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domingo, 28 de junho de 2015

Journal Club IBA: CTLA-4: uma molécula crucial na modulação de células B por células T reguladoras foliculares.


        Durante a ativação de células B, a concomitante polarização de células T foliculares é fundamental para garantir uma resposta humoral eficiente, no entanto, como todo tipo de reposta imune precisa ser modulada para impedir sua exacerbação, células T reguladoras naturais também podem ser polarizadas para um perfil regulador folicular.  O que caracteriza a uma célula T folicular efetora ou reguladora é a dupla marcação de ICOS (molécula fundamental para sua diferenciação) e CXCR5 (receptor envolvido com sua migração para o folículo linfoide). Além disso, células T foliculares efetoras secretam citocinas como IL-21, a qual participa de etapas finais de diferenciação, ativação e sobrevida de células B no centro germinativo.
O CTLA-4 é uma molécula crucial na modulação da resposta imune, sendo expressa em estágios finais da ativação de células T efetoras ou constitutivamente nas Tregs. O mecanismo de ação desta molécula pode ser intrínseco, desencadeando vias de sinalização inibitórias na própria célula que o apresenta, ou extrínseco, quando medeia a modulação através de outras células do sistema imune, como as APCs. Trabalhos anteriores demonstram que CTLA-4 é importante para regular a resposta humoral, mas o mecanismo celular envolvido com a participação de CTLA-4 neste contexto foi demonstrado no final de 2014 pelo trabalho publicado Immunity por Sage e colaboradores da Faculdade de Medicina de Havard.
O trabalho demonstra que CTLA-4 é uma molécula altamente expressa em células Tregs foliculares, sendo esta expressão correlacionada a expressão de ICOS nestas células. Em um primeiro momento é explorado o papel de CTLA-4 no desenvolvimento e manutenção de células T foliculares efetoras e reguladoras. Utilizando diferentes estratégias para induzir especificamente a deleção de CTLA-4, foi demonstrado que está molécula é capaz de frear o desenvolvimento de ambas as células T foliculares, interessantemente o CTLA-4 expresso nas Tregs foliculares, de modo indireto, podem também reduzir a diferenciação de células Thf. Assim, a ausência de CTLA-4 promove aumento de células Trf e Thf no folículo linfoide, mesmo com o aumento de células Trf as células B apresentaram-se mais ativas e em maior número. Por isso em uma segunda parte do trabalho a papel de CTLA-4 na função destas células Tf foi investigado. Como esperado, a presença de CTLA-4 em células Thf reduziu sua função efetora em promover a ativação e a troca de isótipo em células B. Já para as células Trf, CTLA-4 é fundamental para manutenção da sua atividade supressora. Em comparação as Tregs convencionais, as Trf são mais potentes na supressão da ativação de células B e da sua troca de isotipos promovida por células Thf. O artigo trabalha com um contexto de imunização e avalia esta resposta em diferentes órgãos linfoides, como linfonodos e placa de Peyer.
Em conclusão, CTLA-4 é um modulador negativo da diferenciação e proliferação de células T foliculares, tanto reguladoras como efetoras. Além disso, foi demonstrado que está molécula é crucial para a modulação da resposta humoral promovida por células T reguladoras foliculares.


Figura 1. As múltiplas funções reguladoras de CTLA-4 na célula Thf, Trf e Treg convencional no controle da imunidade humoral. CTLA-4 inibe a diferenciação e manutenção de células Thf e Trf na zona de células T do linfonodo. Além disso, a expressão de CTLA-4 em células T reg convencionais e /ou Trf suprime a expressão de B7-2 na célula B extrafolicular, entretanto, no centro germinativo a célula Trf suprime a ativação da célula B folicular por mecanismo independente da expressão de B7-2.

Referência
Sage PT, Paterson AM, Lovitch SB, Sharpe AH. The coinhibitory receptor CTLA-4 controls B cell responses by modulating T follicular helper, T follicular regulatory, and T regulatory cells. Immunity 2014; 41:1026–1039.
Arquivo completo disponível em: doi:10.1016/j.immuni.2014.12.005

Post de Morgana Borges Prado e Paulo Henrique de Melo 


terça-feira, 23 de junho de 2015

E hoje o dia terminou mais triste!!


domingo, 21 de junho de 2015

JOURNAL CLUB IBA: HIF1-α e AHR, uma união que controla o metabolismo e a diferenciação das células T reguladoras tipo 1



As células T passam por diferentes processos no seu metabolismo para se diferenciarem e desempenharem suas funções. Estas células podem ser influenciadas por diferentes fatores, tais como nutrientes, moléculas co-estimuladoras, presença de oxigênio e citocinas. Em geral, as células T em repouso utilizam principalmente a fosforilação oxidativa para a produção de ATP. Já as células T ativadas, aumentam a fosforilação oxidativa e a via de glicólise, que sustentam o crescimento e proliferação celular. No entanto, cada população de células T possui diferentes moléculas que regulam esses processos metabólicos, tanto em nível transicionais, quanto pós-transicionais. Como exemplo, enquanto células T reguladoras (Foxp3+) utilizam a via de oxidação lipídica, coordenada por AMPK, para obtenção de energia; células Th17 utilizam predominantemente a via de glicólise aeróbica, cujos principais reguladores são o mTORC1 e HIF1-α. O HIF1-α pode ser regulado positivamente nas células T, por uma grande variedade de estímulos, como ativação de TCR e CD28, produtos microbianos (LPS), IL-6, e em condições de hipóxia. Nas células Th17, é descrito por ser um fator chave na diferenciação, promovendo a expressão de genes relacionados à via glícolítica, bem como de RORγT, além de induzir a ubiquitinação e degradação de Foxp3 via proteassoma.
Embora as vias metabólicas que levam à diferenciação da maioria dos subtipos de células T já estejam caracterizadas, ainda não existem trabalhos que descrevem por quais vias as células Tr1 (CD4+ IL-10+ IFN-) obtêm energia. Em trabalho publicado este mês na Nature Medicine, Mascanfroni e colaboradores demonstram que HIF1-α é o fator transcricional responsável pelo controle metabólico de células Tr1 em fases precoces da diferenciação, induzindo a transcrição de genes que codificam para enzimas relacionadas à via glícolítica. Esta via, como demonstrado por diferentes metodologias, é a principal utilizada pelas células Tr1 durante sua diferenciação. Entretanto, em fases mais tardias, AHR passa a ser expresso em altos níveis e tem como papel induzir a degradação de HIF1-α, assumindo o controle desta via metabólica, bem como induzindo a expressão de CD39, IL-10 e IL-21, moléculas características deste subtipo celular. De modo curioso, quando há indução de HIF1-α em fases mais tardias da diferenciação de células Tr1, há uma menor polarização para este subtipo, uma vez que HIF1-α é capaz, não só de impedir a translocação de AHR para o núcleo, como de induzir sua ubiquitinação e degradação. Estes resultados sugerem que AHR e HIF1-α, em diferentes fases da diferenciação, atuam como moléculas chave na função supressora e no metabolismo de células Tr1.

Post de Marcela Davoli e William Marciel.

quinta-feira, 18 de junho de 2015

Confie no seu camundongo!



 Por Helder Nakaya, professor da FCF/USP

No final dos anos 90, os grupos do Dr. Folkman e Dr. O’Reilly descreveram como endostatinas poderiam inibir a angiogênese em camundongos e, desta forma, serem usadas para o tratamento de câncer.  Ainda era aluno de graduação e, assim como a mídia da época, estava eufórico com a possibilidade de uma droga revolucionária para tratar esse mal. Foi quando vi uma entrevista do Dr. Folkman dizendo: “Se você tem câncer... e é um camundongo, nós podemos te ajudar”. Como ótimos cientistas, os próprios autores do artigo não se atreveram a dizer que as drogas funcionariam de imediato no tratamento do câncer em humanos. Desde então, vários ensaios clínicos foram realizados com as endostatinas porém este post não é sobre elas.

Um artigo publicado na revista PNAS mostrou, em 2013, que modelos murinos mimetizavam pobremente as respostas genômicas de humanos em doenças inflamatórias. Renomados cientistas de grandes universidades assinavam esse artigo e os resultados foram amplamente divulgados pela mídia e em dois excelentes posts (aqui e aqui) do nosso blog. Baseado na análise do transcritoma de camundongos e humanos frente à diferentes processos inflamatórios, os autores concluíram que havia pouca correlação entre os dois organismos, indicando que as respostas de camundongos não eram comparáveis às dos humanos. Apesar de não assinar este estudo, o professor de Stanford, Mark M Davis, como vi em vários eventos nos EUA e em seus textos (aqui e aqui), é um dos que mais defende a idéia de que a imunologia deve ser estudada (sempre que possível) em humanos.
Dois anos após a publicação do PNAS, saiu na mesma revista, outro artigo com o título praticamente idêntico porém com resultados opostos:

(2013) Genomic responses in mouse models poorly mimic human inflammatory diseases
(2015) Genomic responses in mouse models greatly mimic human inflammatory diseases

Os autores deste segundo artigo re-analisaram (usando métodos estatísticos mais convencionais e adequados) os mesmos dados usados no primeiro artigo de 2013 e mostraram que, na verdade, os padrões de expressão em camundongos recapitulavam os padrões de humanos em condições inflamatórias. Uma das diferenças principais entre os dois estudos foi como a análise de correlação foi feita entre humanos e camundongos. No artigo de 2013, eles calcularam a correlação entre a expressão de TODOS os genes humanos que alteravam em uma condição com a expressão dos mesmos genes em camundongos. No entanto, a comparação entre dois transcritomas não é convencionalmente feita assim. No artigo de 2015 eles focaram as correlações apenas nos genes que alteravam (mesmo que em direções opostas) suas expressões tanto em humanos quanto em camundongos. Esta realmente é a análise correta a ser feita já que, por ser uma tecnologia de larga-escala, genes não responsivos em uma espécie só iria introduzir ruído nas correlações. Outro ponto importante foi o uso da corelação de Spearman (que lida com rankings de expressão) ao invés da correlação de Pearson (que assume linearidade e distribuição normal das razões de expressão) originalmente usada. 




Com isso, ficou claro que o artigo de 2013 não provou de forma adequada que camundongos sejam “indicadores imprecisos das condições inflamatórias humanas”. O fato é que (salvo algumas exceções) humanos não são roedores! Porém, uma análise mal feita não confirma o que já era óbvio a todos os cientistas. Aprendemos muito e continuaremos a aprender com o uso de modelos animais.
 

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