Tem um
livro que todo mundo tinha que ler que se chama Freakonomics – que um
jornalista e um economista escreveram juntos e que mostra, de forma genial
mesmo, como o fato de analisar dados aparentemente não correlacionados pode nos
ajudar a desvendar os quebra-cabeças mais difíceis. O truque, revelado sempre
no final de cada capitulo, é saber
o que medir, e como medir.
Nesse livro
por exemplo aprendi que economia não é uma ciência chata de números e cifras, como me parecia, mas sim a ciência de entender que incentivos
são necessários para determinados indivíduos fazerem uma determinada coisa. Que a sabedoria convencional, ou bom
senso, freqüentemente estão errados. E que efeitos dramáticos normalmente tem
uma causa distante e muitas vezes sutil, que não parece estar relacionada ao
que estamos observando. Achei isso muito parecido com o que a gente faz, em
biologia. Por isso adorei esse livro, e freqüentemente volto e releio partes, e
descubro coisas novas – olha , vale a pena ler. No inicio do livro eles mostram
como o declínio do crime nos EUA de 1990 para 2005 foi atribuído a causas
diferentes, em hipóteses que foram subseqüentemente refutadas - como declínio da venda de armas – que
não tinha acontecido na verdade. E finalmente quando o problema foi decifrado,
viu-se uma relação causal com a legalização do aborto – menos crianças nascendo
na pobreza, menos crime. Polêmico?
Pode apostar.
Lembrei
disso porque um colega que é médico me parou no corredor hoje pra conversar
sobre como é enorme a taxa de internação de crianças com bronquiolite em
populações , ou países, pobres comparados com ricos. Não tem remédio, não tem o
que fazer, ele falou. Tem gente que acha que na pobreza tem mais inalação de
LPS – veja abaixo este artigo – ativaria mais as células dendriticas pulmonares
e que isso explicaria uma maior irritação basal nos pulmões em populações menos
favorecidas. Tem estudos que mediram LPS na fumaça de fezes de gado (!) e correlacionaram com a
bronquiolite – aparentemente pessoas pobres de áreas rurais queimam fezes de
gado, e essa fumaça tem mais LPS do que fumaça de lenha. Eles inalariam LPS
cronicamente... Hmmmmm.....Really? Ou será que a população mais pobre, sem
educação e sem ajuda, vai mais para o hospital se a criança começa a tossir,
pois não sabem como resolver o problema em casa, ou não tem médico particular?
Chego em
casa e de noite, lendo transversalmente o JAMA de 1 de Agosto de 2012, me chama
a atenção uma letter de pesquisadores da Universidade de Queensland, na
Austrália, falando sobre o crescente surto de coqueluche e a modificação da
vacina DTP – a tríplice bacteriana, que ocorreu a partir de 1997. Primeiro
fiquei surpresa pois não sabia desse surto de coqueluche – aparentemente vem
ocorrendo na Austrália e nos EUA, desde 2008, e numa franca ascendente. Foram estudadas crianças entre 8 e 14 anos que estão tendo a doença, e elas ou foram
vacinadas ou com a vacina antiga, DTP, que tinha vários efeitos colaterais, era
chatinha, dava febre, e podia dar até convulsões em algumas crianças; ou com a
vacina nova, DTaP, ou pertussis acelular, que não dá bode; ou com uma mistura
das duas. Vejam na figura que quem se da pior são as crianças que foram
vacinadas com a vacina nova, ou com a mistura dos dois regimes. Nas que
receberam mistura, ficaram piores as que tiveram a primeira dose de DTaP, e não
de DTP - ou DTwP, whole pertussis.
Incautos
poderiam dizer que a vacina não protege. Isso é perigosíssimo pois a vacina DTwP
tinha praticamente erradicado a doença, até 2008. Essa nova DTaP pode não
proteger da mesma forma. Contudo, fico pensando – nesse rebanho recente de
crianças, que cresceu em uma época em que a coqueluche estava praticamente
erradicada – será que não tem um monte de crianças que não se vacinou? Onde
estariam esses dados? Será que a
DTaP não protege, ou será que a vacina perde a eficácia se o rebanho não esta
protegido adequadamente?
Saber o que
medir, e como medir – tai um grande desafio.
Chronic
endotoxin exposure produces airflow obstruction and lung dendritic cell
expansion. Lai PS, Fresco JM, Pinilla MA, Macias AA, Brown RD, Englert JA, Hofmann O, Lederer JA, Hide W, Christiani DC, Cernadas M, Baron RM. Am J Respir Cell Mol Biol. 2012 Apr 19.
Number and order of whole
cell pertussis
vaccines in infancy and disease protection.Sheridan SL, Ware RS, Grimwood K, Lambert SB. JAMA. 2012 Aug 1;308(5):454-6.
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