Figura 1: Um único grupo fosfato
carregado negativamente (roxo) torna as bactérias sensíveis a peptídeos
antimicrobianos
Nosso sistema imune deve estar sempre preparado para combater infecções
intestinais (bad bacteria) utilizando
das mais avançadas “armas” microbicidas. Dentre elas temos os chamados
peptídeos antimicrobianos (do inglês, antimicrobial
peptides, AMPs), que por sua vez são responsáveis pela destruição da
membrana bacteriana. No entanto, como as bactérias comensais (good bacteria) sobrevivem à liberação
desses peptídeos durante uma infecção, mantendo sua população estável no
intestino permanece desconhecido. Até o momento, acreditava-se que as bactérias
comensais não estavam em contato com as células secretoras de AMPs e portanto
não eram afetadas. No entanto, novos achados já demonstraram que as bactérias
comensais estão sim em contato com a camada de muco intestinal (aqui), ficando, portanto, na mira desses peptídeos
antimicrobianos. Portanto, por que apenas as bad bacteria sucumbem aos
AMPs, mas não as good bacteria? Como o sistema imune faz o
crivo? Ou qual mecanismo evolutivo as bactérias comensais desenvolveram a fim
de sobreviverem a esses peptídeos?
Para responder essas perguntas, Cullen e colaboradores (aqui) vieram demonstrar de maneira bastante elegante na
edição de janeiro da Science que
apesar de cada espécie de bactéria comensal possuir sua própria assinatura
gênica de resistência frente a uma resposta a peptídeos antimicrobianos, existe
um único gene que é compartilhado por todas as bactérias comensais analisadas.
Esse gene recebeu o nome de lpxF e
possui como função dar origem a uma fostatidil-glicerol fosfatase, que por sua
vez é responsável por catalizar a remoção de um grupo fosfato carregado
negativamente do lipídeo A do LPS (Figura 1). De forma interessante, foi
demonstrado que a bactéria comensal Bacteroides
thetaiotaomicron possui entre 680-2400 vezes mais resistência a AMPs quando
comparado a uma bactéria patogênica. Entretanto, quando as bactérias comensais
possuíam mutações no gene lpxF, tornando-se incapazes de remover
esse grupo fosfato do LPS, elas se tornavam completamente suscetíveis à ação
dos AMPs. Um dos experimentos mais bonitos do trabalho foi colonizar
camundongos germ-free com 14 espécies
de bactérias que representassem os três maiores filos encontrados em humanos
(contendo mutações ou não no gene lpxF)
e infectar esses animais com uma bactéria patogênica (C. rodentium) 7 dias depois (Figura 2, barras vermelhas). Foi
observado que bactérias mutantes para lpxF
simplesmente sumiam após a infecção com C.
rodentium, devido ao aumento da secreção dos AMPs (Figura 2B, barras
pretas). No entanto, as bactérias wild-type
permaneciam estáveis durante a "perturbação" causada pela infecção
(Figura 2A, barras pretas). Em suma, o trabalho demonstra um dos mecanismos
pelos quais nosso organismo é capaz de viver em completa harmonia com nossas
trilhões de bactérias comensais. Nas palavras do próprio autor: “A delicate balance between microbial
resilience and host tolerance thus allows for commensal persistence throughout
a diverse range of perturbations while preventing commensal overgrowth or
depletion, either of which could have deleterious effects on the host”.
Figura 2: Camundongos germ-free foram colonizados com 14
bactérias encontradas na microbiota intestinal humana e foram infectados com C.rodentium (barras vermelhas) 7 dias
depois. Barras pretas representam uma bactéria comensal sem (A) ou com (B)
mutações em lpxF.
Post de Frederico Ribeiro (Doutorando IBA/FMRP-USP)
Frederico, voce escolheu um bom paper e o descreveu muito bem. Parabens!
ResponderExcluirMuito obrigado pelas palavras, prof. Sergio Lira!
ResponderExcluir'otimo post Fred!!! Parabens!
ResponderExcluirValeu Marcelinha!
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