quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Desenvolvimento da asma grave: mecanismos que vão além da resposta Th2 exacerbada



Por muito tempo, foi de consenso geral entre os pesquisadores que a asma era resultado do desenvolvimento de resposta Th2 exacerbada. Porém, o que sempre intrigou o mundo da ciência foi a maneira simplista de caracterizar uma doença com espectro clínico tão variável. Como aquela mesma resposta Th2 exacerbada poderia desencadear tanto asma branda como asma grave? Não havia mesmo distinção da resposta imune desenvolvida durante a asma branda daquela desenvolvida durante a asma grave?

Com esse questionamento arraigado na cabeça, Lajoie e colaboradores (nature immunology, outubro de 2010) começaram a desvendar o que havia de diferente na resposta imune durante a asma grave daquela desenvolvida durante a asma branda. Utilizando camundongos A/J e C3H/Hej, os quais, após serem expostos a extrato de ácaro, desenvolvem asma grave e asma branda, respectivamente, foi observado que camundongos A/J apresentaram resposta Th2 exacerbada concomitantemente com aumento no número de células Th17 e na produção de IL-17, enquanto aqueles que desenvolvem asma branda – camundongos C3H/Hej – apresentaram produção elevada de citocinas Th2, com produção mínima de IL-17.

O aumento na produção de IL-17 em camundongos A/J foi necessário para o intenso recrutamento de neutrófilos para o pulmão, o que certamente contribuiu para o dano tecidual observado nos camundongos com asma grave. Para comprovar que a presença de IL-17 agrava a doença, foi administrada IL-17 recombinante em camundongos naturalmente resistentes à asma grave (C3H/Hej), com posterior análise da função pulmonar. A presença da IL-17 nos camundongos C3H/Hej tornou-os suscetíveis, visto que houve aumento na hiperresponsividade das vias aéreas destes camundongos, medida indicativa do comprometimento da função pulmonar.

Uma característica peculiar dos camundongos A/J é a deficiência da anafilotoxina C5a, proteína que compõe o sistema complemento. Partindo desse pressuposto, Lajoie e colaboradores mostraram que a ausência de C5a no soro está intimamente associada com o aumento do número de células Th17 e produção elevada de IL-17, e que o bloqueio de C5a em camundongos BALB/c também aumenta a produção de IL-17 e compromete a sua função pulmonar, tornando-os suscetíveis à asma grave.

Esses resultados nos remetem a uma outra dúvida: como C5a exerceria suas funções sobre a diferenciação de células Th17? Estaria mesmo C5a regulando a produção de IL-17? A fim de solucionar essa importante questão, Lajoie e colaboradores analisaram a produção de citocinas envolvidas com a diferenciação de células Th17. As células dendríticas de camundongos A/J produziram mais IL-23 e IL-6 do que as de camundongos C3H/Hej, indicando que a ausência de C5a aumenta a produção das citocinas envolvidas com a diferenciação de células Th17.

C3a, outra importante anafilotoxina do sistema complemento, exerce funções diametralmente opostas às exercidas pelo C5a. Estaria, então, C3a participando da diferenciação de células Th17 na asma grave? Células dendríticas de camundongos deficientes de C3a também apresentaram menor produção de IL-23 e de IL-6, o que nos fornece indícios de que a presença de C3a induz maior diferenciação de células Th17, contribuindo para o aparecimento de asma grave.

Além da resposta Th2, Lajoie e colaboradores concluíram que outros fatores contribuem para o agravamento da doença, como aumento da produção de IL-23 e IL-6 por células dendríticas via produção de C3a, o que culmina com aumento do número de células Th17 e aumento da neutrofilia pulmonar. Os neutrófilos parecem ser os grandes vilões durante a indução da asma grave, uma vez que estas células são responsáveis por intensa destruição tecidual nos pulmões. Este trabalho quebra o paradigma de que toda e qualquer manifestação clínica da asma é caracterizada somente pela resposta Th2 exacerbada. Este conceito clássico parece definir com precisão o que acontece na asma branda, mas não pode ser empregado para os casos de asma grave.

Post de Tiago Medina - Doutorando FMRP-USP

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