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sexta-feira, 24 de maio de 2013

Qual a relação entre metabolismo e a resposta imunológica?


Para muitos estudiosos, o metabolismo é visto simplesmente como uma maneira de estocar energia por meio do catabolismo ou ainda, através de vias anabólicas, gerar macromoléculas necessárias ao crescimento e manutenção da viabilidade celular. A elucidação de vias metabólicas permitiu uma nova compreensão de distúrbios nos quais há óbvias disfunções no metabolismo, como aterosclerose e diabetes. Porém, alterações na regulação metabólica são agora vistas de grande importância também, em outras doenças como distúrbios que envolvem condições inflamatórias. Dessa forma, o entendimento da dinâmica inter-relação entre a maquinaria metabólica e a sinalização celular tem surgido como foco no estudo de distúrbios metabólicos, câncer e, mais recentemente, no estudo da resposta imune.

Em meados de 1920, o bioquímico alemão Otto Warburg propos que uma desregulação metabólica é uma especial característica de células cancerígenas. Em seus estudos, utilizando tecidos saudáveis e tumorais, ele percebeu que sob baixas concentrações de oxigênio ambos os tecidos induzem a formação de altas taxas de lactato, uma vez que a glicose, como substrato energético, não pode prosseguir através dos demais passos de sua oxidação (ciclo de Krebs e cadeia respiratória) na ausência de oxigênio. Em tensões normais de oxigênio, ele observou que tecidos saudáveis apresentaram uma esperada redução na produção de lactato e, surpreendentemente, os tecidos tumorais mantiveram um alto consumo de glicose, com alta produção de lactato. Este efeito, no qual as células, mesmo sob condições normais de oxigênio, produzem altas concentrações de lactato, passou a ser denominado como “efeito Warburg” ou glicólise aeróbica.

Mas qual seria a relação entre todo este “palavriado” bioquímico e o sistema imunológico? Recentes estudos estão demonstrando uma estreita relação entre os processos metabólicos e a modulação da resposta imune mediada por células do sistema imune.  Desde a descrição dos efeitos celulares demonstrados por Warburg foram escassos os trabalhos investigaram o perfil metabólico das células do sistema imunológico. Dentre eles, o estudo pioneiro de Oren e cols.

Recentemente, três elegantes trabalhos que abordaram o tema são dignos de destaque. No primeiro deles, as mesmas mudanças no padrão metabólico observadas por Warburg em células tumorais foram descritas em células T, macrófagos e células dendríticas. Particularmente, Krawcsyk e et al., 2010, demonstraram que a incubação de células dendríticas (diferenciadas in vitro) com LPS propicia um aumento no consumo de glicose, aumento na formação de lactato e redução no consumo de oxigênio. Além disso, estas alterações também refletiram no aumento da molécula co-estimulatória CD86 indicando uma modulação funcional destas células.

No segundo trabalho, Shi e colaboradores descreveram uma importante participação do fator de transcrição induzido por hipóxia-1α (HIF-1α), o qual parece ser um dos mediadores das mudanças no perfil metabólico das células inflamatórias e também de células tumorais. HIF, é um complexo proteico heterodimérico que regula a expressão de muitos genes, inclusive de enzimas que participam da via glicolítica, em resposta à mudanças na disponibilidade de oxigênio. Os autores demonstraram que células do padrão Th17 e Treg possuem marcada diferença em sua atividade glicolítica e que estas diferenças estão sob o controle de HIF. A diferenciação dessas subpopulações (Th17 ou Treg) também demonstrou ser modulada por esse fator de transcrição. Por fim e, o grupo irlandês do professor Luke O'Neill descreveu que o succinato (succinato? Sim, succinato, aquele pequeno ácido dicarboxílico com 4 átomos de carbono, intermediário metabólico no ciclo de Krebs e substrato da cadeia respiratória) modula as funções de HIF-1α que se reflete na síntese de IL-1β por macrófagos. Trabalho recentemente discutido no Journal Club aqui em Ribeirão Preto.

Assim, o metabolismo tem surgido como um importante tópico nas pesquisas biomédicas. Alterações metabólicas que ocorrem, não só em doenças metabólicas e câncer, mas também durante a inflamação, podem permitir o maior entendimento sobre a patogênese de tais doenças e desvendar novos alvos para terapia. Além disso, parecem existir uma série de alterações metabólicas que são comuns tanto à células inflamatórias, quanto à células tumorais indicando que, terapias visandos alvos em comum poderiam ser utilizados no tratamento de ambos os distúrbios. Outro importante aspecto que está mudando, é a visão de que os ácidos orgânicos que fazem parte do ciclo de Krebs atuam somente como intermediários metabólicos. A descoberta de novas funções para intermediários metabólicos, como por exemplo, succinato, confirma ainda mais o papel do metabolismo na modulação da resposta imune.

Post de André Luis Lopes Saraiva
Doutorando do Laboratório de Inflamação e Dor (LID) – FMRP/USP

Referências

Krawczyk, CM, et al. Toll-like receptor-induced changes in glycolytic metabolism regulate dendritic cell activation. Blood, vol. 115, 4742-4749, 2010.
Oren, P. et al. Metabolic patterns in three types of phagocytizing cells. J. Cell Biol., vol. 17, 487-501, 1963.
Shi, L.Z. et al. HIF1α-dependent glycolytic pathway orchestrates a metabolic checkpoint for the differentiation of Th17 and Treg cells. JEM. vol. 7, 1367-1376, 2011.
Tannahill, GM, et al. Succinate is na inflammatory signal that induces IL-1β through HIF-1α. Nature, vol. 496, 238-242, 2013.

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2 comentários:

  1. Muito legal o post André. Cada vez mais será preciso pensar de modo aberto e integrado.

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