Embora seja bem estabelecida a
relação entre inflamação e carcinogênese, ainda não se sabe ao certo o papel
específico que cada subpopulação de leucócitos desempenha durante as fases
iniciais do desenvolvimento tumoral. Ao ser constatado que IMCs, immature myeloid cells, (CD33+S100A9+) concentram-se
em tecidos de humanos acometidos por inflamação crônica, a pergunta que direcionou o artigo recém publicado por Ortiz e
colaborados na Journal of
Experimental Medicine foi: poderiam estas células contribuir para a
tumorigênese? Para responder a essa
pergunta, o grupo empregou o uso de camundongos de background Tg.AC
(expressa o transgene mutante v-h-ras no
promotor da ζ-globina)
que superexpressam a proteína S100A9
em células mielódes, sendo denominados de camundongos S100A9Tg. Dois modelos de carcinogênese de pele foram utilizados.
Para a indução do tumor nos animais de background
Tg.AC, foi empregada a administração tópica de TPA (12Otetradecanoylphorbol13acetate) duas vezes por semana durante
4-6 semanas. Para a indução de tumor de pele nos animais de background C57BL/6, estes receberam uma
única aplicação tópica de DMBA (7,12dimethylbenz(a)anthracene),
seguida de 12 semanas de tratamento com TPA a cada 24 horas.
Após o tratamento com os
carcinógenos, foi verificado por imunohistoquímica que camundongos S100A9.Tg
possuem maior acúmulo de células Gr-1+ na pele. A fenotipagem do
infiltrado inflamatório, realizada por citometria de fluxo, revelou o aumento
na frequência de células mielóides imaturas (IMCs) granulocíticas, CD11b+Ly6CloLy6G+,
nos camundongos geneticamente modificados. Para entender o papel de IMCs
na formação do papiloma, foi observado que a depleção de células Gr-1+,
em animais AC.Tg, durante as três primeiras semanas de tratamento com TPA,
resultou na redução da carcinogênese. Também foi verificado que a administração
do composto intensificou a proliferação de queratinócitos (cytokeratin 14+Ki67+) em camundongos S100A9Tg, em relação aos
animais WT (wild type). A fim de
demonstrar que o desenvolvimento de tumores de pele são de fato dependentes de
IMCs granulocíticas, o grupo empregou o uso de camundongos S100A9KO (backgroud C57BL/6). Nestes animais, foi
observado que o tratamento com DMBA e TPA promoveu menor infiltrado de células
Gr-1+ e menor formação de papilomas, quando comparados aos animais
WT. O próximo passo foi verificar se as IMCs, acumuladas na pele de camundongos
tratados, exercem atividade supressora sobre a resposta imune, uma vez que
compartilham os mesmos marcadores que as MDSCs (myeloidderived suppressor cells). Assim, tais células foram
isoladas de acordo com a expressão de Ly6G (Ly6G+) e co-cultivadas com células
do baço de camundongos OT-1 na presença do estímulo cognato ou não. O grupo
constatou que as IMCs presentes no sítio tumoral não exercem atividade
supressora, não sendo portanto classificadas como MDSCs.
Associado ao infiltrado de IMCs, o
grupo também identificou que a presença de tais células está diretamente
relacionada com o maior infiltrado de linfócitos TCD4+. A depleção
desses linfócitos, com anticorpos anti-CD4, culminou na redução da
carcinogênese, indicando que o efeito de IMCs na promoção tumoral está
associado com o recrutamento de células TCD4+. Dentre as citocinas
avaliadas, a IL-17A encontrou-se em elevados níveis na pele de animais S100A9Tg
onde, quando neutralizada, também culmina na redução da formação de papilomas
na pele.
Por fim, como IMCs recrutam
linfócitos para o sítio tumoral? Estudos in
vitro revelaram que IMCs ativadas com LPS exercem potente atividade
quimiotática somente em células T que foram estimuladas com anticorpos anti-CD3
e anti-CD28. Foi verificado que a pele de animais S100A9Tg tratados com TPA
apresentou níveis elevados de CCL4, quando comparado aos animais WT. O tratamento
com anticorpos anti-CCL4 foi capaz de reduzir significativamente o infiltrado
de células TCD4+, a quantidade de IL-17A e o número de papilomas na pele em
camundongos S100A9.Tg.
Portanto, IMCs granulocíticas
acumulam em sítios de inflamação/irritação cutânea. Quando ativadas, tais
células liberam CCL4 que, por sua vez, atraem células TCD4+. Tais células T
produzem grandes quantidades de IL-17, que estimula a proliferação de queratinócitos,
os quais contribuem para a formação do tumor. Este artigo relata pela primeira
vez o envolvimento direto de IMCs granulocíticas no desenvolvimento de tumores
de pele, via recrutamento de células Th17.
Post de Mikhael Haruo (Mestrando-FMRP/IBA)
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