Ultimamente tenho notado que uma fração pequena dos artigos produzidos por imunologistas trata do tema das vacinas. Entre os artigos que abordam o tema, geralmente os grupos envolvidos são virologistas ou microbiologistas. Será que os imunologistas estão perdendo o interesse em vacinas, ou perderam a esperança?
Por isso resolvi trazer o assunto para o nosso blog. Vale lembrar que a prática de vacinação infantil está entre os principais fatores responsáveis pelo aumento da expectativa de vida em países industrializados durante o século XX. Entre essas vacinas, está a vacina contra influenza. A primeira vacina contra influenza foi desenvolvida pelo cientista Maurice Hilleman em 1957. Hilleman previu a pandemia de 1957 pelo vírus da influenza e conseguiu isolar a nova cepa e desenvolver rapidamente uma vacina que foi capaz de proteger milhões de pessoas nos Estados Unidos (1,2,3).
O vírus da influenza, com sua alta capacidade de mutação, evade o sistema imune, impedindo o seu reconhecimento por anticorpos neutralizantes. Para contornar esse problema, o programa de vacinação da Organização Mundial de Saúde recomenda a vacinação anual contra as variantes de influenza sazonais (4). As variantes com maior probabilidade de emergir em uma dada época são incluídas na próxima safra de vacinas. O problema é que nem sempre as predicões são corretas, gerando vacinas com baixa proteção contra diferentes cepas sazonais, como foi o caso da pandemia do ano passado. Daí a necessidade de se desenvolver uma vacina universal que gere anticorpos neutralizantes contra regiões conservadas do vírus, garantindo proteção contra qualquer cepa do vírus.
Em um artigo recentemente publicado na edição de 27 de agosto da revista Science, o grupo liderado pelo virologista Gary Nabel do NIH em colaboração com o Centro de controle e prevenção de doenças (o famoso CDC) desenvolveram uma nova estratégia vacinal para potencializar a resposta de anticorpos neutralizantes contra influenza (5). As vacinas sazonais atualmente disponíveis usam variantes inativadas de vírus H1 e H3 que geram anticorpos neutralizantes contra regiões hipervariáveis da glicoproteína hemaglutinina A (HA). O grupo de Nabel apostou na idéia de que priming com vacina de DNA e subsequente vacinação com a vacina tradicional poderia potencializar a resposta de anticorpos neutralizantes (6). Os autores utilizaram para o priming um plasmídeo de DNA que codifica HA, e para o boost, a vacina sazonal ou adenovírus não replicante, também codificante de HA. Essa estratégia levou à geração de anticorpos capazes de neutralizar várias cepas do H1N1, desde as variantes de 1934 até a de 2007, em camundongos, furões e macacos. Os resultados apresentados são bastante promissores e podem levar à uma vacina universal contra influenza humana, dispensando a atual necessidade de vacinação anual. Entretanto, uma pergunta que ficou no ar foi por que essa estratégia de priming com DNA gera anticorpos neutralizantes contra epitopo conservados, enquanto a vacina sazonal somente gera anticorpos neutralizantes contra regiões varíaveis da mesma proteína. Alguma idéia?
Referências
1. Offit PA. Vaccinated: one man’s quest to defeat the world’s deadliest diseases. 2007. HarpperCollins Publisher, New York, NY.
2. Kurth R. News and Views: Obituary Maurice Hilleman (1919-2005). Nature. 2005. 434:1083
3. HILLEMAN MR, FLATLEY FJ, ANDERSON SA, LUECKING ML, LEVINSON DJ. Antibody response in volunteers to Asian influenza vaccine. J Am Med Assoc. 1958
166:1134-40.
4. World Health Organization, about WHO Global Influenza Programme. 2010. http://www.who.int/csr/disease/influenza/en/
5. Wei CJ, Boyington JC, McTamney PM, Kong WP, Pearce MB, Xu L, Andersen H, Rao
S, Tumpey TM, Yang ZY, Nabel GJ. Induction of broadly neutralizing H1N1 influenza
antibodies by vaccination. Science. 2010. 329:1060-4.
6. Wu L, Kong WP, Nabel GJ. Enhanced breadth of CD4 T-cell immunity by DNA prime and adenovirus boost immunization to human immunodeficiency virus Env and Gag immunogens. J Virol. 2005. 79:8024-31
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