Uma das
poucas coisas bacanas de a gente ficar assim com mais idade é ver a evolução
das tendências de pensamento. No caso da memória imune, já vivenciei diversas
fases. Primeiro, não se tinha idéia nenhuma de como a memória T era mantida, e
a grande discussão era a necessidade da presença do antígeno. Parecia impossível manter células T
especificas vivas sem que o antígeno estivesse presente para uma periódica
expansão (e sobrevivência destas) destas.
Nada conclusivo. Depois se via que aparentemente as células T CD8+ eram
diferentes das T CD4+, talvez não precisassem de antígeno. Mais recentemente a proliferação
homeostática explicava tudo, então as citocinas como a IL-7 davam um jeito de
manter proliferando esse compartimento de memória. As células T de memória
pareciam ter características de stem cell, e manter sua própria população. Mas
dai foi visto, por exemplo pelo lab do Sprent, na Scripps, em 2011, que as
células T CD8+ podiam se expandir por reatividade cruzada.
Nesta
ultima Immunity, o grupo do Mark Davis, da Stanford, sugere que a reatividade
cruzada é também o mecanismo pelo qual as T CD4+ de memória também se mantém.
Sabemos que a medida que os seres humanos envelhecem o compartimento T tem
menos células naive e mais células de memória. Sempre vimos isso como um
reflexo da involução do timo e da imunosenescencia. Mas este estudo viu, usando a técnica de enriquecimento de
populações de células T especificas por tetrâmeros – tendência da qual o Marc Jenkins, que esteve no congresso de Campos, é o maior advogado – que em humanos que
não foram expostos a certos vírus, como o HIV, existem células T especificas
para peptídeos de HIV, ou CMV, com fenótipo de memória. Já em neonatos, as células com as mesmas
especificidades, tinham fenótipo naive.
Mais: em indivíduos
vacinados para a gripe sazonal, eles identificaram células T CD4+ com especificidade para bactérias
e parasitas, com reatividade cruzada com o vírus, que se expandiam e contraiam
igualzinho as especificas para a gripe, ao longo da resposta a vacina.
Sensacional
então. Será que a reatividade cruzada seria o principal mecanismo de expandir e
criar memória, mesmo com afinidade não tão grande, para microorganismos aos
quais ainda não fomos expostos, já protegendo previamente? E como isso afetaria
a autoimunidade? E as alergias?
O Mark
Davis também é o maior advogado da tendência de se trabalhar em imunologia de
humanos, algo que com certeza vem com toda a forca agora em células T com os
tetrâmeros. Sem duvida ele apresenta aqui nesse artigo uma grande evidencia de
que promiscuidade das células T pode ser um mecanismo protetor importante do
sistema imune. A promiscuidade pode ser uma coisa boa então. Será que essa
tendência pega? Perigo!
Su, L.F., Kidd, B.A., Han, A., Kotzin, J.J., andDavis, M.M.
(2013). Immunity 38, this issue,373–383.
O assunto é bem interessante mesmo. Isso traria implicações importantes para projetar e avaliar vacinas.
ResponderExcluirSem duvida Rodrigo. Provavelmente no futuro avaliaremos eficacia de vacinas usando tetrameros - quando desenvolvermos uma tecnologia mais simples para avaliar varias especificidades ao mesmo tempo!
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