetes tipo 2, esteatose hepática, artrite,
infecções recorrentes, dentre outras) [7].
Diante
desse contexto, o trabalho de Zlotnikov-Klionsky e colaboradores, publicado em
setembro desse ano na Immunity [8], demonstrou-se o papel de uma nova subpopulação de
células dendríticas, produtoras de perforina (perf-DCs), e importantes para a
proteção contra a síndrome metabólica e autoimunidade. Os autores desenvolveram
um modelo de animais quimeras deficientes em perf-DCs (Itgax-DTA-Prf1-/-) e observaram que
esses animais apresentaram aumento espontâneo no ganho de peso corporal,
acompanhado de diversas alterações metabólicas, assim como elevação de
citocinas pró-inflamatórias, e maior polarização de macrófagos M1. Além disso,
esses animais exibiram maiores populações de linfócitos T CD4+ e CD8+,
no tecido adiposo, com um repertório de TCRs mais diverso. A depleção desses
linfócitos foi capaz de reverter o fenótipo causado pela ausência das perf-DCs,
indicando que essas células parecem atuar na deleção de linfócitos T
autorreativos no tecido adiposo, e na manutenção da homeostase tecidual.
Considerando a ação reguladora
dessas células no tecido adiposo, avaliou-se também seu papel em um modelo de autoimunidade
já bem estabelecido, a encefalomielite autoimune experimental (EAE). Foi
observado que a ausência das perf-DCs em animais imunizados com MOG acelerou o
desenvolvimento da doença, assim como aumentou seu score clínico. Além disso,
os linfócitos T específicos a MOG e provenientes dos animais deficientes em
perf-DCs foram capazes de se proliferarem in
vitro, quando reestimulados com MOG, diferente dos linfócitos provenientes
dos animais controles.
O trabalho demonstrou uma nova
função reguladora das células dendríticas, que, através da produção de
perforina, são capazes de eliminar linfócitos T autorreativos e, além das
Tregs, podem representar uma nova população reguladora, importante para a
autoimunidade e processos inflamatórios no tecido adiposo.
Figura 1: Papel
regulador das perf-DCs. Em um estado de homeostase, linfócitos T
autorreativos podem reconhecer peptídios próprios apresentados pelas perf-DCs,
induzindo a liberação de perforina por essas células e a depleção do linfócito.
Na ausência de perf-DCs, ocorre a expansão desses linfócitos autorreativos,
podendo desencadear o desenvolvimento de obesidade e doenças autoimunes.
Referências:
8. Zlotnikov-Klionsky, Y., et al., Perforin-Positive Dendritic Cells Exhibit an
Immuno-regulatory Role in Metabolic Syndrome and Autoimmunity. Immunity,
2015.
Post de
Gabriela Pessenda e Leonardo Lima (Doutorandos – IBA - FMRP/USP)
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