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domingo, 20 de setembro de 2015

Journal Club IBA: Doces NETs, Amargas Feridas


Uma das complicações desencadeada pelo diabetes é a lenta cicatrização de feridas, atribuída à má circulação, devido ao estreitamento de vasos sanguíneos, à neuropatia que conduz à perda da sensação de dor e a uma resposta imune ineficaz, que seria incapaz de controlar as possíveis infecções no local. Em trabalho publicado recentemente, Wong e colaboradores demonstraram um novo fator que poderia retardar a cicatrização em indivíduos diabéticos: a excessiva liberação de NETs no local da lesão. Os pesquisadores demonstraram, inicialmente, que há um massivo recrutamento de neutrófilos nas feridas realizadas na região dorsal de camundongos WT a partir de 3 dias após a lesão, enquanto essas células não foram encontradas na pele não lesionada. Tendo em vista que esses neutrófilos foram capazes de liberar grandes quantidades de NETs no local da lesão, avaliou-se se essas redes de DNA poderiam afetar o processo de cicatrização de feridas. Para isso, foram realizadas lesões no dorso de camundongos WT e de animais deficientes para PAD4, uma peptidilarginase capaz de citrulinar histonas, induzindo a descondensação do DNA nuclear e liberação de NETs. Uma vez que a citrulinação e descondensação do DNA são eventos cruciais no processo de NETose, camundongos deficientes de PAD4 não apresentaram produção de NETs, nem expressão de H3Cit nas feridas, embora os neutrófilos tenham sido recrutados para a lesão. Como conseqüência disso, o processo de cicatrização e a re-epiletização das feridas nesses animais se deu de forma mais rápida que em camundongos WT.
Uma vez caracterizado que NETs são capazes de atrasar o processo de cicatrização em animais normoglicêmicos, especulou-se que possíveis alterações em neutrófilos de indivíduos diabéticos poderiam levar à exacerbação no processo de NETose, interferindo na cicatrização de feridas nesses indivíduos. Demonstrou-se que, de fato, neutrófilos de pacientes com diabetes (tipo 1 e 2) produzem mais NETs que de indivíduos sadios quando estimulados com a ionomicina (ionóforo de cálcio responsável pelo aumento do Ca2+ intracelular) e PMA (a qual estimula a produção de ROS), bem como um aumento substancial da expressão de PAD4. Interessantemente, neutrófilos de indivíduos sadios produziram mais NETs quando cultivados em meio rico em glicose, indicando que a suscetibilidade aumentada a NETose pode ser devido à hiperglicemia característica dos pacientes com diabetes. Esses resultados foram confirmados nos modelos animais de diabetes tipo 1 (induzido por estreptozotocina) e tipo 2 (camundongo db/db). Em seguida, camundongos PAD4-/-e WT foram submetidos à indução de diabetes tipo 1 e demonstrou-se que, assim como observado previamente em animais normoglicêmicos,  a cicatrização em camundongos diabéticos deficientes de PAD4 foi mais rápida que em camundongos diabéticos WT. Contudo não foram observadas diferenças na cicatrização de camundongos diabéticos deficientes de PAD4 quando comparado com camundongos WT não diabéticos, visto que, mesmo em condições de hiperglicemia, esses animais não foram capazes de liberar NETs. Esses resultados indicam que, em condições de hiperglicemia, neutrófilos sofrem mais NETose e este parece ser o principal mecanismo envolvido com o retardo da cicatrização em pacientes com diabetes. Especula-se que altas concentrações de glicose possam induzir desbalanços metabólicos que levam ao aumento da produção de espécies reativas de oxigênio (ROS), que têm papel chave na indução de NETs. Por fim, a fim de propor uma possível abordagem terapêutica para estes achados, os autores demonstraram que o tratamento com DNAse 1, que leva à degradação de NETs, acelera a cicatrização das feridas tanto em camundongos WT como em camundongos diabéticos. Portanto, o trabalho demonstra que NETs prejudicam o processo de cicatrização de feridas, sobretudo em pacientes com diabetes, que possuem neutrófilos mais propensos a sofrer NETose.



 Figura 1. Aumento da NETose em ambiente com elevadas concentrações de glicose causa o retardo da cicatrização. A elevada concentração da glicose no sangue de pacientes com diabetes está associada com o aumento da expressão de PAD4 em neutrófilos, o que induz o aumento da produção de NETs por essas células. As feridas de pacientes com diabetes possuem aumento no número de NETs, resultando no retardo do processo de cicatrização. 


Referência Bibliográfica

Wong, S.L. et al. Diabetes primes neutrophils to undergo NETosis, which impairs wound healing. Nat Med. 21(7), 815-819 (2015).

Post de Júlia Teixeira e Marcela Davoli (doutorandas FMRP-USP/IBA).

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