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segunda-feira, 15 de abril de 2013

LIÇÃO DE INTERDISCIPLINARIDADE: TRÁFEGO MITOCONDRIAL ATRAVÉS DOS MICROTÚBULOS É ESSENCIAL PARA A ATIVAÇÃO DO INFLAMASSOMA DE NLRP3



Fonte: Nature Reviews Immunology (2 April 2013). doi:10.1038/nri3444


Post de Larissa Dias da Cunha



     A importância do receptor Nod-like NLRP3 na ativação do inflamassoma é inegável e justifica o tamanho do interesse e da extensa literatura publicada tanto no esforço para caracterizá-lo como para desvendar o mistério que existe em torno do seu mecanismo de ativação. NLRP3 é capaz de responder a padrões moleculares distintos de diversas classes de patógenos microbianos assim como sinais de dano do hospedeiro, e o elemento em comum que gera a ativação do receptor ainda é desconhecido. Mais recentemente, a descoberta da importância da ativação do inflamassoma de NLRP3 na gênese de diversos distúrbios autoimunes como aterosclerose, gota, diabetes e obesidade só tem aumentado o interesse no receptor, cuja história parece ainda distante de chegar a um fim.

     Um trabalho recentemente publicado na revista Nature Immunology, desenvolvido pelo respeitado grupo de Shizuo Akira, sem dúvida colabora para o entendimento do mecanismo molecular da ativação do inflamassoma dependente de NLRP3 (aqui). Neste trabalho, os autores demonstram que agonistas de NLRP3, mas não de outros inflamassomas, alteram o tráfego das mitocôndrias de forma essencial para a ativação de NLRP3, destrinchando o mecanismo molecular desse fenômeno. Um possível papel para as mitocôndrias na ativação de NLRP3, envolvendo a geração de espécies reativas de oxigênio (ROS) (aqui) e o reconhecimento de DNA mitocondrial presente no citosol (aqui) já havia sido investigado anteriormente, embora ainda sendo alvo de debate na área. Ainda assim, já estava claro que o adaptador ASC pode se ligar a membrana mitocondrial externa enquanto o receptor NLRP3 localiza-se na membrana do retículo endoplasmático rugoso (ER) (aqui). A aproximação espacial entre as duas organelas em resposta a agonistas de NLRP3 é essencial para a interação física entre NLRP3 e o adaptador ASC, oferecendo assim o sítio para a montagem da plataforma molecular que de fato constitui o inflamassoma.

     A partir de uma varredura inicial com diversas drogas que bloqueiam processos celulares, os autores verificam que inibidores da polimerização de microtúbulos (como a colchicina e o nocodazol) inibem especificamente a secreção de IL-1β em resposta a nigericina, agonista do inflamassoma de NLRP3. A partir daí, Misawa et al. demonstram que agonistas de NLRP3 induzem o transporte das mitocôndrias nos microtúbulos dependente de dineína, um motor molecular essencial para o trafego de organelas em direção ao núcleo. Os autores verificam que os agonistas de NLRP3 induzem altos níveis de acetilação dos microtúbulos, permitindo sua interação com a dineína. Inibindo a acetilação dos microtúbulos, não há transporte das mitocôndrias para a região perinuclear, interação de ASC e NLRP3 ou secreção de IL-1β em resposta a agonistas de NLRP3. Nesse sentido, é verificado que a atividade da deacetilase SIRT2 é importante para regular a atividade do inflamassoma. Para fechar a história, os autores demonstram que o mecanismo por trás da indução de acetilação dos microtúbulos é a regulação negativa da atividade de SIRT2 na presença de agonistas de NLRP3. Os níveis intracelulares de NAD+, cofator essencial para a atividade de SIRT2, são reduzidos na presença desses agonistas. A cereja do bolo é a demonstração que o dano mitocondrial, gerado na presença de ativadores de NLRP3 e verificado por alteração na morfologia da organela e alteração no seu potencial de membrana, induz a redução nos níveis de NAD+. Assim, este trabalho demonstra que ativadores do inflamassoma de NLRP3 geram dano mitocondrial, depletando os níveis de NAD+ intracelular e aumentando os níveis de acetilação dos microtúbulos pela redução na atividade da deacetilase SIRT2; a acetilação dos microtúbulos, por sua vez, estimula o transporte das mitocôndrias para a região perinuclear, permitindo sua interação com NLRP3 para a ativação do inflamassoma. Importante, a maior parte dos resultados encontrados foi independente da geração de ROS, até então ponto de controvérsia na discussão sobre o papel mitocondrial na ativação do inflamassoma de NLRP3: os autores deixam claro que estas são duas histórias distintas.
     
     Este trabalho sem dúvida colabora para a compressão dos mecanismos de ativação do inflamassoma de NLRP3 e possui de fato importância no desenvolvimento de estratégias clínicas para combater doenças causadas pela ativação desregulada de NLRP3 (os autores sugerem o controle do dano mitocondrial como alvo terapêutico). Porém, há uma ótima mensagem subliminar, principalmente para nós, assíduos frequentadores da bancada: o segredo de desenvolver um trabalho excepcional não necessariamente está em técnicas avançadíssimas, mas em adquirir uma base teórica bem fundamentada, em trabalhar no desenvolvimento de uma boa capacidade de interdisciplinaridade e em investir em conhecer (bem) as ferramentas que já se têm em mãos!

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