terça-feira, 9 de abril de 2013

Transplante de timo trata crianças com imunodeficiência severa

Fonte: Agência FAPESP

09/04/2013
Por Karina Toledo

Agência FAPESP – Para tratar uma forma rara e grave de imunodeficiência primária, pesquisadores do Centro Médico da Universidade Duke, nos Estados Unidos, estão realizando experimentalmente o transplante de timo – pequeno órgão em forma de borboleta localizado perto do coração.
Os detalhes da técnica e resultados das primeiras cirurgias foram apresentados durante a 2ª Escola São Paulo de Ciência Avançada em Imunodeficiências Primárias (ESPCA-PID), realizada entre os dias 3 e 8 de março com apoio da FAPESP).

Segundo a pediatra Mary Louise Markert, que coordena a equipe médica responsável pelo transplante na Duke University, o procedimento é indicado para os casos mais severos de uma doença genética conhecida como síndrome de DiGeorge, nos quais o bebê nasce sem o timo.

“O timo funciona como uma escola, onde um tipo muito importante de célula de defesa – o linfócito T – amadurece e aprende a proteger o corpo contra os patógenos. Na forma completa da síndrome de DiGeorge não há linfócitos T na corrente sanguínea do paciente, o que significa que ele está completamente vulnerável a infecções”, explicou Markert à Agência FAPESP.

Também é no timo que as células T aprendem a diferenciar os antígenos do próprio organismo e a não atacá-los. Em alguns pacientes com uma forma atípica da síndrome de DiGeorge, as células T até estão presentes no sangue, mas sem terem passado pelo treinamento no timo. Por conta disso, passam a atacar o próprio corpo causando inflamações terríveis na pele e em outros órgãos.

“Por meio de um teste sanguíneo é possível verificar se há células T circulantes e se elas expressam a proteína CD45RA – um indicador de que aquele linfócito passou pelo amadurecimento no timo. Em um bebê saudável, 70% das células T devem expressar esse marcador. Quando o exame indica 0% ou 1%, há algo muito errado com o timo, então é sinal de que aquele bebê pode se beneficiar com o transplante”, disse Markert.

A equipe nos Estados Unidos já realizou o procedimento em 64 crianças com a forma completa de DiGeorge e em outros dois portadores de uma mutação no gene Foxn1 – caracterizada pela ausência de timo e de cabelo.

“Quando um cirurgião cardíaco opera um bebê com cardiopatia congênita, precisa muitas vezes remover uma parte do timo, pois esse órgão fica bem na frente do coração e é muito grande em recém-nascidos. Em vez de descartar o tecido no lixo, eles o colocam em um copo esterilizado e me informam. Claro que isso é feito com o consentimento da família”, contou Markert.

O material doado passa então por uma bateria de exames para descartar qualquer tipo de contaminação. Em seguida, as células são cultivadas em laboratório e cortadas em fatias bem finas.

“Após duas ou três semanas, essas fatias são implantadas no músculo da coxa da criança receptora. É como plantar tulipas: o cirurgião abre um espaço entre as células musculares, coloca o tecido e tampa”, contou.

As células do timo passam a crescer na perna e os glóbulos brancos imaturos produzidos na medula óssea começam a se dirigir ao local para receber o treinamento, contou a médica. “Quando você tem a escola, os estudantes vêm. Quando tudo dá certo, quatro meses após o transplante as células T maduras já podem ser detectadas na corrente sanguínea”, disse a cientista.

Entre os pacientes operados pela equipe de Markert, sobreviveram 45 portadores da síndrome DiGeorge e os dois portadores da mutação Foxn1 operados. O tempo de sobrevida pós-transplante varia entre 2 meses e 19 anos, com média de 7,2 anos.

“Eles têm uma vida semelhante à das crianças que possuem a forma não completa da síndrome de DiGeorge, ou seja, que possuem um timo pequeno e não precisam de transplante. Eles conseguem frequentar a escola e não necessitam de imunossupressores”, contou Markert.

Ela ressalta, porém, que a síndrome de DiGeorge pode comprometer outros órgãos, como a glândula paratireoide e o coração, e esses problemas não são resolvidos com o transplante de timo.

“Durante o desenvolvimento embrionário, o timo, a paratireoide e o coração ficam todos localizados no pescoço do feto. Depois, o timo e o coração descem para o tórax e a paratireoide permanece no pescoço. Em portadores de DiGeorge alguma coisa dá errado durante a gestação e esses órgãos são afetados”, explicou Markert.

Rastreamento de recém-nascidos
Os portadores da síndrome também podem apresentar malformações faciais, renais e de vias aéreas, além de problemas neurológicos e distúrbios de linguagem e audição. Estima-se que a doença afete 1 em cada 4 mil crianças nascidas vidas. Os casos mais graves, caracterizados pela ausência completa de timo, afetam 1 em cada 200 mil bebês.

“Possivelmente o problema é mais frequente do que imaginamos. Saberemos melhor sua abrangência com os resultados dos programas de rastreamento neonatal”, disse a médica.

Alguns estados norte-americanos realizam, desde 2008, o rastreamento de recém-nascidos para a detecção de imunodeficiências primárias graves caracterizadas pela ausência de células T no sangue. O Brasil possui um projeto-piloto em São Paulo e deve começar outro no Estado de Minas Gerais no segundo semestre de 2013. Leia mais em http://agencia.fapesp.br/16932.

Um comentário:

  1. Sou aluno de mestrado (UFAL) e meu projeto é sobre a diferenciação tímica in vitro. Adorei o texto e, se possível, gostaria saber alguns detalhes como: Se o transplante tímico é alogênico, não haveria rejeição no paciente? As células estromais aderem e proliferam no músculo ou ficam restritas ao tecido transplantado? E a atração de progenitores é através de quimiocinas?
    Sei que são perguntas bastante específicas, mas creio que complementariam a postagem.
    Muito obrigado e sou fã do blog!

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