Figura 1 -
Esquema de um monócito de paciente com sepse. Monócito adquire tanto funções pró-inflamatórias, no início da doença, passando por uma reprogramação
dependente de HIF-1a e IRAKM, adquirindo um fenótipo imunosupressor
A sepse é
uma resposta inflamatória sistêmica em reposta a infecções por bactérias,
fungos ou vírus. Durante a resposta imune na sepse há uma ativação exacerbada da
resposta imunológica levando a um aumento de liberação de citocinas pro-inflamátorias
(cytokine storm), choque e lesão tecidual
(aqui). Para
atenuar o dano tecidual gerado, estudos anteriores têm demonstrado um aumento
na produção de citocinas anti-inflamatórias como IL-10 e TGF-β, assim como uma
menor expressão de moléculas coestimuladoras (CD86) e de moléculas de MHC em
monócitos de pacientes sépticos (aqui). No
entanto, durante essa condição anti-inflamatória compensatória (do inglês, compensatory anti-inflammatory response
syndrome – CARS), indivíduos sépticos tornam-se mais suscetíveis a
infecções secundárias. Esses resultados mostram que os monócitos participam
tanto da fase pro-inflamatória, quanto da fase anti-inflamatória. No entanto,
ainda não está claro qual é a atividade funcional e quais os mecanismos que
regulam essas células durante o desenvolvimento da sepse. Para responder estas
questões, Shalova e colaboradores (aqui)
demonstraram de forma bastante elegante na edição de março de 2015 da revista Immunity que monócitos de pacientes com
sepse ativa (isolados poucas horas depois de confirmada a infecção por
bactérias gram negativa) apresentam um perfil transcripcional característico de
ativação e inflamação, quando comparado com os monócitos desses mesmos
pacientes 4-12 semanas depois, uma fase que foi chamada de “recovery phase”. Como esperado, monócitos de pacientes que se recuperaram da
sepse apresentaram um perfil transcripcional mais parecido com monócitos de
indivíduos saudáveis. Como essa intensa resposta inflamatória gerada na sepse
induz uma resposta anti-inflamatória compensatória, o passo seguinte foi
avaliar como os monócitos de pacientes com sepse se comportam durante um
segundo desafio (estímulo com LPS ex vivo).
De forma interessante, foi demonstrado que os monócitos de pacientes com sepse
se tornam completamente hiporresponsivos a um desafio com LPS, ativando menos a
sinalização de NFκB e consequentemente não produzindo
citocinas pró-inflamatórias. Os autores demonstraram que esses monócitos, na
verdade, adquirem um fenótipo conhecido como “tolerante a endotoxinas”,
caracterizado pela menor produção de citocinas pró-inflamatórias, diminuição da
apresentação de antígeno, aumento da fagocitose, capacidade de killing e aumento das funções de reparo
tecidual. Isso mesmo, esses monócitos não se tornam completamente
“paralisados”. Apesar da resposta de citocinas prejudicada, esses monócitos
conseguem fagocitar mais bactéria (ensaio in
vitro com E.coli expressando
GFP), têm maior capacidade microbicida (ensaio com sobrenadante da cultura de
monócitos em uma placa de Agar coberta de E.coli
e aumento na expressão do peptídeo anti-microbiano Hamp) e aumentam suas
funções de reparo tecidual através do aumento da produção de metaloproteases e
VEGF (elegantes ensaios de zimografia, wound
healing e angiogênese). Porém, os autores não param por aí. Eles demonstram
que essa reprogramação dos monócitos, adquirindo um perfil “imuno-supressor” ou
de reparo, ocorre devido à ativação de HIF-1α e, consequentemente de IRAKM (um
regulador negativo da sinalização dos TLRs). De forma geral, os autores
demonstram que monócitos de indivíduos saudáveis respondem normalmente,
ativando NFκB e produzindo citocinas pró-inflamatórias quando estimulados. No
entanto, em um quadro de sepse, os monócitos desses indivíduos são ativados a
ponto de gerarem o cytokine storm, sofrendo
posteriormente uma reprogramação (mediada por HIF-1α e IRAKM), tornando-se
células incapazes de produzirem citocinas pró-inflamatórias, mantendo apenas
funções de fagocitose, killing e
reparo tecidual. Apesar da fagocitose e killing
aumentados, é evidente que estas características não são suficientes para
controlar infecções oportunistas, como demonstrado pela suscetibilidade
aumentada desses pacientes a infecções secundárias. Portanto, este estudo é de
suma importância na busca de uma “assinatura gênica global” da resposta imune
inata, gerando assim novos caminhos para o tratamento da sepse em humanos.
Post de Annie Piñeros e Frederico Ribeiro, alunos de
doutorado IBA/FMRP/USP
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