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quarta-feira, 22 de julho de 2015

Vacina contra sarampo: compre uma e leve várias

Por Helder Nakaya, professor da FCF/USP

O médico britânico Andrew Wakefield pode colocar mais um item em sua longa lista de “Danos parcialmente causados por mim”. Em 1998, ele e outros autores publicaram na prestigiada revista Lancet um artigo que associava a vacina tríplice (sarampo, caxumba, rubéola) ao autismo. Guiado por opiniões e diversos conflitos de interesse, Andrew divulgou amplamente sua “pesquisa” dando entrevistas e advogando contra o uso da vacina tríplice (mas sim vacinações individuais para cada vírus).  Ainda demorou 12 anos para finalmente a retratação acontecer, mas até lá, os danos já estavam feitos. O maior deles foi alimentar o movimento anti-vacinas e todas as consequências associadas a esse retrocesso, incluindo aí o reaparecimento de casos de sarampo nos EUA e Europa (veja aqui, aqui e aqui).




Estima-se que a vacina de sarampo preveniu entre 2000-2013 mais de 15 milhões de mortes. No entanto, este número é muito maior! Isso porque não estão computadas as vidas salvas indiretamente pela vacina. Um artigo publicado recentemente na Science mostrou que a infecção por sarampo está associada a uma imunossupressão prolongada que pode durar até 3 anos, aumentando a predisposição das pessoas a doenças oportunistas. Usando dados populacionais de mortalidade, os pesquisadores notaram que o número de casos de sarampo estava fortemente correlacionado ao número de mortes infantis de doenças não relacionadas a sarampo (por exemplo: pneumonia, diarreia e meningite). O mais interessante é que o início da vacinação (que fez diminuir muito os casos de sarampo) coincide com a redução destas mortes não relacionadas a sarampo. Quando a comparação é feita com outra doença (pertussis) também prevenida por vacina, esta correlação não é observada, demonstrando que a sequela no sistema imune não se aplica a todos os patógenos.

Uma das explicações para essa observação vem de experimentos em macacos infectados pelo vírus do sarampo. Os autores desse trabalho mostram que o vírus do sarampo é capaz de infectar e matar linfócitos B e T de memória (especificamente linfócitos T CD45RAneg e linfócitos B foliculares). Apesar do número de linfócitos retornar ao normal dias após o fim dos sintomas do sarampo, a imunossupressão se estende por meses. Ou seja, o vírus do sarampo causa uma “amnésia imunológica”!

Vacinação é um contrato social: se você resolve não se vacinar mas todos a sua volta estão vacinados, muito provavelmente você estará protegido da doença (imunidade de grupo ou herd immunity). É essa falsa sensação de proteção do não vacinado que muitas vezes estimula o movimento anti-vacinas. O que os autores da Science sugerem é que assim como a vacinação pode aumentar a imunidade da população contra futuras epidemias para sarampo, infecções por sarampo podem reduzir a imunidade contra outras infecções. Deste modo, a vacinação contra sarampo não apenas preserva a imunidade de grupo contra sarampo mas também contra infecções diferentes.


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