Nature
Reviews in Immunology, volume 12 september 2012
A relação entre Imunologia e Sistema nervoso
não é novidade, mas o que antes os neurocientistas e imunologistas imaginavam
ser uma cooperação entre moleculas, hoje tem se mostrado bem mais complexa.
Basta observarmos o fato de que, no ultimo mês tivemos 5 posts relacionados a
este tema. O exemplo dessa intensa relação é a cooperação entre células T e o
sistema nervoso central (SNC). Na edição de setembro de 2012 da revista Nature
Reviews Immunology (Kipnins e Derecki),
temos uma explanação interessante de como essa interação pode ocorrer e
favorecer a cognição. O papel das células imunológicas no SNC sempre foi
relacionado principalmente a neuropatologias inflamatórias como a esclerose multipla.
Porém, além de participar de processos inflamatórios, as células T parecem ter
influência direta no desenvolvimento de memória e aprendizado. Nesse contexto
experimentos utilizando camundongos SCID e Nude, demonstraram uma perda de
atividade cognitiva quando comparados com o grupo controle, sendo essa
capacidade reestabelecida após a transferência de esplenócitos de camundongos
controle. No intuito de desvendar quais células estariam envolvidas com essa
função, em experimentos utilizando esse mesmo modelo, camundongos SCID
receberam células TCD3 de doadores controle. O resultado observado demostrou
melhora na atividade cognitiva antes diminuída. Dentre as células T somente CD4
estavam envolvidas na atividade cognitiva (direta ou indiretamente). Mas uma
grande lacuna ainda permanecia no entendimento desse mecanismo, especialmente
relacionado ao SNC, como essa interação acontecia? O que antes se imaginava
mediado por moléculas agora parece ter uma ação direta das células imunológicas
especialmente CD4 sobre células do SNC. Em uma revisão publicada nessa mesma
revista, foi demonstrado que células T são capazes de entrar diretamente em
contato com o SNC devido a sua capacidade migratória pelo liquido
cefaloraquidiano (CFS). Esse contato seria capaz de promover uma manutenção da
capacidade cognitiva.
Em
um modelo ousado onde o autor faz uma comparação ao modelo de Matzinger (1994),
a própria atividade cerebral, assim como o estresse associado ao aprendizado
seriam capazes de liberar moléculas sinalizadoras , equivalentes aos DAMPs que atuariam diretamente na
resposta imunológica induzindo um padrão protetor. Essas moléculas sinalizadoras
como debris celulares (neurônios/glia) e neurotransmissores, seriam liberados
no CFS e ativariam as células T presentes. Essas por sua vez assumiriam uma
tarefa pro-cognitiva fundamental para a manutenção da homeostase do SNC. O
perfil dessas células TCD4 envolvidas com a cognição parece estar relacionado
com a citocina IL-4, uma vez que camundongos nocautes para essa citocina
diminuiam a sua capacidade de memoria e aprendizado quando comparado aos
controles. Mas o papel direto ou indireto dessa citocina ou da célula produtora
da mesma ainda precisa ser avaliado.
Lacunas
ainda existem nessa teorização, mas com certeza a relação direta do sistema
imunológico com SNC mais uma vez foi comprovada com os achados relatados pelos
autores. As perspectivas futuras para essa relação, apontam para as células do
sistema imunológico que agora passam a desempenhar funções no SNC o que antes
acreditava-se ser realizado principalmente por moléculas sinalizadoras.
1- Pro-cognitive
properties of T cells. Kipnis J, Gadani S, Derecki NC. Nat Rev Immunol. 2012
Sep;12(9):663-9. doi: 10.1038/nri3280.
Ransohoff RM,
Engelhardt B. Nat Rev Immunol.
2012 Sep;12(9):623-35. doi: 10.1038/nri3265.
Patrícia
Rodrigues Marques de Souza e Leandro Marques de Souza (UFS)
Interessante isso hem!!!! Eu acho que uma respostinha Th2 pode ser boa.
ResponderExcluirNa minha idade será que esse mecanismo ainda funciona o Roque?
Ou seria melhor uma transferência adotiva??
Venda de IL-4 esta liberada?
Pois é, professor ..
ExcluirUma transferência das próprias Th2 .. células T KO para GATA-3, IL-4. Células T com algum defeito na sinalização via TCR pra ver a importância de sua ativação.
Dá pra brincar de muitas maneiras diferentes ..
O artigo é bem fundamentado, mas acho que os autores deveriam ter utilizado mais testes comportamentais (além do labirinto de Morris, adicionar o labirinto em cruz elevado, caixa claro-escuro, campo aberto, etc) para certificar que os efeitos são reais, e não “vícios” da ferramenta, já que animais doentes podem apresentar diferentes comportamentos em diferentes equipamentos, o que pode enganar o observador (Bassi et al., 2012; Yaguchi et al., 2010).
ResponderExcluirPor outro lado, distúrbios psiquiátricos, tais como no Alzheimer, esquizofrenia e depressão maior, podem levar a alterações imunes (Schwarz et al., 2001; Raison e Miller, 2013). Inclusive, alterações no nível de citocinas Th-2 foram encontradas, tais como TGF-b (Vawter et al., 1997, 1996), IL-10 (Cazullo et al., 1998) e IL-4 (Mittleman et al., 1997; Ramchard et al., (1994). Outros estudos mostram que se PODE ter uma alteração da resposta celular Th1 para uma resposta humoral Th2 em distúrbios psiquiátricos, tais como a esquizofrenia (Schwarz et al., 2001).
Além disso, o sistema imune pode contribuir para a manutenção da homeostasia do organismo, visto células do sistema imune possuírem a capacidade de produzir (e ter receptores para) compostos essenciais para a homeostasia do organismo, entre eles GABA (Mendu et al., 2012; Fuks et al., 2012), acetilcolina (Kawashita e Fujii, 2000) e dopamina (Pacheco et al., 2009).
Um outro ponto interessante não é explorado é que animais nocautes para qualquer mediador imune podem apresentar defeitos em células do sistema nervoso, visto citocinas e quimicinas terem papel fundamental na diferenciação e manutenção dessas, podendo levar a alterações no comportamento. Por exemplo, o TGF-b é essencial para a diferenciação de neurônios dopaminérgicos (Farkas et al., 2003), o GATA2 para a diferenciação de neurônios GABAérgicos (Kala et al., 2009), e a IL-4 modula o crescimento e o funcionamento microglial (Suzumura et al., 1994) e induz a expressão de fatores neuroniais pelos astrócitos (Awatusji et al., 1993).
Com esses dados ficam três perguntas:
1) Será que os efeitos comportamentais vistos nos animais nocautes para citocinas (ex: IL-4) não são devido a um efeito cognitivo direto na diferenciação e regulação neuronial a um efeito puro do sistema imune?
2) Apesar do animal nocaute não ter uma determinada citocina, será que a expressão do receptor desta citocina estará normal, ou não é mais expressada, ou estará suprarregulada? Pois na ausência de ligante específico, alguns tipos de receptores podem aumentar sua expressão.
3) Os efeitos da restauração imunológica na cognição são agudos ou crônicos? (o que pode responder a pergunta 2)