Semana
passada começamos aqui no Pós-Graduação a disciplina de Biologia Tumoral, e pra minha surpresa 21 alunos –
recorde no pg - apareceram
inscritos. Na primeira aula falamos do outline que teria a disciplina. Como
curto muito o artigo Hallmarks of Cancer do Hanahan e Weinberg, falei que íamos
começar analisando cada uma delas. Cada vez que se fala em metástase, uma das
hallmarks, o pessoal ficava mais quieto e prestava mais atenção. Tem alguma
coisa nessa palavra.
Fazem
pouco mais de dez anos que as bases moleculares da metástase tumoral – fenômeno
de pior prognóstico para qualquer paciente de câncer – começaram a ser
compreendidas.
As
primeiras descobertas foram sobre as alterações observadas em moléculas de
adesão expressas pelo próprio tumor, como a E-caderina. Essa proteína é
importante para manter as camadas homogêneas dos epitélios e as células
arranjadas de maneira organizada. Perda da E-caderina por carcinomas promove
metástase. Já outras caderinas, quando superexpressas pelo tumor, vão ajudar na metástase.
Mais
recentemente foram identificadas redes de interações complexas entre tumor e
estroma, que são necessárias para a cascata metastática, como se diz. O tumor
precisa extravasar do tecido, intravasar no vaso – que muitas vezes ele mesmo
criou por neo-angiogenese – chegar ate outros sítios do corpo (mistério total
como as células tumorais fazem esta parte, como fazem para preferir o pulmão
por exemplo) – extravasar do vaso, sobreviver no novo tecido... enfim. Parece
ate que para proliferar as células metastáticas tem requisitos diferentes,
comparado com as células dos tumores primários (ver a review do Valastyan,
abaixo).
Mas a
parte mais interessante pra mim são as novíssimas descobertas de como monócitos
(ver os trabalhos do Jeffrey Pollard) e neutrófilos (ver Spicer et al, doi:10.1158/0008-5472.CAN-11-2393) fazem as alterações
teciduais (Pollard) e endoteliais (Spicer) que possibilitam duas fases dessa
cascata metastática. Por mais que
os oncogenes dirijam a transformação tumoral – o sistema imune é necessário
para a metástase.
Mais: um
fenômeno comum da quimioterapia é, após eliminar grande parte da massa de células
tumorais, selecionar uma variante agressiva que em dias ou semanas metastatiza,
e é quimioresistente. É aquilo que se ouve falar o fulano estava bem, de
repente veio uma segunda onda do tumor com uma fúria e o cara morreu em uma
semana. Um trabalho do mês passado mostrou que esse fenômeno depende da interação
de células tumorais, endoteliais e... mielóides. Células e câncer de mama que
superexpressam CXCL1 e 2 atraem células CD11b+Gr1+ que produzem quimiocinas
angiogenicas que ajudam o tumor a sobreviver. Os quimioterápicos matam células tumorais,
mas esses tratamentos também induzem uma onda inflamatória no estroma, levando
a produção de TNF-alfa, que via NFkB ampifica a produção das quimiocinas
CXCL1/2 , atrai as mesmas células mieloides de novo, e monta um loop de resistência a quimioterapia.
O Hanahan
é o biólogo molecular que inventou os meios SOC e SOB, e o Weinberg, Nobel
esperando pra acontecer, identificou o
primeiro oncogene – Ras – e o
primeiro tumor-supressor – Retinoblastoma.
Biólogos moleculares e celulares, que finalmente incluíram na revisão da revisão
– as hallmarks que eles chamam de
emergentes (acho engraçado isso) - da promoção tumoral pela inflamação e da
capacidade do tumor de evadir o sistema imune. É nesta área, sem duvida, que as
próximas grandes contribuições para a compreensão do crescimento tumoral e da metástase
serão dadas.
O paper
Acharyya
et al, Cell. 2012 Jul 6 150(1):165-78.
Sugestão
pra começar a ler sobre o assunto
Valastyan
e Weinberg, Cell 147,
October 14, 2011, p275
Hanahan e
Weinberg, Cell 147, October 14,
2011, p646
Friedl e
Alexander, Cell 147, November 23,
2011 p949
Parabéns pelo post Cris!!
ResponderExcluirEssa disciplina promete...
Muito legal o post.
ResponderExcluirRealmente a "metástase" é um fenômeno que assusta as pessoas tanto pela falta ainda de conhecimento sobre o processo em si, como principalmente pelo nosso temor dele estar acontecendo/acontecer com a gente.
O que vale ressaltar é que a vasta diversidade dos tipos e origens tumorais, assim como as seleções que eles sofrem, torna cada tumor único. Porém, creio que classificar os tumores apenas pelo local de origem tumoral torna a nossa capacidade de tratamento/intervenção muito limitada. Entender melhor os mecanismos de progressão e evolução tumoral, e a partir disso classificar essas neoplasias dentro desses parâmetros nos permitirá fazer muito mais. Infelizmente, estamos um pouco longe dessa visão.
Excelente post Cris! Imunologia tumoral é um tema fascinante! Tenho alguns alunos meus aqui que adorariam poder estar no RS para fazer esta disciplina! bjs
ResponderExcluirThiago Rafa e Kelly, obrigada pelos comments; também acho este tema fascinante e estamos sempre a disposição, venham nos visitar! bjo, Cris
ResponderExcluirAdorei o post!! e principalmente as sugestões de artigos para começar a ler e compreender um pouquinho sobre biologia tumoral!!
ResponderExcluirParabéns Cris Bonorino. Fernanda Bruni.