quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Mind versus Nature?

Mind versus Nature?
Há um conjunto de fitas-cassete conhecidas como “as fitas de Bateson” (Bateson tapes), gravadas em reuniões de pequenos grupos orientadas por Gregory Bateson nos anos finais de sua vida, en Esalem, em Big Sur, na California, também conhecidas como “as fitas de Esalem”.
A fita nº4, intitulada “O que é Epistemologia” começa com as seguintes definições:
“Epistemologia é:
a - um ramo da Filosofia ligado à pergunta: "Como é possível conhecer algo?",
e, "O que é a verdade?", e perguntas este tipo;
b- um estudo de história natural - ou melhor, dois estudos de história natural:
b1 - um estudo de como as pessoas pensam que conhecem as coisas;
b2 - um estudo de como as pessoas conhecem as coisas - que pode ser algo
muito diferente.
Isto tem a ver com a palavra como, e com a questão do conhecer.”
ao que Bateson acrescenta este comentário notável:
“Todo mundo tem uma epistemologia, senão não poderia conhecer nada.
Aqueles que afirmam não ter nenhuma, têm uma ruim.”
A diferença entre “como as pessoas conhecem as coisas” e como elas “pensam que conhecem as coisas” é uma questão sobre “conhecer o conhecer”, algo que Bateson afirmaria pertencer a um “tipo lógico” (tipo russeliano) mais elevado.
Conhecer o conhecer é também um ponto central na obra de Humberto Maturana (ver “A Árvore do Conhecimento”) e há paralelos - mas também grandes diferenças - entre as obras destes grandes pensadores do século XX. Conheço uma única comparação importante entre estes pensadores (Dell, 1985) mas, evidentemente, outras são necessárias e devem existir; ver também Graciano, 1997).
Esta diferença entre “como conhecemos” e “como pensamos conhecer” foi também o motivo central de uma conferência organizada por Gregory Bateson, em 1972, com o apoio da Werner Grenn Foundation, comentada em detalhe por sua filha Mary Catherine Bateson, em seu livro “Our Own Metaphor””, intitulada “Propósito consciente versus natureza” (MC Bateson, 1972). Este título nos esclarece que, para Gregory Bateson, não se tratava apenas de uma diferença, mas sim de uma oposição; para ele, nossa maneira de pensar contradiz os processos naturais e é, afinal, destrutiva.
Na contracapa deste livro
está escrito: “Nossa Própria Metáfora, com seu foco na capacidade humana de estabelecer objetivos conscientes, fornece uma nova abordagem à questão básica de se os seres humanos com suas tecnologias cada vez mais poderosas, acabarão por destruir o ambiente do qual dependem ou serão capazes de um novo nível de adaptação. Baseado em uma conferência organizada pelo antropólogo Gregory Bateson e observada e interpretada por Mary Catherine Bateson, o livro sugere que qualquer solução para os milhares de problemas do mundo precisa estar fundamentada em um entendimento empático de sistemas - da ecologia dos lagos à interdependnência entre a mãe e sua criança.”
Há, portanto, algo de contraditório no título do livro mais famoso publicado por Gregory Bateson em vida , chamado “Mind and Nature - A Necessary Unity (G Bateson, 1980)
. Esta “unidade necessária” é o inverso da situação vigente, uma situação na qual, segundo Bateson, não existe unidade. mas sim oposição entre a mente humana (em seu propósito consciente) e os processos naturais. A reunião resenhada por MC Bateson (Propósito Consciente versus Natureza) bem poderia ter sido intitulada “Mind versus Nature” - a negação (prevalente) de uma unidade necessária.
Há também um esclarecimento da maior importância que tem a ver com aquilo que tanto Bateson quanto Maturana chamam de “mente” e o que usualmente se entende por “consciência”. Em “Mind and Nature”, Bateson afirma explicitamente no último parágrafo do capítulo central do livro (cap 4):
“Com relação à consciência, o assunto é mais obscuro. Neste livro, nada foi dito a respeito da consciência exceto para notar que na questão da percepção, os processos de percepção não são conscientes mas seus produtos podem ser conscientes. Quando o termo consciência é usado neste sentido, pareceria que o fenômeno está de alguma maneira relacionado à questão dos tipos lógicos ao qual demos um grande grau de atenção. Entretanto, não conheço nenhum material que realmente conecte os fenômenos da consciência a fenômenos mais primitivos ou mais simples e não tentei fazer isto no presente trabalho.”
Em resumo, o livro “Mind and Nature” não discute e nem sequer faz referência ao que usualmente entendemos com consciência. A mente a que Bateson se refere é algo imanente aos seres vivos, em geral, e transparece em sua afirmação de que a evolução biológica e os processos mentais são problemas da mesma natuerza, e também em dizer que a mente não está presa “em um saco de pele”.
Este é um ponto importante e delicado de confluência entre as obras de Bateson e Maturana, porque Maturana tembém diz: “A mente não está na cabeça: a mente está na conduta” (Maturana, 1985).
Por estas e outras razões, pensei que seria oportuna colocar na internet uma tradução de “Mind and Nature” (Bateson, 1980) para o português do Brasil. Há uma tradução, de 1986, pela Livraria Editora Francisco Alves, Rio de Janeiro que, além de já esgotada, a meu ver comete vários deslizes de tradução que adicionam graves problemas à leitura da obra de Bateson, já muito complexa em si mesma. Há também uma edição portuguesa (“Natureza e Espírito”) pela Editora Don Quixote, Lisboa, 1987, que já no título do livro, revela diferenças não triviais de tradução.
Estou no processo de realizar uma tradução do original de “Mind and Nature”, assim como dos “metálogos” com os quais se inicia o segundo livro mais famoso de Bateson” Steps to an Ecology of Mind” (Bateson, 1972) uma importante coleção de textos seus reunida por seus estudantes. Uma tradução em separado destes “metálogos” foi também publicada pela Editora Gradiva, Lisboa, mas sofre dos problemas usuais de diferenças no uso do idioma entre Portugal e Brasil. Preciso ainda examinar os problemas de direitos autorais para tornar este projeto exequível.
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O que tem isso a ver com a Imunologia? Para as formas usuais de ver a Imunologia, talvez, nada. Para outras, talvez tenha algo muito básico a contribuir.
Bateson, M.C (1972, 1991) Our own Metaphor. A personal account of a conference on the effects of conscious purpose on human adaptation.” Washington and London, Smithsonian Institute Press. Bateson, G. and M. C. Bateson (1991). A Sacred Unity - Further Steps to an Ecology of Mind. New York, HarperCollinsPublishers.ISBN: 0 00 635752 0
Bateson, G. and M. C. Bateson (2004). Angels Fear: Towards an Epistemology of the Sacred.
ISBN: 0 00 635752 0
Bateson, G. and M. C. Bateson (1987). Angels Fear: Towards an Epistemology of the Sacred.
New York, McMillan Publishing Co.ISBN: 0 00 635752 0
Bateson, G. (1972). Steps to an Ecology of Mind.
New York, Ballantine Books. ISBN: 0-345-33291-1
Bateson, G. (1986). Mente e Natureza - A Unidade Necessária.
Rio de Janeiro, Livraria Francisco Alves Editora S.A.
Bateson, G. (1987). Natureza e Espírito - Uma Unidade Necessária.
Lisboa, Don Quixote
Bateson, G. (1996) Metálogos
Lisboa, Gradiva
Bateson, G. (1980). Mind and Nature: A Necessary Unity. London, Fontana.
ISBN: 0 00 635752 0
Dell, P. F. (1985). "Understanding Bateson and Maturana: Toward a biological foundation for the social
sciences." Journal of Marital and Family therapy 11(1): 1-20.
Graciano, M. M.C. (1997). A Teoria Biológica de Humberto Maturana e sua Repercussão Filosófica. Departamento de Filosofia da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG, Belo Horizonte, MG, UFMG, FAFICH. Mestrado.
Maturana, H. R. and F. J. Varela (1984). El Arbol del conocimiento. Las bases biologicas del entendimiento humano. Santiago, Editorial Universitaria.
Maturana, H. R. (1985). "The Mind is not in the head."
J.Social Biol.Struct. 8: 308-311.
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Dell, P. F. (1985). "Understanding Bateson and Maturana: Toward a biological foundation for the social sciences." Journal of Marital and Family therapy 11(1): 1-20.
The attempts to clarify (purify) the conceptual foundations of family therapy by means of “epistemology” have bred excitement, boredom, irritation and confusion. In the belief that at least the confusion can be alleviated, the present paper is offered as a study guide and something of a Rosetta Stone for translating the work of Gregory Bateson and Humberto R. Maturana. The paper demonstrates that Maturana's work is highly compatible with that of Bateson. In addition, several major points of contrast are argued: (1) Maturana's concept of structure determinism is an explicit ontological claim which directly implies an epistemology, whereas Bateson delineated an epistemology, but never clearly developed a corresponding ontology; (2) structure determinism is a more general concept than Bateson's concept of “mind” (i.e., cybernetic epistemology); (3) structure determinism deletes the remnants of objectivity from Bateson's theory (i.e., “the difference that makes a difference”); and (4) Maturana's concept of instructive interaction is a more general, nonsystemic version of what Bateson meant when he used the term “epistemological error.” Finally, it is claimed that the emphasis on epistemology has distracted proponents and detractors alike from the essential message of Bateson and Maturana: social systems and all human endeavor must be understood in light of our existence as biological entities that are coupled to a medium. The biological ontology implicit in Bateson's writings and explicitly delineated in Maturana's may (at long last) provide a sound foundation for the social and behavioral sciences.

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