domingo, 12 de janeiro de 2014

Tratar o câncer com uma infecção…. Isso pode ser possível?


      
         Desde a existência de microorganismos observou-se a relação destes com o desenvolvimento de doenças. Nesse sentido, falar que a infecção por um parasito talvez venha a ter efeitos benéficos no tratamento de doenças como o câncer soa bastante estranho.  Ainda mais se esse parasito for o Toxoplasma gondi. Num primeiro momento, isso parece improvável, pois até então a única relação observada entre o câncer e T. gondii seria o desenvolvimento de toxoplasmose cerebral, retinocoroidite induzida por imunossupressão. No entanto, se a ideia for vista do ponto de vista da resposta imune, não é todo, estranha.
            O parasito intracelular T.gondii infecta células dendríticas e induz uma resposta polarizada para o padrão Th1, com produção acentuada das citocinas IFN-gamma e IL-12. Já o câncer  um microambiente  imunossuprimido diminui possíveis respostas efetoras. Nesse sentido, é recorrente na clinica, no tratamento de tumores, o uso de IFN-gamma, devido a sua capacidade de  desencadear mecanismos citostáticos, citotóxicos e antitumorais. Por sua vez, IL-12 também pode ser utilizada na imunoterapia contra tumores por induzir resposta de padrão Th1, diferenciação de células T, reprogramação de células disfuncionais associadas ao tumor, ativação de células NK e macrófagos M1, e o mais importante, recrutar células CD8+ capazes de combater a neoplasia. Nesse contexto, será que a infecção de uma célula tumoral com o T. gondii seria capaz de gerar benefícios secundários associados à produção de IFN-gamma e IL-12? Se sim, como poderia ser feita uma infecção de forma que ela fosse seletiva para ativação do sistema imune sem causar os prejuízos típicos associados à replicação do parasito? Uma cepa avirulenta não replicativa de T. gondii com características auxotróficas (cuja via metabólica funcional depende da presença de determinada substância) parece ser uma boa solução. 
            No ano 2002 foi descrita uma cepa de T. gondii a qual possuía o gene da carbamoílo fosfato sintetase II (cps) mutado, o que lhe dá características auxotrofica por depender do uracilo para replicação (1). Como o uracilo não está presente em concentração livre significativa em células de mamíferos, a cepa T. gondii (cps) invade células hospedeiras normalmente e é capaz de gerar uma resposta imune, mas não de se replicar na célula hospedeira.
            Assim, a imunoterapia com a cepa de T. gondii (cps) já foi testada no tratamento do melanoma (2) e no tumor de ovário (3) no modelo murino, com efeitos favoráveis. A imunoterapia cps foi dependente de células T CD8+ e células NK, sendo que o sucesso do tratamento é independente da presença de células T CD4+. Células dendríticas CD11c+ presentes no ambiente tumoral foram invadidas pelo T. gondii (cps) e assim, convertidas em fenótipos imuno-estimuladores. Após do tratamento estas células expressaram níveis elevados das moléculas de co-estimulação CD80 e CD86 e consequentemente, capacidade de desencadear uma potente resposta antitumoral das células T CD8+. Nenhuma toxicidade foi vista e, portanto, o valor potencial desta terapia para despertar a imunidade natural no microambiente altamente imunossupressor dos tumores sólidos parece ser existente e bastante viável.
            Nesse contexto, é interessante notar como organismos potencialmente perigosos para nossa saúde podem, sob diferentes abordagens, ser úteis se conseguirmos levá-los a trabalhar em nosso beneficio, oferecendo alternativas para a solução de problemas, como neste caso, onde se conseguiu estabelecer uma relação entre parasitologia, imunologia e oncologia.

Referencias 

Post de Javier Ricardo Rubio Peña (mestrando) IBA-FMRP

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