sábado, 30 de abril de 2011

Workshop: On innate immunity and malaria


Serão disponibilizadas 150 vagas; 
não haverá taxa de inscrição, que deve ser feita através do e-mail disponível no cartaz; 
gastos com viagem e hospedagem deverão ser custeadas pelos participantes.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Mais uma razão para não eliminar o sistema imune dos pacientes de câncer



Raramente, durante a correria diária de revisar a literatura, a gente topa com um paper daqueles que tem um jeitão de iniciador de campo novo. Eu li muito rapidamente este paper (Cancer Cell 18, 485–498, November 16, 2010) quando saiu, bem na época do Imunotche, e depois felizmente dei sorte em assistir ao Dean Felsher falando sobre isso em Santa Fe em fevereiro, naquela conferencia de Cancer Control que relatei aqui. Então faz um tempo que estou pensando nisso.


Olha, vale a pena ler, ao menos partes (o paper tem 14 paginas), pois é a inauguração de uma nova linha de pensamento. Que eu acho que já existia, mas agora está invadindo a Cell.


O que a gente estuda e leciona, tradicionalmente, está lá no livro- a presença de células T CD4+ é importante para organizar a resposta anti-tumoral, para ajudar a resposta CD8+, sem célula T CD4+ tem mais tumor, etc. É a história dos 3 Es (equilíbrio, edição, escape).


Contudo, neste artigo – que Felsher diz que levou 10 anos pra escrever (!), pois achava que ninguém da área de câncer ia acreditar– aparece uma função nova para as células T CD4+ no controle do tumor. Elas seriam controladoras da angiogênese tumoral. Veja só, células T helper não precisam ser apenas coordenadoras de resposta imune. Podem desempenhar outros papéis ao mesmo tempo – or help in other ways.


Ele começa falando do conceito de oncogene addiction – algo como o tumor ser viciado num oncogene – são oncogenes que, quando a gente interrompe, o tumor morre – base da terapia com Gleevec pra leucemia, por exemplo. Algo considerado como o calcanhar de Aquiles dos tumores. Até hoje se achava que a morte tumoral associada com oncogene addiction era intrínseca da célula tumoral, não importava onde ela estivesse.


Por outro lado, sabemos que o sistema imune tem função importante na eliminação de tumores, mas será que ele teria algo a ver com oncogene addcition? Normalmente, os estudos de terapias anti-tumorais são feitos em modelos in vitro ou animais imunodeficientes como SCID ou nude.Não se leva em conta a resposta imune, vejam só.


Os resultados de Felsher mostraram que se inativamos MYC num modelo de linfoma T, ou BCR-ABL num modelo de leucemia B, as células tumorais entram em apoptose independentemente do sistema imune. Mas a recorrência do tumor, ou o tempo que leva para o tumor voltar, depende de um sistema imune intacto, particularmente da existência de células T CD4+.

Isso se deve ao fato de as células T CD4+ garantirem a senescência (observada através de marcadores como p16INK4a e p21) e a indução de TSP1 (trombospondina 1), um potente fator anti-angiogênico. As células T CD4+ infiltram o tumor quando há a oncogene inactivation, e modulam o ambiente de citocinas e quimiocinas local, favorecendo a eliminação do tumor.

Na verdade, ele não sabe exatamente como essas células fazem isso, nem se essas células são tumor-específicas. Se são T reg ou que tipo de TH. Se são as células T que fazem TSP. Provavelmente o infiltrado do tumor com e sem inativação de MYC vai ser diferente, mas ele ainda não olhou isso. Ficou pro próximo paper.

Ele conclui frisando algo que vários de nós já intuíam e advogam – que para se avaliar a eficácia de qualquer agente anti-tumoral, não se pode trabalhar só in vitro, ou em SCID mice. Tem que trabalhar com um sistema imune intacto, pois são várias as sutilezas que ainda não conhecemos.
Interessante que Felsher não é imunologista, vc lê o artigo e ele parece simples, testando o crescimento tumoral em nocautes de RAG, de CD4, etc, até tem experimentos que a gente como imunologista nem faria, mas isso apenas mostra o quanto as duas áreas, câncer biology e immunology, não tem crosstalk.


Esse achado devia servir pra lembrar a gente de algo que sabemos, mas não pensamos diariamente – células e moléculas têm múltiplas funções, simultâneas, aparentemente não relacionadas. Mais importante, reforça a necessidade de encontrar terapias anti-cancer que não tenham como efeito colateral a eliminação do sistema imune do paciente.


It is a whole new ball game.


Leiam o paper na integra em Cancer Cell 18, 485–498, November 16, 2010

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Sobre camundongos, gente e camundongo-gente


Recentemente, mudei o escopo da minha pesquisa. E essa mudança foi drástica. Trabalhei alguns anos com leishmaniose e malária humana. Depois, o cenário onde os experimentos se desenrolariam foi para o pulmão (a tal da tuberculose). Vim trabalhar com um grupo excelente, mas que não faz muitos trabalhos clínicos. Aqui, o negócio é imunobiologia hard core. Então, eu que nunca tive um projeto sério em camundongos para tocar, fiquei um pouco intimidado. Foi então que o meu querido supervisor me aprontou uma. Não bastava mais tentar fazer algo em camundongos. Tinha que ser nos benditos camundongos humanizados. Então vou contar pra vocês como estou encarando esse treco.

Primeiramente, temos que nos perguntar sobre a importância de se ter um camundongo humanizado. O negócio é que para muitas condições infecciosas (nem comento em outros campos não infecciosos), não há bons modelos experimentais que possam simular coerentemente a doença humana. Alguns exemplos são o HIV, HBV, dengue, malária, leishmaniose e tuberculose. Isso acontece porque esses e outros patógenos apresentam um tropismo único por hospedeiros humanos. Neste contexto, o desenvolvimento de estratégias de intervenção, seja terapêutia ou profilática, carece de modelos mais robustos, com custo-benefício e poder de predição que se adequem e reprodução a condição humana. Camundongos e primatas têm sido utilizados amplamente como uma alternativa interessante, e muito do que se sabe em imunobiologia e vacinologia é fruto de estudos essenciais usando esses bichinhos. Tais modelos experimentais são úteis, portanto, para vários contextos e doenças. Entretanto, é comum a gente se deparar com discrepâncias importantes que resultam no insucesso da aplicação de resultados pré-clínicos promissores em vacinas e tratamentos efetivos em pessoas. Dentre as possíveis explicações para essas discrepâncias, duas são para mim bem importantes. A primeira razão vem do lado do patógeno. Em muitos modelos experimentais de infecção, os patógenos usados são diferentes dos encontrados nas pessoas. Em malária, isso é gritante, por exemplo. Outro ponto essencial é que os correlatos imunológicos de proteção em espécies de mamíferos não humanos muitas vezes divergem das respostas humanas. Traduzindo, o que está associado à proteção ou suscetibilidade de camundongos a uma determinada infecção nem sempre é a mesma coisa em humanos. Isso, pra quem faz pesquisa básica com perspectiva clínica é um desespero. A galera tenta sempre convencer que o que está sendo descrito pro tal do camundongo serve pra gente. Infelizmente nem sempre o final da história é feliz. Um exemplo bem conhecido é o do HIV e hepatites virais. Durante décadas, chimpanzés têm sido utilizados para o estudos sobre a imunobiologia e também para testes terapêuticos contra o HIV, HBV e o HCV. Os genomas desses animais são 98% idênticos ao genoma humano. O problema é que pequenas discrepâncias podem fazer uma baita diferença no final. E na verdade, nossos primos chimpanzés não possuem nenhum alelo de MHC I em comum conosco. Além disso, o famoso alelo HLA-A2, bastante comum em humanos, é completamente ausente nos nossos parentes primatas. Algumas diferenças bem evidentes também são observadas no lado do MHC II. O problema ainda vai mais longe. O uso desses animais é muito caro e inclusive banido em vários países por questões éticas. O resultado deste montão de coisas é que os experimentos em chimpanzés usam geralmente um número bem limitado de indivíduos e encontram problemas que pesquisadores clínicos enfrentam corriqueiramente, tais como a variabilidade inter-individual e com ela a baixa reprodutibilidade dos resultados.

Aí, alguém teve um epifania. O camundongo-gente. Humanized mice. Podem chamar do que quiserem. Para alguns, essa idéia soou como a música do Tom Jobim “...Foi então, que da minha infinita tristeza aconteceu você…”. Ora pois, esses bichos seriam tudo de bom. Pequenos, mas humanos. Opa, não queremos tão humanos. Só o suficiente. Uma repórter do canal FOX 5 no ano passado se manifestou contra o uso desses animais, pois teriam cérebro humano e isso é anti-ético. Não é nada disso. O que os imunologistas querem é um bichinho fácil de manipular e que tenha o sistema imune completamente humano. Mas claro que esse bichinho não pode falar, senão iriam reclamar pra caramba, não é? A idéia de ter camundongos humanizados é bem interessante. O problema é fazer os bichos. E o pessoal já tentou de tudo. Transplantar órgãos, como fígado e baço, implantar timo, etc, etc, etc. Tem gente que conseguiu grants enormes, como na Yale. Não é que agora vou trabalhar com esses quimeras? Imaginem como estou intimidado agora. Não basta ser camundongo. Tem que ser um cara esquisito. Na realidade, não chegamos ainda no paraíso. Fato é que mesmo nos mais sofisticados modelos desses camundongos, a quantidade de células humanas ainda está abaixo das expectativas. O bicho é uma quimera, cheio de células vindas de camundongo e também de gente. O que a gente não sabe precisar ainda é o peso e o preço desse “quimerismo”. Mas a gente já sabe que a resposta imune contra o HIV e EBV nessas quimeras ainda não é comparável à resposta humana. A sobrevida das células-tronco hematopoiéticas implantadas ainda é muito curta e a diferenciação em linhagens específicas, como a eritrocítica, não é efetiva. Pior, a formação de estruturas linfóides primárias e secundárias é precária. Vários grupos começaram a tentar abordagens como knock-in, acrescentando fatores de crescimento humanos, como GM-CSF, para tentar otimizar o processo. Temos portanto boas perspectivas mais ainda um longo caminho pela frente.

E vocês, o que acham desses camundongos quimeras? Você toparia trabalhar com um desses?

Segue uma revisão interessante sobre o tema (da qual retirei a figura acima): Legrand N et al. Humanized mice for modeling human infectious disease: challenges, progress, and outlook. Cell Host Microbe. 2009 23;6(1):5-9.


quarta-feira, 27 de abril de 2011

Programas de Pós-Graduação

A última edição da revista Nature traz uma série de artigos que discutem os programas de pós-graduação e a formação de doutores em geral. Há artigos que se prendem mais à questão específica dos EUA, mas outros também abordam o que ocorre em diferentes lugares do mundo. Diferentes pontos de vista são apresentados a respeito de diversos aspectos relacionados aos programas de pós-graduação e à formação dos doutores em si. Muito se comenta sobre o incrível aumento no número de doutores formados ao longo dos últimos tempos e sobre a eventual dificuldade de que todas essas pessoas encontrem trabalho, emprego. Parece haver uma percepção geral de que um título de doutor, por lá, já não leva mais a tapetes vermelhos sendo estendidos como outrora.
doi:10.1038/nj7343-381a

Também se discute sobre a qualidade da formação alcançada e sobre a forte ênfase que os programas dão à perspectiva de trabalho na academia, o que restringiria o leque de oportunidades dos que se formam. É claro que há brutais diferenças entre o que ocorre aqui e o que acontece nos EUA e na Europa. No entanto, talvez, algumas reflexões também sejam pertinentes à nossa realidade. Por aqui o número de doutores formados também aumentou muito na última década. Será que o país deve almejar a manutenção desse ritmo? Caso deva, até quando? A expansão das universidades brasileiras é capaz de absorver os que se formam? E sobre a qualidade dos doutores que estão sendo formados durante esse período de crescimento intenso? É o que se deseja? Com que perfil? Aqui no Brasil, em especial na área de biologia e/ou ciências médicas, há espaço para doutores fora da academia? De que tamanho é esse espaço? O convite à troca de idéias está feito.

Os artigos originais são:
doi:10.1038/472261a
doi:10.1038/472276a
doi:10.1038/472280a
doi:10.1038/nj7343-381a

Acrescento também links para textos escritos pelo Professor Roberto G. S. Berlinck (Instituto de Química da USP - São Carlos). Os posts dele comentam cada um dos artigos originais e fazem uma certa contextualização com o que vivemos por aqui.

http://quiprona.wordpress.com/2011/04/24/a-reforma-da-pos-graduacao-i/
http://quiprona.wordpress.com/2011/04/24/a-reforma-da-pos-graduacao-ii/
http://quiprona.wordpress.com/2011/04/25/a-reforma-da-pos-graduacao-iii/
http://quiprona.wordpress.com/2011/04/25/a-reforma-da-pos-graduacao-iv/

terça-feira, 26 de abril de 2011

O Cardiologista e a Imunologia


Post de Luis Claudio Correia
No início do curso de medicina tive um primeiro contato com a imunologia, durante a disciplina que levava esse mesmo nome, coordenadas pelos Barrais (Manoel e Aldina). Achei interessante aquela história de várias células diferentes, interagindo entre si, cada uma com sua função. Parecia-me como funcionam as civilizações humanas, tanto do ponto de vista da cooperação, como dos conflitos.
Aquela sensação ficou por algum tempo apenas como uma boa impressão, sem grande aplicação prática. Enveredei pela clínica e me tornei cardiologista. Na cardiologia predominava uma explicação simplista para a doença aterosclerótica, ou seja, era o acúmulo do gordura na parede das artérias, provocado pelos altos níveis de colesterol plasmático e outros fatores de risco. 
Algum tempo passou e foi em meados dos anos 90 que a imunologia começou a se aproximar da cardiologia. Surgia a idéia do mecanismo inflamatório como mediador do acúmulo de gordura na parede dos vasos. Ou seja, é a presença de células inflamatórios da parede do vaso que possibilita o acúmulo de gordura na camada média das artérias. 
Em condições normais, o endotélio vascular é impermeável a leucócitos, impedindo a presença de células inflamatórias na parede das artérias. Dados experimentais indicam que células endoteliais de animais submetidos a dieta hiperlipídica passam a expressar receptores de superfície, que permitem a passagem de leucócitos para o interior do vaso.1 Ademais, animais geneticamente modificados para expressar receptores defeituosos se tornam protegidos contra aterosclerose.2 Estes dados sugerem uma relação de causalidade entre a penetração de células inflamatórias na parede dos vasos e desenvolvimento de aterosclerose. 
A expressão dos receptores de superfície (vascular cell adhesion molecule-1, VCAM-1, e intercellular adhesion molecule-1, ICAM-1) representa a ligação patogênica entre os fatores de risco e doença aterosclerótica. Fatores agressivos ao endotélio (hiperlipidemia, hiperglicemia, estresse de parede na hipertensão arterial, substâncias presentes no cigarro) diminuem sua produção de óxido nítrico, molécula que normalmente inibe a expressão dos receptores de superfície.3 Desta forma, é a disfunção endotelial promovida pelos fatores de risco que promove a penetração de células inflamatórias na parede vascular.4 Uma vez dentro da parede arterial, as células inflamatórias induzem a expressão de citocinas, dando início à cascata inflamatória responsável pela doença aterosclerótica.
Várias citocinas inibem a ação do óxido nítrico e aumentam ainda mais a expressão de moléculas de adesão, incrementando a penetração de monócitos e linfócitos na parede vascular. Monócitos se diferenciam em macrófagos com função de fagocitose de partículas de low density lipoprotein (LDL)-colesterol, provocando o acúmulo de lipídios na parede vascular.4 A IL-18 induz a expressão de TNF-α, que estimula a produção metaloproteinases por macrófagos da parede vascular.5 As metaloproteinases destroem o colágeno da capa fibrosa da placa aterosclerótica, tornando-a vulnerável para ruptura.4 Além disso, o TNF-α induz a produção de fator tecidual.6 A IL-18 estimula a produção de interferon-γ por linfócitos,7 cuja ação principal é inibir a produção de colágeno por células musculares lisas, enfraquecendo a capa fibrosa da placa.4 A IL-1 aumenta a expressão de fatores coagulantes.8 Paralelamente, a IL-7 é produzida por plaquetas ativadas,9 a qual induz a expressão de IL-8, que tem função quimiotática. Desta forma, percebe-se que a inflamação na parede do vaso resulta de uma intensa interação entre citocinas e células inflamatórias.
Desta forma, o cardiologista começa a pensar um pouco como imunologista. Marcadores inflamatórios passaram a ser aventados como preditores de risco cardiovascular. Embora o valor incremental da medida rotineira de marcadores inflamatórios na predição de risco seja questionável, a presença de associação independente entre risco cardiovascular e nível de inflamação subclínica reforçou a idéia da inflamação como um componente da fisiopatologia da aterosclerose. 
No entanto, ainda está por vir o maior benefício da interação imunologia/cardiologia. Este potencial benefício reside em terapias que bloqueiem o mecanismo inflamatório nas placas ateroscleróticas. Cardiologistas consideram que o uso de estatina é um tratamento antiinflamatório, pois este tratamento reduz marcadores inflamatórios como proteína C-reativa. Porém não sabemos até que ponto a redução da inflamação decorre de ação antiinflamatória direta ou se é simplesmente uma conseqüência da redução do colesterol na parede dos vasos. Além disso, estatina já está indicada como tratamento antilipidêmico, não representa exatamente um tratamento adicional, que vai reduzir ainda mais o risco cardiovascular.
O futuro pode estar em terapias que bloqueiem diretamente a inflamação na parede do vaso. Por exemplo, bloqueadores da expressão de receptores das células inflamatórias nas paredes dos vasos (VCAM-1, ICAM-1). Ou bloqueadores da ação do TNF-α ou interferon-γ. Uma vez isso desenvolvido, grandes ensaios clínicos deverão avaliar se estas intervenções serão capazes (não só de reduzir placas ateroscleróticas) de reduzir a incidência de desfecho importantes, como infarto, AVC ou morte. 
Caso isso ocorra, será grande o impacto da parceria cardiologia/imunologia e minha simpatia inicial por imunologia se confirmará como uma predição intuitiva da grande importância daqueles conceitos imunológicos básicos aprendidos no curso médico.
Quem sabe essa postagem desperte a curiosidade de imunologistas, fazendo surgir uma idéia que revolucione a prevenção e tratamento da doença aterosclerótica, maior causa de óbito no mundo.

Luis Claudio Correia (CV): Graduação em medicina pela Universidade Federal da Bahia (1992), residência médica no Hospital Universitário Professor Edgard Santos (1993-1994), research fellowship em cardiologia na Universidade de Johns Hopkins e National Institute of Aging - NIH (1995-1997), doutorado em Medicina e Saúde pela Universidade Federal da Bahia (2000-2003), pós-doutorado na Fundação Bahiana para o Desenvolvimento das Ciências, Professor Livre-Docente em Cardiologia pela UFBA (2010). Atualmente professor adjunto da Escola Bahiana de Medicina, incluindo atividade de professor permanente na Pós-graduação. Principal linha de pesquisa: Marcadores Inflamatórios em Síndromes Coronarianas Agudas.
Reference List
1. Li H, Cybulsky MI, Gimbrone MA, Jr. et al. An atherogenic diet rapidly induces VCAM-1, a cytokine-regulatable mononuclear leukocyte adhesion molecule, in rabbit aortic endothelium. Arterioscler Thromb 1993;13:197-204.
2. Cybulsky MI, Iiyama K, Li H et al. A major role for VCAM-1, but not ICAM-1, in early atherosclerosis. J Clin Invest 2001;107:1255-62.
3. Gauthier TW, Scalia R, Murohara T et al. Nitric Oxide Protects Against Leukocyte-Endothelium Interactions in the Early Stages of Hypercholesterolemia. Arterioscler Thromb Vasc Biol 1995;15:1652-59.
4. Libby P, Ridker PM, Maseri A. Inflammation and Atherosclerosis. Circulation 2002;105:1135-43.
5. Puren AJ, Fantuzzi G, Gu Y et al. Interleukin-18 (IFNgamma-inducing factor) induces IL-8 and IL-1beta via TNFalpha production from non-CD14+ human blood mononuclear cells. J Clin Invest 1998;101:711-21.
6. Coughlin SR. Thrombin signalling and protease-activated receptors. Nature 2000;407:258-64.
7. Okamura H, Tsutsi H, Komatsu T et al. Cloning of a new cytokine that induces IFN-gamma production by T cells. Nature 1995;378:88-91.
8. Moser R, Schleiffenbaum B, Groscurth P et al. Interleukin 1 and tumor necrosis factor stimulate human vascular endothelial cells to promote transendothelial neutrophil passage. J Clin Invest 1989;83:444-55.
9. Damas JK, Waehre T, Yndestad A et al. Interleukin-7-mediated inflammation in unstable angina: possible role of chemokines and platelets. Circulation 2003;107:2670-76.

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Dica de vídeo: mudanças de paradigmas - biologia, tecnologia, aplicações médicas

O simpósio "Conquering Cancer through the Convergence of Science and Engineering" aconteceu em março deste ano como parte das comemorações pelos 150 anos do MIT. Confira abaixo o vídeo de uma das sessões do evento, que teve como palestrantes nada mais nada menos que:

- Susan Lindquist: palestra começa aos 02:30min (Heat shock proteins)
- Eric Lander: 22:00min (belo resumo de câncer como doença genética, genômica do câncer)
- Leroy Hood: aos 40:04min (P4 medicine: “predictive, preventive, personalized and participatory”)

domingo, 24 de abril de 2011

Journal Club - IBA: O papel das células dendríticas plasmocitóides na pele

Um comentário publicado em Janeiro de 2011 na Nature Reviews Immunology aborda alguns estudos publicados sobre o papel das células dendríticas plasmocitóides na inflamação da pele (aqui).


As células dendríticas plasmocitóides (do inglês: Plasmacytoid dendritic cells- pDC), são uma população de células circulantes que expressam Toll-like receptor 7 e 9 (TLR7/TLR9) (aqui) e produzem grande quantidade de interferons do tipo I (IFNα/β) em resposta a infecção viral (aqui; aqui). Porém, a contribuição destas células na imunidade do hospedeiro não está totalmente esclarecida.


Recentemente, foram publicados dois trabalhos no Journal of Experimental Medicine abordando este assunto. Em um deles, Gregorio et al. mostraram que estas células estão ausentes em pele normal, porém são rapidamente recrutadas na pele danificada. Uma vez neste local, estas células produzem grande quantidade de IFNs tipo I que sinalizam para produção de outras citocinas como IL-6, IL-22 e IL-17, importantes no reparo da lesão. Para mais detalhes acerca do trabalho, clique aqui.


No outro trabalho, publicado por Guiducci et al, foi demonstrado que em animais suscetíveis à autoimunidade “(NBZxNBW)F1” também ocorreu um recrutamento de pDC para pele danificada, porém a constante ativação destas células via TLR7 e TLR9, levou ao desenvolvimento de lesões crônicas semelhantes àquelas observadas em pacientes com lúpus cutâneo. Quando bloquearam a ação das pDCs, seja por depleção ou bloqueio da sinalização via TLR7 e TLR9, o grau da lesão diminuiu, sugerindo um importante papel das pCDs nas doenças inflamatórias da pele, clique aqui.


Juntos, estes estudos sugerem que as pDCs servem como uma fonte inicial/transitória de interferons do tipo I, devido ativação de TLR7 e TLR9 por ácidos nucléicos endógenos e exógenos. Estas pDCs são importantes no controle da infecção viral no estágio inicial da infecção, além de promover o reparo do tecido lesionado diante de uma lesão aguda. No entanto, estas pDCs ativadas podem agravar a lesão e desencadear uma doença autoimune na pele em indivíduos suscetíveis.


Post de Gustavo Garcia; Luiz Gustavo Gardinassi; Thais Herrero.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Até onde vai a criatividade humana?

Há limites para a ciência? Estariam os pesquisadores preparados para produzir tecidos e órgãos humanos in vitro a partir de células-tronco totipotentes? Imaginem o anúncio de que fora feito o primeiro transplante de coração produzido em laboratório. Alguns diriam em uníssono: “maravilhoso!”; os anticlericais, agnósticos e ateus, em tom irônico, bradariam: “divino!”; outros, no entanto, ficariam em inércia mental, sem entender o que estava acontecendo. Essa possibilidade nos remete ao embate ardiloso travado entre ciência e religião. Até onde uma pode interferir na outra?


Se houvesse um plebiscito acerca da liberação de pesquisas com células-tronco, provavelmente os mais religiosos as recriminariam, alegando que o homem estaria mais uma vez “brincando” de Deus, enquanto os menos conservadores e menos apegados à religião provavelmente apoiariam tais pesquisas, ao crer que esse ato não seria ofensivo a qualquer tipo de manifestação religiosa. Além disso, ninguém pode negar que órgãos ou tecidos feitos in vitro poderão salvar milhões de vidas num futuro próximo.


Revolucionário. Moderno. Panacéico. Adjetivos não faltam para caracterizar a utilização de células-tronco para fins terapêuticos, uma técnica capaz de mudar o mundo da medicina regenerativa. As opiniões sobre o tema, porém, são sempre muito polêmicas e divergentes, como pode ser evidenciado nas charges abaixo – o propósito das charges é o de deixar o assunto mais descontraído. O primeiro cartunista é visivelmente contra as pesquisas com células-tronco, enquanto o segundo as defende veementemente.




Trago à tona essa questão porque Eiraku e colaboradores conseguiram, pela primeira vez, gerar retinas inteiras de camundongos em laboratório, o que os possibilitou estampar seu trabalho na capa da nature desse mês (aqui). A partir do cultivo de células-tronco embrionárias na presença de fatores de crescimento, o ectoderma e o neuroepitélio tornam-se mais espessos e sofrem invaginação para formar a retina primitiva (optic cup). A camada mais externa origina o epitélio pigmentado da retina, e a camada mais interna origina a retina neural, que é formada por fotorreceptores, interneurônios e células ganglionares (ver figura abaixo).


Retorno, portanto, à questão levantada no início do texto: há limites para a ciência? Vou além: a pesquisa está no caminho certo? A religião deve mesmo intervir em questões científicas? O transplante de órgãos e tecidos produzidos em laboratório pode gerar complicações para o transplantado? As interrogações são muitas, as respostas são poucas, mas entre as concepções estabelecidas pela igreja e aquelas estabelecidas pela ciência, eu certamente fico com a ciência.


Post Scriptum: a intenção do post não é disseminar a cizânia entre religiosos e céticos, mas sim discutirmos acerca de princípios éticos que norteiam a pesquisa e dos possíveis benefícios que a medicina regenerativa trará para a população.


Post de Tiago Medina - FMRP: IBA

quinta-feira, 21 de abril de 2011

FELIZ PÁSCOA, IMUNOLOGISTAS

… E assim chega a Páscoa! Eu não sei pra vocês, mas a minha impressão é que as serpentinas do carnaval ainda estão no ar. A quaresma voou, mas que venham os ovos de chocolate, nada mal. Todo mundo sabe que o chocolate é feito do cacau, maravilha. Ele é considerado medicinal tendo diversas aplicabilidades, como ajudar no ganho de peso (sem dúvidas); aumentar o HDL; diminuir a peroxidação do LDL; estimular o sistema nervoso, a atividade do estômago e rins; tratar febre, tuberculose, fadiga mental, baixar a virilidade e melhorar a anemia. O cacau, logo, o chocolate, é rico em flavonóides, compostos secundários das plantas envolvidos na proteção contra radiação UV e ataque de patógenos (opa! Tá começando a ficar interessante). Um dos flavonóides do momento é a epicatequina, esse composto é um potente antioxidante e se acumula nos órgãos linfóides (timo, baço, linfonodo e fígado) depois de uma dieta rica em cacau (para os chocólatras lê-se “dieta rica em chocolate”). O aumento de antioxidantes nos órgãos linfóides pode modular a funcionalidade de leucócitos por meio da regulação da secreção de mediadores inflamatórios, e ainda há estudos que sugerem que a dieta em questão favorece a resposta Th1 e aumenta a quantidade de linfócitos T γδ. Há controvérsias, e os mecanismos envolvidos nessas atividades ainda são desconhecidos, mas eu aposto que tem muita gente querendo ser cobaia no estudo.

Ciência a parte, a intenção do post é diminuir a culpa pós-ovos-de-Páscoa

Enjoy!

Manuela Sales – USP FMRP/IBA

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Keystone Symposia: novas discussões sobre Immunoregulatory Networks



Foram mais de 26 horas de viagem de porta a porta, contado o tempo de voos, de aeroporto e os trajetos terrestres. Chegamos ao charmoso vilarejo de Brekenridge (Colorado), cercado por montanhas com florestas de pinheiros e picos nevados, e com suas casinhas coloridas de madeira, ainda “confeitadas” pela neve que resistia à chegada da primavera. Este ano o inverno teve muita neve. Assim, o clima de de ski continuava a todo vapor em Brekenridge!

Não sendo frequentadora de estações de ski, fiquei surpresa com o clima animado de brincadeiras, no “sobe e desce” das montanhas nevadas, com pessoas até fantasiadas, como se fosse um carnaval na neve. Imaginem que tinha uma pessoa fantasiada de gorila com os skis nos pés, e outro bem corajoso de bermuda e um colete aberto no peito sem camiseta (isso mesmo!!).


Foi o meu primeiro simpósio de Keystone em Immunoregulatory Networks.
Fomos eu e meu aluno Hernandez Silva, levando nosso trabalho sobre as células B na tolerância operacional, e lá encontramos meu ex-aluno Pedro e Enio, outro aluno do ICB-USP. Também foi uma alegria reencontrar meu grande amigo Juan Lafaille, grande cientista que tem contribuído de forma importante para o conhecimento sobre as células Treg.

A reunião foi muito boa e instigante!
Para quem não conhece, os Keystone Symposia têm uma longa história, com início nos anos ’70, então chamados de California Membrane Conference. Passaram por várias mudanças e tiveram diferentes nomes, como Keystone Symposia on Molecular and Cellular Biology (1990). Desde 1997, os Keystone Symposia funcionam como uma organização sem fins lucrativos, dedicados à promoção de conferências científicas de alto padrão, em todas as áreas das ciências biológicas e biomédicas . Vale a pena procurar algum de seu interesse e participar!

Mas, vamos à nossa reunião!
O formato da reunião privilegia o debate científico e a apresentação de dados não publicados. Não é permitido fotografar ou gravar as apresentações e sessões de pôsteres, visando justamente deixar os palestrantes mais à vontade para mostrar seus dados não publicados. Pouco mais de 300 participantes. Sempre, muita discussão após cada apresentação. Sessões de pôsteres muito animadas, com muita discussão, até passando das dez da noite. Foi uma reunião basicamente com cientistas dos Estados Unidos; pouquíssimas apresentações orais de outros países, Inglaterra, Alemanha, Suíça.

A proposta desta reunião específica em Immunoregulatory Networks foi, além de discutir os novos conhecimentos sobre as células T reguladoras, valorizar a discussão sobre outros componentes celulares e moleculares que contribuem para esta rede imunorreguladora e como essas conexões ocorrem. Parece-me ser este um momento em que há um enorme aprofundamento nos estudos das vias moleculares e, ao mesmo tempo, uma busca para compreender, de forma mais ampla, os múltiplos e complexos caminhos na rede de imunorregulação. Há um grande interesse sobre como eventos metabólicos, não exclusivamente imunológicos, podem ter grande impacto no direcionamento funcional das respostas imunes e nas vias imunorreguladoras.

Algumas apresentações que me chamaram atenção:

Diane Mathis (Harvard Medical School, EUA) abriu a reunião com Keynote Address falando sobre as células Tregs tissulares que infiltram diferentes tecidos, como a gordura, o músculo esquelético e outros. As Treg encontradas nos tecidos não considerados do sistema imune parecem ter diferentes propriedades moleculares das Tregs convencionais e interagem também com células do parênquima daquele tecido específico. Analisando as Tregs presentes no tecido adiposo, em modelos de camundongos ob (obese), seu grupo observou uma relação entre a diminuição de Treg na gordura e a resistência à insulina, sugerindo que a população de Treg da gordura tenha um papel neste processo patológico.

Jonathan Powell (Johns Hopkins University, EUA) fez uma palestra muito elegante abordando a desafiadora questão sobre como ocorre a integração molecular de múltiplos sinais do microambiente imunológico, determinantes no desfecho do engajamento do TCR e no direcionamento de diferentes fenótipos funcionais das células T. Seu grupo havia mostrado, anteriormente, que mTOR (Mammalian Target of Rapamycin, membro da família PI3-kinase) tem um papel fundamental na diferenciação das células T auxiliares. Na deficiência de mTOR as células T não se tornam efetoras e tornam-se células Treg FOXP3+. Utilizando modelos de camundongos com deleções específicas downstream nas vias de sinalização de mTOR, seu grupo verificou que a diferenciação de Th1 e Th17 é regulada pela via de sinalização mTORC1 dependente de Rheb, enquanto mTORC2 regula respostas Th2 e a geração de células CD8 efetoras. O papel de mTOR como uma via molecular integradora de sinais crucial no direcionamento de diferenciação de células T, função e metabolismo, parece abrir novos caminhos de investigação, sobre “tomadas de decisão” pelas células T e na resposta imune. A boa notícia é que o Powell fará esta mesma palestra no próximo congresso da SBI. Não percam!

Juan Lafaille (New York University, EUA) apresentou dados muito interessantes sobre diferenças moleculares entre as células Tregs naturais e as induzidas, em camundongos, e mostrou que a expressão de Neuropilina-1 (Nrp1) diferencia as naturais das induzidas. Parece haver uma cinética de expressão de Nrp1 nos timócitos Foxp3+ e a maioria das Tregs naturais Foxp3 hi expressam Nrp1. A função da Nrp1 nas nTreg ainda não é conhecida. Porém, foi discutido, após sua apresentação, que ela poderia atuar como um co-receptor para TGF-b. A boa notícia é que como a Nrp1 é expressa na superfície, pode ser útil para isolar as células T reguladoras naturais.



Foram muitas palestras interessantes e ótimas discussões. Assuntos para outros posts mais adiante. A minha sugestão é que vale a pena ficar de olho nos Keystone Symposia e fazer uma força para participar!


Transplantar e sincronizar

Texto publicado originalmente no site Ciência Hoje

Projetos desenvolvidos em escola municipal carioca visam levar aluno a entrar num laboratório com olhar de pesquisador e entender o que é a metodologia científica.
 

Alunos em volta da bancada no laboratório: na Escola Municipal Anísio Teixeira, 
a ideia é que o estudante entenda ciência em sincronia com o que está sendo pesquisado hoje. (foto: divulgação)

Anísio Teixeira (1900-1971) é um dos educadores brasileiros mais respeitados e conhecidos. Foi um dos fundadores da Escola Nova, proposta do início do século passado que visava, entre outros tópicos, fomentar nos alunos uma maior capacidade de refletir sobre o que se aprendia – em vez de apenas memorizar o conteúdo.

Não à toa, dezenas de escolas pelo Brasil chamam-se Anísio Teixeira. E é em uma "Anísio Teixeira" que ocorre, há dois anos, uma lenta e gradual transformação da relação do aluno com a ciência.
O pontapé inicial foi o projeto Transplantando, idealizado por Mário Alberto C. Silva Neto, professor do Instituto de Bioquímica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IBqM/UFRJ).

Em 2008, o comichão da ideia de transplantar as condições de um laboratório para dentro de uma escola atingiu Neto, que já participava ativamente do Curso de Férias promovido pela UFRJ para alunos do ensino básico. A falta completa de tempo para tocar o projeto fez com que ele tomasse a atitude mais prática possível.

"Pensei que, para o projeto andar, só haveria uma possibilidade: desenvolvê-lo em uma escola próxima de onde moro. E assim fiz", conta o professor, que vive no bairro da Ilha do Governador (RJ), onde também se encontra a Escola Municipal Anísio Teixeira.

Para a sorte de Neto, a Anísio Teixeira tinha uma diretoria totalmente aberta à sua ideia. No ano seguinte, o Transplantando já estava na escola.

Dezenas de alunos passaram a usufruir de um laboratório com boa estrutura para estudar e com professores aptos a ensinar. A temática? Tudo o que o aluno tem curiosidade de perguntar, mas com foco na área em que o bioquímico (e sua equipe) é especialista: as doenças tropicais transmitidas por insetos hematófagos. Em especial, a dengue.

Assista abaixo à conversa com Leonardo Cunha, 

doutorando de Neto e responsável pelas aulas do Transplantando


A ideia do Transplantando vingou e, também em função do projeto, a Anísio Teixeira foi uma das dez escolas selecionadas para fazer parte em 2011 do Ginásio Experimental, iniciativa da prefeitura do Rio de Janeiro que prevê, justamente, a adoção de novas metodologias de ensino e o uso de tecnologia e experiências em sala de aula.

Alinhados ao Ginásio Experimental, os bioquímicos Neto, Leonardo Cunha e cia. propuseram à escola mudar o projeto de ciências de patamar. Agora, em vez de apenas transplantar o laboratório, eles querem sincronizar aquilo que é discutido no meio acadêmico e de pesquisa com o que é falado na escola.

Por isso, começou, no início deste ano letivo, uma nova proposta: o Sincronizando, que, nas palavras de Neto, "vai possibilitar, por exemplo, que o aluno discuta dentro do laboratório, como um pesquisador de verdade, um artigo que acabou de sair na Science ou na Nature".
Se vai sair algum novo cientista desse empreendimento do pessoal da bioquímica da UFRJ? Não se sabe. Mas já dá para dizer: as aulas serão mais divertidas e instigantes.

Assista à conversa que o Alô, Professor teve com Bárbara Portela, 

professora responsável pelo projeto Sincronizando


terça-feira, 19 de abril de 2011

Aí todo mundo volta

Quando a gente chega logo no estrangeiro, a gente cria duas listas. Uma lista do que a gente não gosta, tipo: aqui falta jabuticaba, amigo, cuscuz, pai, mãe, queijo de coalho, praia, cachaça, conversa mole, e sobra distancia no trato, comida pasteurizada, gente fresca, e um frio de cortar osso, etc. A outra lista é a do que a gente gosta, tipo: aqui é seguro, as ruas são limpas, o lab é bom, estou aprendendo muito. A primeira, a do que não se gosta, é enorme no começo. Com o tempo as listas mudam de tamanho. Isso é verdade em São Paulo, Berlim, Paris ou Nova Iorque.
O que faz que as pessoas voltem ou fiquem é o balanço das listas. Eu fiquei porque gostava das condições de trabalho, o que suspeito ter sido a razão principal pras outras pessoas ficarem tambem. Afinal nunca ninguém me disse que tinha ficado aqui por causa de George Bush, porque os gringos são mais safos, ou porque o sorvete de mangaba daqui é melhor do que o da Frisabor.
Não vim pensando em ficar. Fiquei porque gostei do jeito de viver a vida cientifica aqui, não fiquei por salario (mais ai embaixo). Fiquei por condições de trabalho. Fiquei aqui tambem porque não existia no Brasil de 88, quando terminei meu doutorado, um lugar onde pudesse trabalhar no que aprendi. Daria pra contar nos dedos os lugares onde se fazia biologia molecular no Brasil daquela época, e não havia, como não há até hoje, um lugar onde se pudesse fazer um camundongo (assunto ja tratado aqui nesse blog).
Fiquei pelo aspecto aberto da cultura científica americana, pela ausencia de donas Lurdinhas, pela mobilidade profissional, pela ausencia de livre docencia, de concurso arranjado, papelório, de currículo de 3 quilos, de salamaleque. Lembro que no meu primeiro dia de aula em La Jolla um aluno entrou de skate na classe e logo em seguida entrou o professor, de bermuda. Nunca, nunca na minha vida tinha visto isso. Não existia senhor, professor, existia voce.
Passei cinco anos estudando na California. Saí de la pra outro exterior, a costa leste. Outro ritmo, outra dinamica. Passei 3 anos e meio fazendo um postdoc, depois 11 anos em duas companhias farmaceuticas e estou há 9 anos numa escola de medicina em Nova Iorque. Vivo aqui mais do que vivi no Brasil, embora pense nele o tempo todo…Gosto daqui? Gosto sim, mas a vida aqui, apesar de muitas vantagens, tem suas batalhas tambem. Ninguem aqui leva a vida na flauta.
Pra comecar, a não ser que voce trabalhe pra uma instituicao muito rica, o academico voce depende - e muito - do Instituto Nacional de Saude (NIH). O NIH é uma especie de Cnpquezão, mas com um orcamento de 30 bilhões de dolares. A grant mais popular do NIH se chama R01. Ela basicamente é um projeto de pesquisa de 13 paginas. Uma vez pronto voce o envia para o NIH, onde a grant acaba sendo revisada mais em detalhe por 3 pessoas. Se eles te derem um bom score, voce passa para proxima fase, onde ela vai ser discutida por um grupo de 20-30 pessoas, as famosas Study Sections. Geralmente os cientistas levam em consideração a analise dos primeiros revisores, mas aqui e ali acontecem disputas, brigas, etc.
O seu salário como professor vem em parte de grants que voce tem. No meu caso a escola espera que eu traga 90% do meu salário das minhas grants. E o salário das pessoas no meu lab tambem vem dai. O salário e o seguro de saude, seguro dental, etc. Fora isso minhas grants tem que cobrir todos os gastos do meu lab, reagentes, camundongos, hotel de camundongo (sim, cada gaiola com 5 camundongos me custa 75 centavos de dolar por dia, uma pechincha comparado a outros lugares), pagar contrato de manutenção de equipamento, pagar pelo trabalho das unidades de histologia, citometria de fluxo, etc. Ou seja: pra viver como cientista voce tem que convencer as pessoas de que o que voce faz e’ importante. Voce é um empresario que vende ideias, projetos. Para a grande maioria das pessoas na área academica o emprego depende das ideias e da produtividade cientifica. Sem grant voce não tem emprego. Voce dança.
Antigamente eles te davam $250K por ano em direct costs mais 60-70% disso em adicionais (chamados indirect costs) pra universidade (sim, companheiros, isso e' uma especie de aluguel que nos pagamos a universidade pelo uso do telefone, solo, energia, agua, elevador, etc). Isso por cinco anos. Ao fim desses cinco anos voce submetia outro pedido, era examinado e em geral era renovado, se existia produtividade e a proposta era boa.
Hoje em dia estamos vivendo cortes em cima de cortes. Apenas uma pequena parcela consegue funding (na maioria dos casos menos de 15% das aplicações submetidas são aprovadas…pensem nisso…85% vai pro lixo). E quando se consegue funding ele vem mutilado, não é incomum ver R01 grants na faixa de $175k por 4 anos. O valor de $250k por ano não tem sido reajustado há decadas, apesar de uma inflacao enorme no custo operacional dos laboratorios.
Existe uma percepção por parte das pessoas no Brasil de que quem está fora tem vida melhor. Não necessariamente. Vejam: os cientistas brasileiros (na sua grande maioria professores universitarios) recebem um salário fixo, que não depende inteiramente de sua produtividade. Não pagam estudantes ou postdocs, não são responsaveis diretos pela situação trabalhista deles. Aqui tem em vantagens? Claro que tem, mas antigamente as vantagens eram maiores. Por exemplo, antigamente demorava 3 meses pruma revista chegar ai, quem morava aqui recebia na mesma semana. Hoje voces sabem do que esta acontecendo na mesma hora que um sujeito aqui. Ter dinheiro pra viajar era outra vantagem daqui. Ainda se viaja muito por aqui , mas hoje a situacao mudou...Antigamente não existia dinheiro pra viagens no Brasil. Hoje é bastante comum encontrar cientistas brasileiros fora, inclusive muitos estudantes. Tenho inveja, não tenho dinheiro pra mandar meus estudantes pra meetings internacionais. Outro engano é pensar que os salários aqui são muito melhores que os salários aí. Salário de cientista, com raras exceções, é pequeno. Aqui e em outros lugares. Na Europa então, dá pena. Se voce quiser ganhar dinheiro desista de ser cientista academico (não sou o primeiro a dizer isso…).
Sinto que algumas vezes existe um sentimento negativo em relação as pessoas que ficaram fora. Acho injusto. Afinal, muitos de nós que ficamos fora não deixamos de ser brasileiros, de amar o Brasil. Treinamos estudantes brasileiros, damos cursos, participamos dos congressos brasileiros, servimos como consultores do governo brasileiro, e ajudamos, muitas vezes pagando com nossas proprias grants, reagentes para nossos colegas. Outros de nós, como Miguel Nicolelis, põem bastante esforco em criar centros aí, o que é uma iniciativa realmente admirável, independente do seu ponto de vista político.
Talvez antes de tudo a gente devesse perguntar se existiria uma forma de treinar as pessoas no que existe de mais avançado e de lhes dar condições ideais de trabalho ao voltar. Somos campeões universais em identificar problemas ou explicar porque as coisas não funcionam direito. Talvez fosse hora de procurarmos soluções. Não nos orgulhamos de ser um povo criativo? Porque não podemos usar essa criatividade para encontrar soluções nessa area? Pra comecar, porque não nos organizamos melhor? As pessoas que eram líderes universitários na minha época, e que interrompiam nossas aulas com palavras de ordem, exigindo melhores condições de ensino, de educação, estão no poder. Essas pessoas devem ser pressionadas pelos estudantes, pelos professores. Precisamos de mais debates, mais cobrança.
Precisamos de investimento maciço em educação, ciencia e tecnologia. Estamos no clube dos chineses no papel, mas ainda não estamos na prática… Consideremos o gasto parametro de publicações na revista Nature. Quando cheguei aqui tinha muito chines de primeiro autor nos papers dos americanos que publicavam ali. Na decada de 90 eles ja pintavam de último autor nos papers, mas estavam em instituições americanas. Hoje a gente já começa a ver chines de primeiro e ultimo autor em universidades ou centros de pesquisa chineses. O proximo passo vai ser ter ocidental de primeiro autor... Não vai demorar muito... Foi igualzinho com o Japão...
Então, vamos aprender com os chineses. Vamos nos concentrar em aumentar a percentagem do PIB em ciencia. Vamos seguir o exemplo de Israel que põe mais de 4% do PIB em ciencia. Vamos melhorar o que já existe, e vamos criar outros institutos de ponta, sem grades nas janelas, sem bode de importação, sem dona Lurdinha.
Aí todo mundo volta.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Efeitos Biológicos do CD40 Ligante Solúvel (sCD40L)

A interação entre a célula T efetora e as células da resposta imune tanto inata (macrófagos) como adaptativa (linfócitos B) depende do sinal co-estimulatório CD40/CD40L. O CD40L é uma proteína transmembrana da família dos fatores de necrose tumoral, que está presente nos linfócitos T ativados e interage com outra proteína de membrana, a CD40 (Hollenbaugh et. al., 1992; Marques, 2008; Davidson et al., 2011). Esta interação é crucial para a ativação de mecanismos microbicidas de macrófagos, importante para a proteção contra agentes intracelulares. Camundongos knockout para CD40L ou IFN-γ são altamente susceptíveis a doses subletais de espécies de micobactérias e leishmanias . A interação do CD40-CD40L também tem seu papel na regulação da resposta imune, através de sua ação sobre as células apresentadoras de antígenos amplifica a apresentação de antígenos e maior ativação, proliferação e diferenciação dos linfócitos T (Grewal 1995). Se houver uma falha nessa interação entre CD40 e CD40L, portanto, a resposta imune tende a ser alterada, e os macrófagos, linfócitos ou células dendríticas podem não ser corretamente estimulados.

O CD40L está presente em linfócitos B, células apresentadoras de antígenos, mastócitos, plaquetas e células endoteliais (Pamukcu et al., 2011; Heeschen et al., 2003, Henn et al., 1998). O CD40L das plaquetas ativadas induzem as células endoteliais a secretar quimiocinas e expressar moléculas de adesão para o recrutamento de células inflamatórias causando lesão de células endoteliais. A ligação de CD40L com células endoteliais podem mediar o remodelamento vascular e a neoformação vascular durante reações imunológicas crônicas (Henn et al., 1998; Yellin et al., 1995).

Sabe-se que a proteína CD40L possui uma forma solúvel, o sCD40L, formado a partir da sua clivagem (Graf et al., 1995; Marques, 2008). Da mesma forma que sua proteína originária, o sCD40L recebeu enfoque em pesquisas de doenças cardíacas, onde foi apontado como marcador de atividade trombótica e inflamatória em pacientes com síndrome coronariana aguda (Heeschen et al., 2003) (Antoniades et al., 2009), e como fator de desestabilização de placas de gordura por induzir a produção de citocinas, quimiocinas e fatores de crescimento (Henn et al., 2001). Nas doenças infecciosas ainda não está clara se a interação entre o sCD40L modularia a resposta imune positivamente ou negativamente, ou poderia favorecer um determinado padrão de resposta imune celular ou humoral, por ativar seletivamente macrófagos ou linfócitos B, o que poderia afetar a evolução das doenças. Foi demonstrado que o sCD40L inibe a produção de anticorpos de in vitro e a reação mista de linfócitos (Contin C. et al, 2003, Xi Bao Yu, 2005). Além disso há uma correlação direta entre as concentrações séricas de sCD40L e uma deficiência na resposta á vacinação para hepatite B em pacientes urêmicos (Contin C. et al, 2003). A adição de IFN-γ associado a sCD40L em monócitos humanos induz a produção de IL-12. Porém a pré incubação destes monócitos com sCD40L inibe a produção de IL-12, mesmo após estimulação por IFN-γ associado a sCD40L. Estes dados sugerem que o sCD40L pode ter ação supressora em monócitos não ativados ou podem ter ação estimuladora na presença de IFN-γ (Kapp, A et al, 2002).

Concentrações elevadas de sCD40L foram detectadas em pacientes com sepse e são associadas com a mortalidade desses paciente. Dessa forma, os autores sugerem que o bloqueio do sCD40L poderia ser utilizado como uma nova droga para o tratamento da sepse grave. Entretanto, em estudos com humanos e animais o uso de anticorpo contra CD40L foi associado com ativação plaquetária e complicações tromboembólicas. Foi também detectado um aumento de sCD40L em Alzheimer (Alt-Ghezala, G et al, 2008). No entanto, na tuberculose o sCD40L foi significativamente maior nos pacientes que responderam rapidamente ao tratamento comparados ao que tiveram uma resposta mais lenta ao tratamento, podendo ser usado como um potencial biomarcador de resposta ao tratamento e ainda permitir a identificação precoce dos rápidos e lentos respondedores ao tratamento.

Foi relatado por Antoniades et al. (2009) que sCD40L pode ter seu nível diminuído por alguns fármacos como as estatinas, IECAs e a terapia antiplaquetária, já que plaquetas ativadas produzem e liberam grandes quantidades de sCD40L (Henn et al., 2001). Estudos mostraram que sua concentração também está aumentada no plasma e no líquido cefalo-raquidiano de indivíduos infectados por HIV-1, onde o ácido valpróico conseguiu reduzir seus níveis de concentração (Davidson et al., 2011).

No entanto, não há muitos estudos realizados na área da interação entre sCD40L e doenças parasitárias. Não se sabe ao certo seu comportamento durante a evolução dessas doenças nem o seu efeito na regulação da resposta imune a estes patógenos. Estes conhecimentos poderão trazer perspectivas para avaliação do prognóstico dessas doenças e gerar novas abordagens terapêuticas.

Roque Almeida, Amelia de Jesus e Tatiana Moura