terça-feira, 30 de abril de 2013

Novas perspectivas em imunologia ecológica



Olá todos
 Uma pequena (ou grande) parcela das discussões científicas acontecem em ambientes longe dos laboratórios, incluindo alguns eventos sociais.  Em um desses eventos tive a oportunidade de ouvir as opiniões de uma dupla sobre como pode ser frutífero o casamento das ideias de ecólogos e imunologistas. Embora esta matéria já tenha passado por este blog, achei interessante convidar esta dupla para expor como este tema é visto dentro da ecologia, mas sem perder a visão dos imunologistas.  Espero que este texto ajude a fortalecer o time da ecoimunologia brasileira e favoreça o aparecimento de parcerias. Segue uma breve descrição dos autores e o texto.
Rafael é biólogo, mineiro, doutor em Ecologia pela UNICAMP e atualmente professor do departamento de ecologia da UFG. Patrícia, também bióloga, mineira, doutora em Genética e Biologia Molecular com ênfase em Imunologia pela UNICAMP e atualmente professora no setor de imunologia da UFG.


Novas perspectivas em imunologia ecológica
 
por Patrícia R. A. Nagib & Rafael D. Loyola

Os mecanismos por meio dos quais a variação genética é traduzida em variação fenotípica podem ser bastante complexos, de maneira que generalizações à respeito de seu funcionamento são difíceis de se obter. Essa falta de generalizações dificulta a associação entre alterações genéticas e variação imunológica em um contexto eco-evolutivo, de maneira que cada interação parasita-hospedeiro é, geralmente, considerada um estudo de caso [1].

A ecologia se caracteriza pela busca de padrões na distribuição e interação dos organismos entre si e com o ambiente e os mecanismos que os explicam. No início da década de 90, essa ciência uniu-se formalmente à imunologia, delimitando um novo campo de estudo chamado “imunologia ecológica” ou “ecoimunologia”, que já foi assunto no blog da SBI [2].

O foco da imunologia ecológica tem sido o de descrever e explicar a variação natural em funções imunológicas [3], mais especificamente, por que e como fatores bióticos e abióticos contribuem para a variação na imunidade em ambientes naturais. Tal abordagem difere-se grandemente da maioria das pesquisas em imunologia que controlam tal variação experimentalmente em busca dos detalhes, em nível celular e molecular, dos mecanismos de resistência (ou tolerância) à parasitas.

A imunologia ecológica sugere que a resposta imune é apenas um elemento de uma resposta integrada do organismo que é totalmente dependente contexto ecológico no qual ele está inserido [4]. A resposta imune é capaz de impedir a disseminação de células cancerígenas ou barrar infecções, mas a qualidade e quantidade de recurso ingerido pelo organismos, o clima, a competição com organismos da mesma espécie e a predação podem ser também muito importantes. Se as necessidades ecológicas forem muito altas (por exemplo, se o organismo tem que gastar muita energia para escapar de seus predadores, seja criando barreiras químicas ou com mudanças comportamentais, a resposta imune pode ser diminuída ou até mesmo seriamente comprometida). Em libélulas, por exemplo, manchas nas asas causadas por depósitos de melanina são vistas como pistas ecológicas da saúde dos indivíduos. A melanina tem um papel importante na resposta de invertebrados ao parasitismo, assim, indivíduos que podem disponibilizar melanina para pigmentação das asas, são aqueles que não “gastaram” esse composto em defesa, estando, supostamente, sadios.

Neste sentido, a imunologia ecológica vem ganhando destaque na literatura demonstrando a importância do sistema imune na manutenção da diversidade animal e vegetal e ampliando os conhecimentos sobre a relação entre sistema imune e espécies ameaçadas de extinção. Na imunologia humana o impacto também não é menor, estudos que avaliam o impacto de estresses ambientais, sejam eles físicos, químicos ou psico-sociais demonstram a estreita relação entre ambiente e imunidade. Este conceito porém, não é totalmente novo pois a relação neuro-imune-endócrina já é conhecida e estudada por muitos. Contudo, a temática ecológica amplia o conceito e traz uma nova perspectiva sob o ponto de vista evolutivo e permite a interação com diferentes áreas. Um exemplo disto é a conciliação da imunologia ecológica com a ecologia de doenças (disease ecology) [5]. Desta conciliação estão surgindo inúmeros trabalhos que visam traduzir a variação em processos “dentro” do hospedeiro (isto é, a resposta imune) em uma dinâmica entre hospedeiros (isto é, transmissão de parasitas). Tais estudos podem ser usados para prever, por meio da modelagem de nicho ecológico, qual o risco de transmissão de uma determinada enfermidade, qual a distribuição geográfica de vetores de importância médica, como as mudanças climáticas globais podem alterar a distribuição de vetores, patógenos e do risco de transmissão de enfermidades e como tais modelos podem contribuir para a definição de políticas de saúde pública em âmbito nacional e regional.


Desde sua criação a imunologia ecológica diversificou-se bastante. Atualmente, existem temas “quentes” que carecem de estudos especialmente no Brasil. Alguns desses temas são: (1) as várias maneiras por meio das quais hospedeiros (animais ou plantas) lidam com o parasitismo em ambientes naturais (resistência ou susceptibilidade, por exemplo); (2) diversidade de MHC e doenças auto-imunes; (3) quais as consequências ecológicas da herdabilidade imunológica entre gerações e (4) qual o papel da resistência ao parasitismo para a evolução da virulência de patógenos. A associação de imunologistas e ecólogos para a elucidação de questões como essas seria muito bem-vinda no Brasil e há espaço para isso.

Referências
1.        Martin LB, Hawley DM, Ardia DR (2011) An introduction to ecological immunology. Funct Ecol 25: 1–4. doi:10.1111/j.1365-2435.2010.01820.x.
2.        http://blogdasbi.blogspot.com.br/2012/09/imunologia-ecologica.html.
3.        Sheldon BC, Verhulst S (1996) Ecological immunology: costly parasite defences and trade-offs in evolutionary ecology. Trends Ecol Evol 11: 317–321. doi:10.1016/0169-5347(96)10039-2.
4.        Graham AL, Shuker DM, Pollitt LC, Auld SKJR, Wilson AJ, et al. (2011) Fitness consequences of immune responses: strengthening the empirical framework for ecoimmunology. Funct Ecol 25: 5–17. doi:10.1111/j.1365-2435.2010.01777.x.
5.        Hawley DM, Altizer SM (2011) Disease ecology meets ecological immunology: understanding the links between organismal immunity and infection dynamics in natural populations. Funct Ecol 25: 48–60. doi:10.1111/j.1365-2435.2010.01753.x.

3 comentários:

  1. Ops..quem sabe inserimos este tema em um simpósio no próximo encontro brasileiro de imunologia, promovido pela SBI. Imagina, eu já ouvi de gente grande aqui no Brasil, que imunologia é coisa só para biomédicos, médicos e farmacêuticos...

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  2. É Phileno, parece que a imunologia está seduzindo outras áreas... Eu acredito que logo teremos grupos fazendo a ecoimunologia no Brasil. O Rafael e a Patrícia parecem já estar começando trabalhos nesta linha e achei que eles podem ser um apoio para outros pesquisadores da imunologia que quiserem desbravar estas ideias.

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  3. É Phileno, parece que a imunologia está seduzindo outras áreas... Eu acredito que logo teremos grupos fazendo a ecoimunologia no Brasil. O Rafael e a Patrícia parecem já estar começando trabalhos nesta linha e achei que eles podem ser um apoio para outros pesquisadores da imunologia que quiserem desbravar estas ideias.

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