Após quase 3 anos desde o pioneiro
trabalho de Vishva Dixit (Kayagaki et al., 2011), enfim o elo perdido
entre caspase 11 e piroptose foi descrito. Mas, antes de contar essa nova
história, vale a pena voltarmos um pouco no tempo, juntarmos todas as
informações e contarmos como tudo começou.
Eis que, em 2011, no ápice da “era inflamassoma”,
surge o trabalho que causou grande alvoroço nos conceitos da área. Em busca de
novos ativadores, Kayagaki
e cols (2011) demonstraram que a toxina colérica B (CTB) era capaz de
induzir a secreção de IL-1β em sua forma
ativa, ou seja, CTB também ativava o inflamassoma. No entanto, macrófagos
isolados de animais da linhagem 129 não o faziam. Surpreendentemente, os
autores descobriram que esses animais possuíam um defeito funcional na formação
de pró-caspase 11, que é uma enzima relacionada com a caspase 1. Através da
utilização de animais knockout para Casp11,
eles demonstraram que essa molécula era diretamente relacionada com a indução
de piroptose e liberação de IL-1α mediada
por CTB, assim como por bactérias gram-negativas (E. coli, C. rodentium e V. cholera). De maneira interessante,
esse mecanismo foi independente da ativação dos outros inflamassomas descritos.
Por fim, de maneira mais supreendente ainda, eles demonstraram que o papel
deletério no choque séptico, anteriormente atribuído à caspase 1, era mediado
por caspase 11.
Em elegante trabalho liderado por Dr Edward
Miao foi demonstrado que esse novo inflamassoma (chamado de não canônico) era
responsável pela proteção frente à infecção por bactérias gram-negativas que evadem
o vácuolo e adentram o citosol (Aachoui et al.,
2013). Não demorou muito para que novos mecanismos fossem
acrescentados a essa área. Após seis meses, dois trabalhos publicados pelos
mesmos grupos e na mesma edição da conceituada Science, demonstraram que o inflamassoma não canônico era ativado
por LPS citosólico, em via independente de TLR4 (Hagar et al., 2013; Kayagaki et al., 2013). Pois é, em via
independente de TLR4!!!
Após essas publicações, uma grande dúvida
surgiu: se o mecanismo independe de TLR4, como o LPS ativa caspase 11? Dois
modelos foram então propostos (Broz e Monack, 2013). No primeiro deles, a simples expressão e síntese de altas quantidades
de pró-caspase 11 seria responsável por sua autoativação. No segundo e mais
plausível modelo, o LPS intracelular seria reconhecido por um receptor
desconhecido, o qual converteria a caspase 11 em sua forma ativa. Shi e cols.
(2014) demonstraram que nenhuma dessas alternativas era verdadeira (Shi et al., 2014).
Utilizando-se de culturas de monócitos,
células epiteliais e queratinócitos humanos, os autores notaram que a
eletroporação de LPS levava à morte dessas células por piroptose, de maneira
dependente de caspase 4. Eles também demonstraram que a caspase 11 murina,
homóloga à caspase 4 humana, mediava o mesmo mecanismo, o que demonstra um
intercâmbio funcional entre as duas caspases (4/11). Através de diversas
técnicas bioquímicas, os autores mostraram a ligação física entre as caspases 4/11
e LPS e concluíram que essa ligação se dava de forma altamente específica e com
alta afinidade. Por fim, os autores demonstraram que todo esse mecanismo requeria
o reconhecimento direto do LPS pelo domínio CARD funcional (da caspase 11), uma
vez que sua ausência ou perda de funcionalidade impedia a ocorrência da piroptose.
Diante de todos esses dados, ao tratarmos do inflamassoma não canônico, chegamos a um
novo conceito. A ativação de caspase 11 se dá diretamente pelo reconhecimento de
LPS citosólico, através de seu domínio CARD. Esse evento culmina na indução de
piroptose, assim como na liberação de fatores pró-inflamatórios (em especial
IL-1a e HMGB1).
Paralelamente, essa caspase 11 também tem papel importante na liberação IL-1β e
IL-18, que dependente do inflamassoma de NLRP3.
Post
de Kalil Alves de Lima e Lucas Coelho Marlière Arruda, (doutorandos IBA/FMRP/USP-RP).
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