Blog da Sociedade Brasileira de Imunologia (SBI). O blog é voltado para temas de interesse dos sócios da SBI, mas aberto à toda a comunidade. Além de comentários sobre artigos, congressos e reuniões no tema da imunologia, o SBlogI trata de assuntos gerais de ciência e educação cientíifica. Este blog é seu. Comente, discuta, concorde - ou discorde!
quarta-feira, 22 de setembro de 2010
Tá na rede: Zebrafish Como Modelo de Estudo da Imunidade Inata e Adaptativa.
Seguindo no tema levantado na sexta-feira de imunologia evolutiva, a relevância e o poder de estudos em peixes teleósteos, mais especificamente, no pequeno paulistinha/zebrafish (Danio rerio) é cada vez maior. Sua alta progênie (em torno de 100-200 ovos por fêmea grávida, por semana), faz destes animais poderosas ferramentas para estudos genéticos, e sua susceptibilidade ao tratamento administrado na água dos tangues de criação torna esses animais um ótimo modelo para estudos de toxicidade e screening de novas drogas e compostos. Tão valiosas quanto estas características são o desenvolvimento embrionário extra-uterino e a transparência do animal, que permitem observar desde muito cedo no seu desenvolvimento o aparecimento e migração de tipos celulares específicos através da marcação genética/fluorescente destas células, seguida de observação em tempo real.
No entanto, o zebrafish não era visto como um bom modelo para estudos imunológicos devido a falta de conhecimento e ferramentas para esses tipos de estudos. A disponibilidade de anticorpos para antígenos de peixe é extremamente limitada, e até pouco tempo se sabia muito pouco sobre a correlação entre as células imunes de teleósteos e as de mamíferos. Na última década muito avanço foi feito nessa área, e o peixe ósseo se torna cada vez mais um modelo atraente, uma vez que são os organismos mais primitivos providos de células T e células B, dando uma visão das características básicas necessárias para o desenvolvimento da resposta imune adaptativa, e da comunicação destas células com células da imunidade inata. Sem falar na facilidade de desenvolver estudos genéticos, quando comparado ao modelo padrão, os camundongos.
Em conjunto com o artigo de Zhang e colaboradores (2010) já discutido na última sexta-feira, vale ressaltar mais dois artigos recentes, ambos provenientes do grupo do Dr. David Traver, da University of California, San Diego, que vêm expandir nosso conhecimento sobre a imunologia no peixe, sua correlação e similaridades com o sistema mamífero.
No primeiro artigo, publicado em agosto desse ano na revista Blood (10.1182/blood-2010-03-267419), Balla e colaboradores descrevem morfológica e funcionalmente a população de eosinófilos em zebrafish. Eles mostram que o desenvolvimento de eosinófilos no peixe é similar ao descrito em mamíferos, e precursores com as mesmas características morfológicas podem ser isolados. Células imaturas estão presentes no sítio hematopoético do peixe adulto, o parênquima renal, e células mais maduras podem ser encontradas na cavidade peritoneal destes animais. Apesar de algumas proteínas características de mamíferos, como a peroxidase eosinofílica e a proteína básica principal, não serem encontradas em eosinófilos de zebrafish, os eosinófilos (gata2-hi, CCR9+) de peixe respondem com degranulação a antígenos provenientes de helmintos quando estimulados in vitro, e infecção por este patógeno leva a hipereosinofilia in vivo, assim como descrito inicialmente em modelos mamíferos. Estes resultados demonstram que não só o desenvolvimento, mas também funções características de eosinófilos são conservadas evolutivamente de teleósteos a humanos.
No segundo artigo, Lugo-Villarino e colaboradores, trabalho que conta com a participação da Miriam Werneck (INCa, FIOCRUZ), identificam e caracterizam células dendríticas em Danio rerio. Apesar de alguns indícios em outros teleósteos sugerirem a existência de células dendríticas tão cedo na escala evolutiva, estas células ainda não haviam sido isoladas ou testadas seletivamente. Neste artigo publicado em Setembro no PNAS (10.1073/pnas.1000494107), os autores isolam células que possuem as características morfológicas e de microestrutura semelhantes a células dendríticas de mamíferos se aproveitando de sua capacidade fagocítica e da composição glicoprotéica de sua superfície. Através do sorteamento e ensaios in vitro, é demonstrado que a população de células apresentadora de antígenos enriquecida desta forma é capaz de estimular uma resposta proliferativa de células T antígeno-específica, células estas que expressam proteínas características de APCs como MHC de classe II e IL-12 p40. A identificação de células dendríticas neste modelo determina que estas células estão presentes por tanto tempo quanto os linfócitos T e B, reiterando seu papel como conector entre as respostas inata e adaptativa.
Vale, então, ficar de olho nos desenvolvimentos desta área que está cada vez mais ativa e crescendo dentro da imunologia mundial. O paulistinha/zebrafish é um novo modelo que traz características únicas e complementares ao modelo murino. A facilidade de desenvolver e analisar screenings genéticos usando mutagênese induzida, ou de rastrear a migração de células após insulto antigênico em tempo real são pontos fortes que serão cada vez mais explorados nos próximos anos.
Muito bom Patricia!
ResponderExcluirSerá que desenvolveram modelos de infecção microbiana/parasitária nesse peixe? Se tiver será um ótimo modelo para estudar imunobiologia. Principalmente, como voce bem disse, por conta da facilidade de realizar screenings genéticos.