quarta-feira, 13 de junho de 2012

Você é capaz de fazer um leigo entender os objetivos da sua pesquisa?


Bom dia!

Em um artigo no newyorkblog intitulado "Can Wine and Chocolate Help You Live Forever?" Jennifer Cable relata com entusiasmo sua experiência em uma palestra do Dr. Joseph Baur da Universidade da Pensilvãnia na Academia de Ciências de New York. Nesta palestra, de acordo com a autora, o Dr. Baur ajuda os ouvintes a tirarem conclusões equilibradas a respeito dos efeitos benéficos do revasterol em diversos aspectos da nossa saúde. Mais do que os achados científicos do Dr. Baur, o que mais chamou a atenção da autora foi a maneira como tudo foi exposto: uma mistura bem balanceada de entusiasmo e cuidado, ou seja, numa linguagem capaz de cativar pessoas que não trabalham com pesquisa, mas sem catequização.

Após alguns instantes de reflexão, decidi comentar sobre esse artigo porque na maior parte do tempo nós só nos preocupamos em dialogar com outros membros da comunidade científica e nunca com o resto da sociedade. Em tempos de financiamentos cada vez mais curtos e pressão crescente sobre o correto uso do dinheiro público em pesquisas científicas é preciso que nós tenhamos a preocupação de melhorar a comunicação científica com a sociedade que nos financia. Quantos de nós já nos vimos em situações um tanto constrangedoras quando alguém que não trabalha com pesquisa científica faz a clássica pergunta: "Ok, mas pra que isso serve? Tanta gente passando fome e o governo gastando dinheiro com isso.."?

Na minha (modestíssima) opinião, só temos a ganhar ao termos o cuidado de nos reportar à sociedade numa linguagem mais palatável e capaz de ganhar o seu apoio. Como sugestão inicial neste sentido, acredito que no processo de submissão de projetos para agências de fomento deveria ser exigido um resumo destinado a uma audiência leiga a fim de justificar a concessão do financiamento.

Abraços
Leo

15 comentários:

  1. Eu acho que isso (o resumo para a audiência leiga) é uma ideia interessante e mais um desafio na pesquisa. Por alguns momentos, até imaginei uma exposição argumentativa de razões do projeto e a ciência mais valorizada ainda!

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    1. Luísa, eu acho que os grandes palestrantes tem essa habilidade: são capazes de colocar o assunto de maneira clara mesmo para uma audiência leiga.

      Abc

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  2. Leo, bom artigo....Acho este debate muito apropriado. Sempre peco aos meus estudantes pra me contar suas estorias, seus projetos, como se estivessem contando para um membro da familia. Esse tipo de exercicio ajuda muito a melhorar as apresentacoes cientificas e facilita a divulgacao das ideias pros leigos

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    1. Professor, eu acho que esse pode ser o início do caminho para sermos financiados por sociedades de pacientes ou de familiares de pacientes portadores de determinadas doenças. Por várias vezes, vi familiares de portadores da Doença de Crohn visitando o laboratório onde fiz pós-doc para saber dos últimos avanços na pesquisa financiada pela CAG (Canadian Association for Gastroenterology), largamente custeada por eles.

      Abc

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  3. Concordo inteiramente com a importância de adequada comunicação com a sociedade. Os novos relatórios para o CNPq já incluem um campo para o coordenador indicar, em termos para público leigo, a importância dos resultados do projeto.
    Não podemos esquecer, contudo, que este texto costuma ser muito mais fácil para os pesquisadores em áreas aplicadas que nas áreas básicas.

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    1. Realmente é muito mais complicado para nós das áreas básicas, Professor. Mas cabe a nós mostrar que somos nós que fornecemos os subsídios necessários para a pesquisa aplicada. É cada vez mais comum que empresas de biotecnologia "scaneiem" publicações científicas e a partir daí iniciem suas pesquisas aplicadas, muitas vezes investindo dezenas de milhões de dólares. É isso que precisamos deixar claro para a sociedade...

      Abc

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  4. Excelente post Léo. Durante o meu doutorado tive um curso só de comunicação para o público leigo e tive que dar uma palestra para pessoas que doavam dinheiro pra nossa pesquisa. Além do mais na minha tese de doutorado e no application pro Human Frontiers Fellowship também tive que escrever um resumo para o público leigo.
    Acho que seria um bom avanço para a ciência brasileira implementar algo semelhante, não só para o público leigo mas também para nós cientistas nos situarmos diante do objetivo maior.
    Abraço
    Diego

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    1. Grande Diegão!!!

      Quando eu submeti pedido de financiamento para o CIHR também precisei escrever um resumo para leigos. Admito que tive enorme dificuldade! É impressionante como muitas vezes nos atemos ao detalhe e esquecemos do verdadeiro objetivo dos nossos trabalhos.

      Abc

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  5. Olá!
    adoro este blog c/tantos assuntos interessantes, bem colocados. De novo parabéns a todos q contribuem p/isso!

    Também concordo que a divulgação científica é extremamente importante. É importante por si só, pois a população precisa ser informada. Não acho porém q deva ser exigido um resumo destinado a uma audiência leiga na justificação de um projeto submetido a agências públicas como o CNPq, por ex. No caso de financiamento por sociedades de familiares de pacientes portadores de determinadas doenças, aí sim isto obviamente se torna necessário.
    Se o governo de um pais, atendendo `as necessidades de sua população e amparado por comissões de cientistas, conclui que é necessário reforçar a pesquisa em determinada área, devem ser feitas chamadas específicas, como aliás já tem sido feito pelo CNPq. Mas como bem lembrou o Barral, não podemos esquecer a pesquisa básica. Nesta é imprescindível a liberdade de escolha pelo cientista do que vai pesquisar. O saber pelo saber, sem a necessidade de exercícios de artes divinatórias para dizer qual será sua utilidade. O saber é util por si só! Ou alguém poderia prever que estudar umas bactérias estranhas de uma fonte termal resultaria na revolução causada pela PCR, por exemplo?
    Eu acho que um ponto fundamental é a melhoria do ensino de ciências na escola, para que a população entenda a importância do investimento em ciência básica, o resto pode ser uma grande hipocrisia.

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  6. Maria,

    Concordo que o "o saber é util por si só". Porém, nós alimentamos a nossa fome de saber com dinheiro público. Ponto. O resumo para leigos não é condição para o aceite ou não do projeto e sim, uma possível ferramenta adicional para o CNPq justificar seus pedidos de aumento de orçamento junto ao governo federal, por exemplo.

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  7. ...aqui nos EUA, nas grants pro NIH (que seriam equivalentes as grants do CNPq) temos que incluir uma narrativa para leigos...

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  8. Leo,

    no fundo no fundo, acho q vc mesmo não está totalmente convencido da utilidade da pesquisa básica. Um país precisa investir em ciência básica, não para alimentar nossa fome de saber mas pq a pesquisa fundamental, pura, básica (chame como quiser) fomenta a pesquisa aplicada, que por sua vez gera patentes, produtos, riqueza e bem-estar. A sociedade deve entender isso e apoiar os investimentos na ciência básica, mesmo que nem o próprio pesquisador possa vislumbrar, no momento em que pede o fomento, as possíveis futuras aplicações do conhecimento que gera. Mas há muitas pessoas, inclusive cientistas, que acham q um país em desenvolvimento pode desenvolver pesquisa aplicada sem ter uma boa pesquisa básica. Eu discordo, mas esta é uma discussão longa. Fica a sugestão para um futuro post. Outro aspecto é o seguinte: como cidadã pagadora de impostos acredito que eu e outros iguais a mim têm o direito de poder desenvolver seu trabalho no seu país e não ser obrigado a imigrar. Quanto ao aumento de verbas para a pesquisa, acho que devemos ser mais atuantes, ter mais representantes que defendam a importância do aumento de verbas para o CNPq, mas não acredito que isto precise ser feito forçando-se a barra de achar uma possível aplicação para aquilo que ainda não a possui.

    Querido Sergio,
    nem tudo o que é bom p/os EUA é bom para o BR...Isto se esta medida for realmente boa para o NIH e para os EUA. Para o pesquisador em ciência básica, aposto que não é, a não ser pelo exercício forçado (mas talvez no final válido para ele mesmo) de ter que achar uma possível aplicação p/o que faz e, então, sentir-se em paz com sua consciência.

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    1. Querida Maria

      Essa narrativa ocupa no maximo dois paragrafos. Nao sei te dizer com certeza porque esta la, nem quem le...So sei te dizer que isso nao importa na avaliacao do projeto. Talvez esteja la para justificar para o leigo interessado no uso do seu imposto, o que esta sendo feito com ele. Todo mundo tem que fazer, seja grant na area de aplicada ou basica. Concordo tambem que nem tudo que e' bom aqui e' bom ai...So quis informar.

      Eu sou visceralmente contra que um investigador seja forcado a encontrar uma aplicacao direta pro que faz. Mas isso nao me impede de perguntar a mim mesmo (e aos meus colegas) se consigo articular uma conexao do que faco com uma doenca, com um processo biologico...Acho esse exercicio saudavel... O julgamento do que faco, para funding, ate que se encontre um metodo melhor, vai ser feito por um grupo de cientistas.

      Acho que o ponto que o Leo levantou a respeito da clareza e' importantissimo. Buscamos respostas e muito do que descobrimos nao tem nada a ver com o ponto de partida....Mas isso nao significa que nao possamos articular para as pessoas o que fazemos. Talvez ate devessemos articular para os leigos que nao sabemos tanto assim.... Explicar porque e' preciso pesquisar;; explicar melhor a natureza do problema, as nossas dificuldades; e explicar tambem o nosso prazer em descobri.... Explicar cotidianamente pros nossos amigos, pras pessoas que encontramos que estamos procurando porque queremos encontrar, queremos muito. E que existe uma chance em um milhao de que encontremos. Uma chance muito pequena, pequenissima, mas que sem o financiamento publico pra procura, jamais vai existir descoberta.

      Quando a gente se esconde atras de mistificacoes, do palavreado, quando a gente nao consegue se articular, a gente da espaco pro atraso. Acho que e' muito importante que nos cientistas facamos um esforco grande pra informar o publico sobre o que fazemos e com o que sonhamos.

      Sobre esse ultimo ponto acho que existe total acordo em todos os comentarios aqui

      Beijo

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  9. Maria,

    Antes de dizer que eu não estou certo da utilidade da pesquisa básica, por favor leia o post e as respostas aos comentários com atenção. Principalmente a resposta dada ao Professor Barral.

    Ninguém aqui falou em "ter que achar uma possível aplicação p/o que faz". Simplesmente, ao nos reportarmos à sociedade numa linguagem palatavel estamos contribuindo para que a mesma entenda a importância do que fazemos, ainda que nem todos estejam convencidos da importância da pesquisa básica

    E sobre ter que imigrar...eu realmente não entendi o link. Desculpe.

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  10. Maria,

    Antes de dizer que eu não estou certo da utilidade da pesquisa básica, por favor leia o post e as respostas aos comentários com atenção. Principalmente a resposta dada ao Professor Barral.

    Ninguém aqui falou em "ter que achar uma possível aplicação p/o que faz". Simplesmente, ao nos reportarmos à sociedade numa linguagem palatavel estamos contribuindo para que a mesma entenda a importância do que fazemos, ainda que nem todos estejam convencidos da importância da pesquisa básica

    E sobre ter que imigrar...eu realmente não entendi o link. Desculpe.

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