Desde o descobrimento das células
Th1 e Th2 por Tim Mosmann e Robert Coffman em 1986 (aqui), muita
coisa aconteceu. Hoje em dia, sabemos que diversos subtipos de células T
auxiliar além de Th1 e Th2 existem e que possuem um importante papel no sistema
imunológico.
Ao contrário do que se pensava na época de
Mosmann e Coffman, atualmente sabemos que os subtipos de células T não são tão
estáveis como se imaginava. Eles apresentam plasticidade que por sua vez,
dependendo do contexto, podem ter um caráter prejudicial. Por exemplo, foi
demonstrado que células Th17 produtoras de IFNg são
encontradas em diversas doenças auto-imunes, como doença inflamatória
intestinal (aqui),
artrite idiopática juvenil (aqui) e
esclerose múltipla (aqui).
Células Treg que perdem a expressão de Foxp3 e se tornam Th17 possuem um papel
importante na artrite reumatóide (aqui); e
células Th2 produtoras de IL-17 já foram associadas com a gravidade da asma (aqui).
Portanto, é de extrema importância caracterizar os mecanismos pelos quais um
determinado subtipo de célula T se torna estável.
Modificações epigenéticas são
capazes de estabilizar a expressão gênica e, dessa forma, acredita-se que desempenham
um papel importante na estabilidade de células T. No entanto, os fatores que
coordenam essas alterações na cromatina, com consequente alteração na
ativação/repressão de fatores de transcrição ainda não foram completamente
definidos.
Neste sentido, Brown e
colaboradores (aqui) vieram
demonstrar em um artigo extremamente elegante publicado na edição de março da
revista Immunity, que o ácido retinóico é essencial no desenvolvimento e na
manutenção de células Th1 (Figura 1). Essa molécula também foi demonstrada como
importante na inibição do desvio de células Th1 para o fenótipo Th17.
No desenvolvimento de células Th1,
o ácido retinóico atua na fase final da diferenciação promovendo o pico tardio
da expressão de T-bet via o aumento da expressão de STAT4.
Já na manutenção do fenótipo Th1,
foi demonstrado através de análise epigenética realizada por ChIP-Seq que o
ácido retinóico se liga em regiões promotoras e enhancers de genes importantes para a promoção do perfil Th1, como Stat4, Tbx21 (T-bet), Ifng e Irf8 através de seu receptor RARa,
induzindo o recrutamento de enzimas acetiltransferases, como p300 e CBP, que
remodelam a cromatina desses genes para que sejam mais expressos (promoção da
linhagem Th1).
Além disso, foi observado que a
sinalização do ácido retinóico atua de forma direta e indireta na inibição da
conversão de uma célula Th1 para o perfil Th17. Na atuação direta, a ligação de
ácido retinóico a seu receptor em regiões promotoras de genes fundamentais para
a linhagem Th17, como Il6ra e Runx1, impede que esses genes sejam
expressos. Na ausência do receptor de IL-6, a molécula STAT3 não é ativada e
não induz a expressão do fator de transcrição master do perfil Th17, RORgt. E na ausência de
expressão de Runx1, RORgt não
sofre transativação e sua expressão é diminuída. Na atuação indireta, IRF8 que
é expresso via sinalização de ácido retinóico compete com IRF4 para se ligar em
BATF, o que impede a ação de BATF-IRF4 que é aumentar o acesso de STAT3 e RORgt a genes
importantes para as células Th17 (Il17a,
Il21, Il22, Il23r e Il1r).
Portanto, concluímos que o ácido
retinóico tem papel fundamental no comprometimento de células Th1 e na inibição
da plasticidade dessas células para o perfil Th17. Dessa forma, a sinalização
do ácido retinóico aparece como um importante alvo de intervenção em doenças
onde uma desregulação do eixo Th1-Th17 é observado.
Figura 1.
Representação esquemática dos mecanismos de atuação do ácido retinóico na
diferenciação e manutenção de células Th1.
Post por
Frederico Ribeiro e Taline Klein (doutorandos/IBA/FMRP-USP)
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