quarta-feira, 17 de outubro de 2012

T cells epigenetics


Tenho acompanhado esse blog já há uns dois anos, porém nunca escrevi nada por não trabalhar diretamente com imunologia. Porém nas duas últimas edições da Cell, saíram dois interessantes papers na área que eu trabalho (epigenomics) e na minha área de formação (imunologia), então resolvi escrever esse post.

O primeiro artigo (“Foxp3 Exploits a Pre-Existent Enhancer Landscape for Regulatory T Cell Lineage Specification”) foi publicado pelos grupos do Alexander Y. Rudensky, de NY, e do John A. Stamatoyannopoulos, de Seattle. O Rudensky dispensa introdução em um Blog de imunologia. Mas para quem não conhece o Stamatoyannopoulos, ele é um dos líderes do ENCODE (Encyclopedia of DNA Elements). Uma colaboração internacional que visa construir um lista completa dos elementos funcionais do nosso genoma. Eles recentemente (5 de setembro) publicaram uma enxurrada de 30 papers (Science, call, nature, genome research, etc) mostrando que grande parte do genoma humano é funcional, mesmo as partes não transcritas.

Bem, seguindo essa linha de raciocínio, os grupos do Rudensky e do Stamatoyannopoulos se perguntaram se o Foxp3 seria capaz de gerar elementos funcionais durante a diferenciação de Tregs de forma ativa (modificando a cromatina para gerar novos ‘enhancers’) ou passiva (utilizando-se de locais onde o DNA já esta acessível) e observaram que Foxp3 atua de forma passiva (ou ‘oportunista’).  O que eles observaram foi que Foxp3 se liga a regiões que estão previamente acessíveis em células T CD4 precursoras. Ou  seja, a maioria dos sítios de ligação para Foxp3 já estão acessíveis em células T naive (mas nao em células B, por exemplo) e apresentam a ligação de Foxo1 (‘placeholder for foxp3?). Interessantemente, os sítios de ligação de foxp3 que não estão acessíveis em células T naive, se tornam acessíveis após a ativação do TCR, independentemente da ativação de Foxp3 e, em sua maioria, dependente de NFAT. A meu ver, isso mostra a plasticidade das células T naives, onde o epigenoma já esta remodelado de forma a permitir uma rápida diferenciação em célula Treg. A pergunta que ficou é se o epigenoma dessas células T naive tb já esta remodelado para a diferenciação do outros subtipos? Em outras palavras, a célula T naive ja apresenta os sítios de acessibilidade tanto de Treg quanto de Th17 por exemplo? 

De fato, o segundo paper mostra exatamente isso (A Validated Regulatory
Network for Th17 Cell Specification), onde o grupo do Dan Littman estudou as ‘regulatory networks’ que geram a diferenciação de TH17. Eles observaram um processo semelhante, onde regiões que apresentam IRF4 e BATF em células Th0 também apresentam RORg em células Th17, sugerindo que RORg também tem um comportamento ‘oportunista’. Infelizmente nesse paper eles não analisaram a acessibilidade da cromatina antes e depois da ativação do TCR. Mas pelos resultados de FAIRE-seq em Th0 (ja estimulado o TCR) e Th17, da para inferir que muitos dos sítios que são ligados pelo RORg, já se encontram abertos em Th0, reforçando a hipótese de que T naive apresentam um epigenoma mais plástico, tanto com características de Tregs quanto de Th17. De fato, mais do que dois terços dos sítios acessíveis em Th17 ja estão acessíveis em Th0 (figura suplementar 3).  

Juntos, os dois papers sugerem que T naives apresentam um epigenoma mais plástico, e que após a ativação do TCR mais regiões irão se remodelar e se tornarem acessíveis. A partir dai, os estímulos secundários, como citocinas por exemplo, irão ditar quais ‘master TFs’ (Foxp3, RORg, etc) se tornarão dominantes. Esses TFs se ligarão aos seus sítios que estão acessíveis e permitirão que as redes de expressão genica para cada subtipo celular se formem, durante um período intermediário de diferenciação.  Por fim, isso ira permitir que novos sítios se tornem acessíveis, esse sim são realmente Treg- specific ou Th17-specific. Esses últimos aparentam ser extremamente relevantes para a função dessas subpopulações celulares. De fato, o grupo do Rudensky conseguiu achar SNPs em diversos GWAS localizados nessas regiões e estes são significantemente associados a doenças inflamatórias. 

Infelizmente o paper do Littman analisou apenas células Th0, sem se aprofundar em T naive X ativada. Apesar dos papers terem usados métodos diferentes para analisar a acessibilidade da cromatina (DHS e FAIRE), ainda assim será possível no futuro integrar os dados dos dois grupos (ou talvez se repetir o experimento adicionando outras subpopulações de células T, associado a ChIP-seq do respectivo fator de transcrição)  para obter uma visão geral da plasticidade do epigenoma de células T naive e dos sítios de acessibilidade de cromatina que são específicos para cada subpopulação. Esses papers sugerem que esses sítios específicos são as regiões genômicas funcionais mais relevantes para cada subpopulação e permitiriam correlacionar alterações genéticas (SNPs por exemplo) com a subpopulação que estaria causando a doença!

Daniel de Carvalho
Ontario Cancer Institute
University of Toronto

3 comentários:

  1. Excelente post, Daniel. São papers para a proxima rodada do nosso grupo de estudos em T cell differentiation aqui no lab. Estamos especialmente interessados em aprofundar a possibilidade de modificar transcricao em celulas anti-tumorais, ja diferenciadas - e esses papers mostram uma tendencia que ja se esperava, que é mais dificil, mas não impossivel. Estamos curiosos pra estudar a relevancia do sinal via TCR e a especificidade nesse processo. bjs

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    1. Oi Cris, de fato esses trabalhos sugerem uma certa diminuição da plasticidade nas células mais diferenciada. Entretanto, vc tem que ter em mente que esses ChIP-seq experimentos são feitos com um grande numero de células, mas na verdade existem diversos landscapes la. Então para reprogramar é só uma questão de eficiência, já que poucas células tem um padrao de acessibilidade da cromatina que permita acessar genes de outras linhagens e isso é definido stochastically. O exemplo máximo disso são as iPS cells. O grupo do Rudolf Jaenisch publicou na cell a umas duas ou três edições atrás um paper bem interessante sugerindo isso (Single-Cell Expression Analyses during Cellular Reprogramming Reveal an Early Stochastic and a Late Hierarchic Phase) pelo padrao de expressao em single cells. Eles usaram uma tecnologia recente chamada fluidigm que permite fazer real-time PCR de ate 48 genes de uma vez em single cells. Na verdade seria bem interessante aplicar essa tecnologia em células T (se é que alguém já não usou...). bjs

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