quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

O lado Jekyll e Hyde dos radicais livres


Silvia Ponzoni, Departamento de Ciências Fisiológicas, UEL.
Phileno Pinge Filho, Laboratório de Imunopatologia Experimental, UEL










Ação de radicais livres             Ação de antioxidantes





Uma das teorias do envelhecimento estabelece que a sua origem esteja precisamente na ação dos radicais livres. Esta teoria foi proposta por Harman em 1957 (Harman,D. Aging: a theory based on the free radical and radiation chemistry. J.Geront.(1957) 2:298-300) e atualmente está demonstrada por meio de um grande número de publicações científicas.
O artigo “The myth about antioxidants” de Melinda Wenner Moyer publicado  na Scientific American deste mês coloca em dúvida esta teoria. De fácil leitura a autora sugere que a confirmação dos resultados obtidos de pesquisas recentes com vermes e camundongos indicará um novo olhar para a utilização de antioxidantes na forma de vitaminas ou de outros suplementos, pois eles podem causar mais mal do que bem à saúde das pessoas.
          Quando lemos o artigo, imediatamente somos bombardeados por imagens e pensamentos da ficção “O medico e o monstro” de Stevenson. Neste caso as protagonistas com duplas personalidades são as moléculas de radicais livres.
Durante décadas estas moléculas foram descritas como os responsáveis diretos do processo de envelhecimento, desordens neurodegenerativas e diversas patologias.  Níveis estratosféricos nas concentrações de radicais livres são obtidos em C. elegans modificados geneticamente para não produzirem enzimas antioxidativas. Com concentrações tão elevadas destas moléculas reativas aliada à incapacidade de neutralizá-las e o número de reações oxidativas presentes neste organismo modificado, o resultado esperado é a morte prematura deste verme. Mas não foi este o resultado encontrado, os vermes modificados geneticamente não tiveram morte prematura e apresentaram a mesma expectativa de vida daqueles não modificados. O aspecto interessante é que os animais modificados geneticamente apresentavam acúmulo de radicais livres bem como  danos oxidativos severos, mas não morreram prematuramente.
O rato-toupeira pelado, um roedor com a maior expectativa de vida dentre os roedores (capaz de sobreviver de 25 a 30 anos) apresenta as menores concentrações de antioxidantes naturais em relação ao camundongo, acumulando maior número de lesões oxidativas em seus tecidos do que outros roedores e mesmo assim vive aproximadamente oito vezes mais que outros roedores. Estes experimentos com o rato-toupeira pelado foram realizados por Rochelle Buffestein, fisiologista, que durante os últimos 11 anos tenta entender a longevidade desta espécie.
Sabe-se que em certas quantidades e situações os radicais livres  podem não apenas serem perigosos, mas úteis e saudáveis, capazes de dispararem mecanismos de defesa que mantém nosso organismo em forma. Por exemplo, alguns radicais livres ativam o gene HIF-1 que é responsável pela ativação de outros genes que participam dos mecanismos de reparo celular incluindo aquele que auxilia no reparo de mutações de DNA.
Em adição, o artigo ainda discute a utilização de vitaminas E e A  como antioxidantes, a sua  eficácia e benefícios para o usuário. O uso destes suplementos multivitamínicos não parece reduzir o risco de morte e ao contrário, há fortes indícios experimentais para o aumento dos riscos para o desenvolvimento de doenças como câncer de pulmão e morte prematura de seus usuários.

Boa leitura!

Referência Bibliográfica
Moyer, M.W. The Myth of Antioxidants. Scientific American 308, 62 - 67 (2013) doi:10.1038/scientificamerican 0213-62








2 comentários:

  1. Prof. Rubens Cecchini- Chefe do Laboratórios de fisiopatologia e radicais livres da Universidade Estadual de Londrina
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    Para os pesquisadores e os laboratórios cuja linha central de pesquisa é Estresse oxidativo, este artigo não traz nenhuma novidade. Há muito tempo o estresse oxidativo não é mais tratado de forma cartesiana. Sabemos que o estresse oxidativo pode ser bom ou mal dependendo das condições, do modelo experimental, da doença, do estadio da doença etc... . Há mais de duas décadas sabe-se que a vitamina E pode dar origem a compostos clastrogênicos. Os laboratórios do mundo todo que trabalham profundamente no estudo do estresse oxidativo, estão muito mais interessados em sinalização do que na lesão causado por RL. O autor ainda faz um confusão básica entre longevidade e lesão oxidativo. Há muito tempo esta idéia não faz parte dos grupos que trabalham com RL. Nosso laboratório tem demonstrado em inumeros artigos publicados neste última década esta multiplicidade de efeitos das espécies reativas de oxigênio e sua participação no processo de sinalização. Estamos indo mais além, considerando ainda não o estresse oxidativo como evento único mas a ação de cada metabolito formado neste processo e suas interrelações com o processo de expressão genica através de análise proteômica das proteínas de estresse. Portanto para nós a única novidade deste artigo está na surpresa de ter sido publicado em um periódico de alto impacto.

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    1. Olá prof. Rubens, agradecemos seus comentários sobre o post. O mito dos radicais livres de Moyer faz uma reflexão sobre os radicais livres e seu envolvimento no evelhecimento, ratificando o papel bom e mal dos radicias livres. A autora ainda chama atenção para a utilização de antioxidantes pela população americana e mostra que estudos epidemiológicos bem controlados não sustentam a hipótese inicial de Harmam defendida por muitos nos últimos sessenta anos. Intitulamos o post como "O lado Jekyll e Hyde dos radicais livres" justamente para chamar atenção dos leitores do papel duplo exercido por esta moléculas reativas e que o mecanismo do envelhecimento é muito mais intrincado e complexo do que o imaginado inicialmente por Harman.

      Pinge-Filho

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