A vida dá
voltas. Esta semana faz um mês que deixei a bancada e os experimentos para trás
e iniciei uma nova jornada. Meu ambiente
de trabalho é agora um escritório. Meu ofício requer somente um computador, um
telefone e uma paciência imensa para lidar com egos, frustrações, concorrência
e conflitos. Vida de editor (ao
contrário do que as pessoas imaginam) não é fácil.
Enquanto
cientista, eu (e todo mundo que eu conheço e com quem já trabalhei) tinha meus
preconceitos com editores e o mercado editorial em geral. Especialmente nas
grandes revistas, onde a concorrência para publicação é enorme e o índice de
aceitação de artigos é muito baixo.
Compreensível. O editor está linha de frente. É ele quem redige e envia
as temidas cartas de rejeição. Obviamente, ninguém gosta de ter seu trabalho
rejeitado. Logo, o editor leva a fama de mau.
Benjamin
Lewin, fundador da Cell (que depois se tornou Cell Press) era amado pela
comunidade científica e idolatrado como modelo do editor que em primeiro lugar
é um excepcional cientista. Reza a lenda que Ben Lewin nunca rejeitou um paper sequer. O resto
da equipe mandava as cartas de rejeição e ele (e somente ele) mandava as cartas
de aceite. Muito esperto.
A Cell (e
demais revistas da Cell Press) segue ainda hoje o modelo estabelecido por Ben
Lewin, que é ter uma equipe de editores que em primeiro lugar é formada por
ótimos cientistas. Em segundo lugar, que é multidisciplinar. E por último (e
mais importante), que toma decisões editoriais em equipe, o que a meu ver é um
modelo mais justo e equilibrado, se comparado a outras revistas onde um único
editor é responsável por uma área inteira do conhecimento.
É
interessante também observar como muitos dos preconceitos em relação à
publicação editorial não tem fundamento.
Comentários como: ‘meu paper foi rejeitado e nem sequer foi lido’ ou
‘não tenho a menor chance de publicar na Cell porque sou de um
laboratório que não é famoso’ ou aquela história de que ‘fulano ou sicrano
ligou para editor e tudo foi resolvido’.
Em 1 mês,
acredite, já rejeitei muitos papers. Todos foram lidos (inclusive os que não tem
potencial para ser aceitos nem na revista do Cebolinha). Com uma média de 15-20
novos artigos submetidos todos os dias, nunca vi ninguém tomar uma decisão
editorial baseada no fato de que o artigo veio deste ou daquele laboratório. E
sim, é verdade que o fulano e o sicrano muitas vezes querem falar diretamente
com o corpo editorial. Longe de ser um problema, isso é encarado como algo
normal a ser estimulado. É importante que haja um canal aberto entre editores e
autores – não importa de onde eles sejam. Esse é um hábito que ainda não existe
no Brasil. É importante que os editores de revistas relevantes estejam
antenados e informados a respeito do que está acontecendo de interessante no
país. Que frequentem os congressos nacionais e internacionais que estão
acontecendo por aí. É importante que os editores saibam de onde a produção
científica brasileira de qualidade está vindo.
Um editor
empolgado com o seu paper vai fazer tudo que estiver ao alcance dele/dela para
ver aquele trabalho publicado. Só não se esqueça que o editor é um mediador.
Embora ele seja responsável pela decisão final, ele levará em consideração a
opinião dos especialistas na área – os revisores. Aí é que o negócio fica mais
complicado. Cientistas são seres humanos e portanto nem sempre isentos no
julgamento do trabalho alheio. Nessas horas, o papel do editor é ainda mais
fundamental, ao determinar o que é uma solicitação razoável, o que é um
comentário justo, o que é um julgamento que no fundo tem outras intenções. Não
é tarefa simples.
Joao Monteiro
Editor Científico
Cell
PS: Nos
próximos posts, vou escrever um pouquinho a respeito de diversos aspectos do
mercado editorial, como escrever uma ‘Cover letter’, como ler uma carta de
rejeição, a importância do ‘abstract’, ‘Open Access’ e os diversos modelos
editoriais, ‘Peer-review’, etc. Check it out!
Parabéns João pelo post... gostei bastante.. e fiquei ainda mais curiosa sobre os próximos !! Abraço Josi
ResponderExcluirParabéns João pelo post... gostei bastante.. e fiquei ainda mais curiosa sobre os próximos !! Abraço Josi
ResponderExcluirótimo post, é bom saber a visão de quem está do outro lado! também intrigante saber o que se passa pela cabeça de um editor, aguardando novos posts!
ResponderExcluirMuito bom!!!! E estou curiosa para saber sobre os próximos posts.
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