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quinta-feira, 7 de julho de 2011

Amostra em pesquisas clínicas inovadoras: tamanho não é documento



Numa semana em que o tamanho dos documentos já veio à tona novamente (veja aqui um besteirol sobre o assunto), decidi escrever algo sobre tamanho, mas de estudos. Quem trabalha com imunologia humana, ou outras áreas de investigação clínica ou pesquisa translacional (que anda na moda pelas bandas de cá), se depara muito freqüentemente com um problema que nem sempre possui resolução possível. E isso é o tamanho da amostra. Basicamente, se diz respeito à quantidade de indivíduos incluídos na pesquisa. E isso pode ser mesmo um enorme problema quando nos referimos à pesquisas inovadoras, que utilizam ferramentas high-trhoughput e/ou exploram determinados cenários ainda pouco compreendidos. Essas pesquisas são muito caras. Os autores de trabalhos nessas áreas são freqüentemente metralhados com a expectativa dos revisores das revistas de que qualquer estudo realizado em humanos deve apresentar alto poder estatístico. Esse requerimento não parece ser justificável sempre e é contrariado pela realidade de que o aumento do tamanho da amostra produz resultados com pouco custo-benefício. Nesse contexto, há quem suporte a idéia, que não é nada louca, de que investigações de novas idéias muitas vezes devem começar com uma amostra pequena (às vezes até com o n igual a 1!) por causa de preocupações com custo e viabilidade. Além disso, recentes trabalhos estatísticos sugerem que amostras pequenas para esses tipos de estudos podem inclusive gerar uma maior projeção do valor científico dos achados por dólar gasto. Essas são as idéias do Petter Bacchetti, que recentemente escreveu um recente ensaio na revista Science Translational Medicine sobre o assunto (veja aqui). Só para constar, essa mesma revista publicou messes atrás um estudo mostrando que células TCD4+IL-22+ estão associadas à proteção contra colite ulcerativa obtida através da infecção terapêutica de um (n=1) paciente com o parasito Trichurus trichiura (veja o paper aqui). Segundo Peter, a renúncia deste falso dogma do tamanho amostral e o poder estatístico poderia resultar na remoção de um sério obstáculo para a inovação translacional.

O gráfico acima ilustra como o tamanho da amostra influencia o valor científico ou valor prático de um estudo inovador, sob três cenários distintos. Quando a idéia traz um avanço fundamental (linha azul), este pode ser geralmente evidente a partir de um estudo relativamente pequeno. Aqui, portanto, um tamanho de amostra muito maior não produz muito valor adicional. Ou seja, quando um treco funciona, existe, e é realmente importante, não vale a pena desperdiçar muito dinheiro e tempo tentando recrutar uma infinidade de pacientes para aumentar o valor científico e prático. Da mesma forma, quando a idéia é totalmente fora de alvo, descabelada, doida varrida (linha roxa), isso também seria evidente a partir de um estudo relativamente pequeno e o aumento amostral traria mais custo para gerar a mesma conclusão. E somente nos casos intermediários, na zona da penumbra, em que há potencial para o paradisíaco sucesso ou o inferno desolador, o maior tamanho da amostra poderia agregar algum valor final. Mas ainda assim o aumento demasiado do numero de indivíduos recrutados para esse último tipo de estudo ainda tem um custo-benefício que garante um relativo pequeno retorno em termos de ganho adicional de inferência dos achados. No fim, todo esse esforço em aumentar o recrutamento para um dado estudo é baseado no dogma de que um bom estudo clínico deve possuir um poder inferencial de 80%. Em um comentário hilário, se não fosse dramaticamente aterrorizante, Peter lembra que o primeiro estudo que embasou este número mágico como referência para estudos clínicos na verdade estabeleceu a convenção de forma pouco teórica ou empírica. Leia o trecho:

“Cohen proposed using 80% power for sample size calculations in 1965, offering this as ‘a conventional value… when no other basis is available’ and adding, ‘Like all conventions, this value is arbitrary.’ More recently, even papers that explicitly condemn the conduct of trials with <80% power have acknowledged that this requirement is merely traditional, and challenges to the requirement have not elicited any cogent responses.”


Qual seria a saída, então? O ensaio traz uma série de alternativas viáveis que poderiam ajudar a guiar os pesquisadores a estimarem o tamanho amostral sem que fiquem desanimados com o tamanho surreal da amostra para os estudos de idéias inovadoras. A mais interessante que achei foi uma que estabelece o valor da informação. As demais alternativas poderão ser lidas pelos interessados. Usando essa abordagem, o pesquisador iria calcular o custo e o valor dos resultados que podem ser esperados por um estudo com diferentes tamanhos amostrais, e aquele número de indivíduos que imputa o máximo valor esperado da investigação com menor custo seria o escolhido. Peter admite que essa alternativa pode ser mais complexa do que a baseada no poder do estudo, mas reforça que isso reduzirá dinheiro e otimizará a execução dos estudos.

E agora, o que você vai fazer? Ficar com o dogma ou partir pra inovação?

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