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sexta-feira, 3 de setembro de 2010

As grandes perguntas da Imunologia hoje. III



Último dia de divulgação do que consideramos as grandes perguntas atuais da imunologia. Hoje divulgamos os textos de contribuidores regulares do SBlogI (blogueiros da casa) e continuamos com os textos de imunologistas estrangeiros que enviaram suas questões em 2007, para as newsletters do ImmunoRio. As contribuições anteriores podem ser vistas (aqui e aqui).
Veja as contribuições de Verônica Coelho, João Santana da Silva, Tiago Mineo e Manoel Barral-Netto
Veja também as contribuições de mais participantes do ImmunoRio 2007: Stefan H.E. Kaufmann , Eli Sercarz - (in memorium), Philippa Marrack, Peter Doherty, Noel R. Rose, Rolf Zinkernagel, Matthias von Herrath, Hidde Ploegh, Michael Dustin, Megan Sykes, Rachel R. Caspi, Ralph M. Steinman, Brigitte Autran, Shizuo Akira, Adriana Gruppi, Armand Bensussan, Alexis M. Kalergis e  Antonio Nunez-Roldan.


O que você, caro leitor, as principais questões/desafios da imunologia?

Verônica Coelho
Aqui vão algumas das questões que considero instigantes na imunologia e mais abaixo, apresento as respostas de alguns cientistas que participaram do nosso livro. Aliás, quem tiver interesse em conhecer outras respostas e ter um exemplar do livro, ainda temos para doação. Entre em contato. 
1. Indução de tolerância imunológica na clínica:
A indução de tolerância no contexto clínico, seja no transplante seja no contexto de doenças autoimunes, permanece um desafio. Conseguimos induzir tolerância imunológica em diversos modelos animais, mas ainda enfrentamos grandes dificuldades na sua tradução para a clínica.  Por que tamanha dificuldade? Não temos todas as respostas. Sabemos, hoje, que existem múltiplos caminhos para tolerância, ficando clara a complexidade do fenômeno. Considero um grande desafio identificar mecanismos dominantes dentre esses vários caminhos e elaborar estratégias de imunointervenção combinadas que estimulem alguns desses mecanismos. Para isso, pelo menos três coisas parecem-me particularmente importantes: 
(i) aprender com os contextos de tolerância fisiológica bem sucedidos, como na tolerância materno-fetal, na tolerância operacional, no transplante humano, e com a fisiologia do sistema imune, 
(ii) desenvolver estratégias para aprimorar a análise e interpretação de fenômenos complexos, com múltiplos parâmetros, 
(iii) avançar na compreensão da relação do sistema imune com os sistemas nervoso e endócrino. 
2. Autoimunidade benéfica x autoimunidade patológica:
Nos últimos pouco mais de 60 anos, o conceito de autoimunidade passou de uma visão unicamente patológica para uma visão de que a autoimunidade também pode ser fisiológica e ter um papel benéfico, imunorregulador. A observação de que as células T reguladoras são, muitas vezes, autorreativas tem reforçado a aceitação, pela comunidade científica, de que a autoimunidade também pode ser imunorreguladora. 
Uma questão instigante, nesta área, é compreender que fatores e contextos direcionam a autoimunidade nesses dois caminhos funcionalmente opostos – autoimunidade patológica e imunorreguladora. O mimetismo molecular e a reatvidade cruzada não me parecem suficientes para direcionar a autorreatividade para doença, uma vez que a reatividade cruzada faz parte da fisiologia do sistema imune. Acredito que compreender melhor a fisiologia do sistema imune e a autoimunidade fisiológica, integrando inclusive os componentes funcionais da resposta imune inata dirigida a autoantígenos, nos ajudará a identificar formas de estimular a autoimunidade imunorreguladora, e usá-la para nosso benefício, em contextos em que há quebra da homeostase, favorecendo a autoimunidade patológica. 
  1. As células tronco mesenquimais podem fazer parte do sistema imune?  Talvez, esta não esteja entre as questões mais importantes a serem respondidas na imunologia, mas considero uma questão instigante que gostaria de lançar para debate neste fórum. Se levarmos em conta que as células tronco mesenquimais têm atividade supressora, em diversos contextos inflamatórios, estão presentes em todos os tecidos do organismo, e interagem com diversas células do sistema imune, ao menos in vitro, será que elas podem compor, funcionalmente, o sistema imune? A investigação desta questão poderá acrescentar uma nova visão ao sistema imune e trazer informações relevantes para a elaboração de novas estratégias de imunointervenção. 
João Santana da Silva
  1. Reconhecimento. 
Esse tema envolvem as células e mecanismos utilizados para o reconhecimento e as moléculas a serem reconhecido. Com o avanço das técnicas de imunologia estão sendo identificados diferentes células envolvidas no reconhecimento (nuócitos, NH, NK-22, etc) e novos moléculas que podem ser reconhecidas. Esse tema envolve os mecanismos de sinalização intracelulares e tráfego de células. Assim poderemos desvendar os mecanismos que levam a proteção e os que tem resultam em efeitos deletérios. Será possível tanto induzir uma resposta única, monoclonal ou não, protetiva, ou deletar parte de uma resposta que resulta em lesão, como nas doenças a auto-imunes. 
  1. Regulação 
Esse tema esta relacionado em parte com o anterior. Teremos que conhecer os melhores mecanismos de induzir resposta efetora, desde a parte concernente ao uso de qual tipo de adjuvante, o tipo de resposta gerada (Th1, 2, 9,...), o tempo de duração, e se protetora ou deletéria.  Tão importante quanto, será determinar os mecanismos que controlam tal resposta. Novamente teremos informações para induzir resposta protetora e modular as deletérias. 
  1. Tecnologia e divulgação - Esse se refere mais a nós, os brasileiros. Temos garlalos importantes que necessitam ser sanados. Um deles, o mais necessário, é domínio da tecnologia de transgênicos e “knockouts”. Para tal temos que divulgar as técnicas de criação e manutenção de tais animais. Temos que dominar diversas novas técnicas de biologia celular, mas principalmente desenvolver os equipamentos e metodologias que levam a tal fim. Temos que incentivar a criação de novas empresar com tal finalidade. O outro aspecto é como divulgar a Imunologia para todos, incluindo aos órgãos governamentais, a nós cientistas e ao público leigo. 
Note que domínio dos tópicos 1 e 2 pode nos levar a construção de vacinas, sejam elas para as nossas diversas parasitoses ou diferentes doenças auto-imunes. O tópico 3 é que nos possibilitará a conseguir tal feito, usando a tecnologia adequada e de mãos dadas com o povo.
Tiago Mineo
- Nos últimos anos, o paradigma Th1/Th2 foi largamente ampliado pela descrição de várias outras sublinhagens de linfócitos T CD4+, como as células T regulatórias e seus diferentes fenótipos, Th17, Th22, Thf, Th9.... evidências recentes demonstram que os linfócitos T com fenótipo definido também produzem citocinas dos demais perfis de respostas, bem como o padrão geral de uma resposta pode vir a ser modulado na dependência de protocolos de intervenção. Minha dúvida paira sobre o seguinte aspecto: uma célula comprometida com um determinado perfil de resposta pode ser convertida? Ou, de forma mais geral: qual a real estabilidade das populações de células T helper? 
- A descoberta dos receptores inatos no fim da década de noventa mudou radicalmente a Imunologia. Desde então, inúmeros artigos científicos foram publicados neste sentido, descrevendo novas famílias de receptores, suas funções, ligantes e respectivas vias de sinalização intracelular. Recentemente, podemos acompanhar por meio da literatura científica que há uma busca por protocolos de terapia e/ou profilaxia, tendo como base os conhecimentos gerados sobre tais famílias de receptores. Contudo, alguns trabalhos do grupo do Dr. JL Casanova me chamaram muito a atenção (von Bernuth et al., 2008 - Science DOI: 10.1126/science.1158298; Bousfiha et al., 2010 - Clinical Immunology DOI: 10.1016/j.clim.2010.02.001), pois relatam que crianças com deficiências autossomais recessivas no locus myd88 apresentavam graves infecções bacterianas recorrentes. Contudo, estes indivíduos apresentavam melhora no quadro clínico com o decorrer da idade e, de forma surpreendente, eram resistentes as demais classes de patógenos. Esta informação é contraditória se levarmos em conta os trabalhos realizados em camundongos geneticamente deficientes com diversos microorganismos. As minhas dúvidas sobre esta questão são: os receptores inatos, de forma individual, são tão fundamentais para a formação de uma resposta imune quanto acreditamos atualmente? Qual o grau de redundância do sistema? Será que existem outros mecanismos de indução de uma respostas imune efetora?
  • A edição de julho de 2009 do periódico Nature Immunology (http://www.nature.com/ni/journal/v10/n7/index.html) é histórica para a Imunologia e deveria ser lida atentamente por todos que militam na área. Lá podem ser encontrados um editorial e artigos de três grupos distintos sobre um mesmo tema: Basófilos como células apresentadoras de antígenos e possíveis responsáveis pela indução das respostas com perfil Th2 (Wynn, TA - DOI: 10.1038/ni0709-679; Perrigoue et al. - DOI: 10.1038/ni.1740; Yoshimoto et al. - DOI: 10.1038/ni.1737; Sokol et al. - DOI: 10.1038/ni.1738). Para termos uma noção do impacto de tais publicações na comunidade científica, estes artigos somados foram citados mais de 200 vezes no período de um ano. Neste sentido, minha dúvida reside no seguinte aspecto: será que veremos a partir de agora uma busca por novas células apresentadoras de antígenos? Ou, de uma forma mais direta, temos outras linhagens de células apresentadoras de antígenos não-clássicas?
Manoel Barral-Netto
Mais que perguntas, apresentarei alguns dos grandes desafios que se colocam para a imunologia hoje.
Sistema imune humano
Para a maioria dos imunologistas, o homem tem sérias limitações para ser objeto de pesquisa: é muito grande, caro, não há exemplares germ free, não apresenta linhagens geneticamente homogêneas e há pouca disponibilidade de KOs e transgênicos. Por tudo isto, sabemos pouco do sistema imune humano. 
Além das diferenças biológicas entre um roedor e um mamífero, há várias diferenças que “esquecemos”: nós não comemos uma ração padronizada e igual todos os dias [embora algumas cadeias de fast food tentem chegar perto deste ideal]; nós temos stress de origem e intensidade diferentes dos camundongos criados em gaiolas; os organismos comensais e patogênicos importantes para nós não são os mesmos dos camundongos e mais uma legião de diferenças.
Em algum momento, precisaremos entender como funciona o sistema imune do homem, sem induzir cruzamentos planejados, sem alimentação homogênea etc etc.
As relações celulares em micro-ambientes
Outro “esquecimento” sistemático dos imunologistas é que, no organismo, as células não vivem sempre circulando. Os nossos estudos funcionais são, usualmente, feitos com células obtidas da circulação periférica ou desgarradas de suas relações e interações. As células circulantes representam um parcela especial do total de células dos sistema imune, este viés de seleção é pouco valorizado. 
Os estudos com células no seu ambiente natural tendem a ser morfológicos apenas. Logicamente o desafio de entender o funcionamento das células em toda a complexidade de suas relações com a matriz e com as células vizinhas é imenso. Ele exigirá todo o desenvolvimento de abordagens, técnicas e raciocínio pouco desenvolvido hoje.
Análise de sistemas complexos
Por falar em complexidade, chegamos na extrema simplificação utilizada na análise dos nossos dados. Estamos frente a um sistema complexo, extremamente complexo. As citocinas e quimiocinas podem bem ilustrar o grau de complexidade. Entender o funcionamento de numerosas moléculas, com funções à curta e longa distância e com efeito pleiotrópico,  já é um grande desafio à nossa compreensão. Mas isto não é tudo: para determinar os efeitos destas moléculas é importante saber a dose, a sequencia de sinais dados por diferentes citocinas sobre as células, o estado da célula ao receber cada sinal. Como se não bastasse, para estes estudos, empregamos proteínas recombinantes e “desconhecemos” a importância dos efeitos pós-translacionais e epigenéticos.
Para entender este sistema empregamos análises cartesianas. Embora admirador de Descarte, relembro que ele morreu em 1650. Desde então temos visto que a realidade, incluída a imunologia, é mais complexa do que se imaginava.
Revisitando o livro: 
ImmunoRio2007 Newsletters: science and scientists
What do you regard to be a particularly challenging question to be answered in Immunology?
Stefan H.E. Kaufmann (Alemanha)
Future immunology will diverge into two main directions which are not virtually exclusive: 1) Careful analysis of the pathways that determine the function and fate of distinct immune cell populations and their complex interactions in vivo. 2) The more biomedical-related approaches focusing on prevention and therapy of diseases by using immunologic strategies.

Eli Sercarz (EUA) - (in memorium)
How to overcome the negative local environment to succeed at cancer therapy. How to control or to activate the regulatory arm of the response when needed.
Philippa Marrack (EUA)
How does innate immunity affect autoreactivity?  How can innate immunity be manipulated to make more effective vaccines?
Peter Doherty (Austrália)
How can we manipulate immunity to protect against, or promote recovery from, persistent infections.
Noel R. Rose (EUA)
How to predict disease before it occurs and institute measures on an individual or populational basis to prevent it.
Rolf Zinkernagel (Suíça)
Whether our theoretical concepts, including so called tolerance or memory or specificity can be quantitatively and reliably measured in correlation with protection. For example, we still do not have a vaccine against Tuberculosis, Hepatitis C virus infections or against HIV-1. To find potential vaccines or to come up with non-immunological alternatives (antivirals, prevention) is a huge challenge. 
Matthias von Herrath (EUA)
Dealing with complexity and feedback circuits of the immune system.
Hidde Ploegh (EUA)
To integrate fundamental biochemistry and cell biology with the  functioning of the immune system in an integrated fashion
Michael Dustin (EUA)
Understand immune system well enough to cure autoimmune diseases and stimulate effective immunity to TB and Malaria. 
Megan Sykes (EUA)
We need a better understanding of the signalling pathways that downmodulate T cell responses (e.g. CTLA4, BTLA) and of the several pathways leading to T cell tolerance.
Rachel R. Caspi (EUA)
Understanding the immune system at a level that will permit exploiting its natural regulatory mechanisms to reprogram unwanted responses (autoimmunity), and to elicit desired ones (vaccines).
Ralph M. Steinman (EUA)
High on my list is to understand the immune system well enough that better antigen or disease specific therapies and vaccines will ensue in the many prevalent and pressing medical conditions that involve the immune system. 
Brigitte Autran (França)
To create efficient vaccines against HIV, malaria, tuberculosis and other devastating diseases.
Shizuo Akira (Japão)
How the acquired immunity and long memory are generated after recognition of pathogens. 
Adriana Gruppi (Argentina)
A molecular understanding of memory generation and maintenance, and regulation of autoreactive and specific immune response. The understanding of these subjects would significantly improve our capacity to promote protective immunity, without detriment of host-self constituents.
Armand Bensussan (França)
To visualize in vivo how all the different actors of the immune system work together to fight against pathogens and/or malignancies. 
Alexis M. Kalergis (Chile)
I think there are several important challenging questions that need to be addressed. I am particularly fascinated by the molecular mechanisms behind the fine tuning of adaptive immune responses against pathogens, that prevent autoimmune destruction of healthy tissues. The clarification of these regulatory mechanisms would significantly improve our capacity to promote protecting immunity, without damaging host self constituents.
Antonio Nunez-Roldan (Espanha)
How cancer cells evade immune response.

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Um comentário:

  1. Olá blogueiro,
    É muito importante também incentivar a doação de órgãos e conscientizar as pessoas sobre a importância deste gesto de solidariedade.
    Para ser doador de órgãos não é preciso deixar nada por escrito. O passo principal é avisar a família sobre a vontade de doar. Os familiares devem se comprometer a autorizar a doação por escrito após a morte. Divulgue a ideia e salve vidas!
    Para mais informações: comunicacao@saude.gov.br
    Ministério da Saúde

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