Em uma
revisão do livro de Eliot Sober “The
nature of selection”, Smith (1986) escreve:
“Sober distingue entre a
seleção de (alguma coisa ou fenômeno)
e a seleção para. Ele ilustra esta
diferença com um brinquedo com o qual uma sobrinha sua brincava. O brinquedo
consiste em um cilindro de plástico transparente dividido em várias camadas
horizontais contendo bolas de diversas cores:
“Cada nível horizontal do
brinquedo contém buracos do mesmo tamanho. Os buracos em cada nível são maiores
que os buracos no nível abaixo. As bolas também variam de tamanho. Se as bolas
estão no compartimento superior, sacudir os
brinquedo colaca as bolas em seus respectivos níveis. Esta é um a
máquina de selecionar. As bolas são selecionadas por seu tamanho. Mas todas as
bolas de um dado tamanho são de uma dada cor. As menores bolas, e somente elas,
são verdes. Então, o processo de seleção seleciona as bolas verdes porque elas
são as menores.”
Embora seja correto dizer
que houve seleção quer das menores bolas ou das bolas verdes, não se pode dizer
que houve seleção para a cor verde. O brinquedo não seleciona as bolas de
acordo com sua cor, mas sim de acordo com seu tamanho. Portanto, o conceito de
“seleção para” é um conceito mais restritivo que “seleção de”. Isto ocorre
porque a “seleção de” é parte dos efeitos do processo seletivo, enquanto que
“seleção para” descreve suas causas.”
Diferentemente de Eliot Sober,
Humberto Maturana e Jorge Mpodozis propuseram uma teoria evolutiva com base em
um processo que denominam “deriva natural”. Ao contrário dos defensores do
criacionismo, eles não se opõem ao conceito de “seleção natural”, nem optam
entre “seleção de” e “seleção para” mas dizem que a “seleção natural”
é um efeito da deriva natural, e não
seu mecanismo (Maturana and Mpodozis,
2000). Alguns seres vivos resultam
selecionados na deriva natural. A seleção natural não é um mecanismo, mas sim o resultado
de um mecanismo que é a “deriva natural”.
Segundo eles, a adaptação do ser vivo ao meio é uma condição de existência que não pode ser
perdida em nenhum instante do viver. Todos os seres vivos estão sempre
adaptados e não haveria seres vivos menos e mais aptos ao viver; portanto, não
haveria pressões seletivas que
conduziriam à sobrevivência dos seres
mais aptos.
Segundo eles, o processo
reprodutivo, que gera organismos com a mesma organização, mas estruturas
diferentes (parecidos mas diferentes), necessariamente gera uma filogênese na
qual as diferentes linhagens são conservadas enquanto outras mudam e dão origem
a outras linhagens. Esta variação e conservação se dão como resultados do
viver. Os seres vivos variam continuamente como resultado de suas interações (aquilo
que se passa com eles) e de sua
própria dinâmica interna (aquilo que se
passa neles). O somatório desta
variação faz com que alguns aspectos de seu viver (de sua estrutura e de sua
conduta) sejam conservados enquanto outros aspectos mudam. Mpodozis insiste em
que, desde que a variação estrutural é uma condição de existência no viver – o
ser vivo morre se cessarem estas mudanças (estruturais e condutuais) – o que
importa não é explicar a mudança, mas sim explicar aquilo que se conserva, e pergunta:
“Como se conserva aquilo
que se conserva naquilo que muda?” (Mpodozis, 2011)
Isto afeta
significativamente o pensamento na imunologia, até hoje dominada por teorias seletivas. A seleção clonal passa a ser vista como um resultado da atividade imunológica e não como seu mecanismo. A preocupação de desloca do
estudo daquilo que varia (as respostas imunes específicas, a memória
imunológica) para aquilo que é conservado. Mas o que é conservado na atividade
imunológica?
Para notar aquilo que é
conservado na atividade imunológica é necessário analisar o que se passa em
conjuntos de linfócitos ou de imunoglobulinas, e não em clones isolados ou
anticorpos monoclonais. É necessário analisar a interação de conjuntos de
imunoglobulinas naturais, presentes no soro não fracionado de um animal normal,
com misturas complexas de ligantes, como extratos de órgãos ou culturas
bacterianas (Nobrega et al., 2002) , ou microarrays nos quais um braço robótico
arrumou centenas de proteínas diferentes (Cohen, 2013). Quando isto é feito se
constata a presença de perfis ou padrões de reatividade que são robustamente
conservados (Mouthon et al., 1996).
Este é um exemplo notável
“daquilo que se conserva naquilo que muda” porque o organismo substitui
continuamente as populações de linfócitos ativados e, portanto, as
imunoglobulinas presentes no soro normal variam continuamente. A despeito desta
variação, quando analisadas em conjunto, vemos que seus padrões de reatividade
são conservados. “Como se conserva aquilo que se conserva naquilo que muda?”
(Mpodozis, 2011). A conservação de uma individualidade
a despeito da contínua variação inerente ao viver é um dos maiores enigmas da
Biologia (Buss, 1987)
Buss,
L.W. The Evolution of Individuality.
Princeton: Princeton University
Press, 1987.
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Antibody Repertoire after Massive Ablation of Lymphoid System: Robust Selection
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Sober,
Elliot. The Nature of Selection. Evolutionary Theory in Philosophical Focus.
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Nelson
Vaz <nvaz@icb.ufmg.br>
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