sábado, 22 de maio de 2010

O sistema de contratação e avaliação de professores e pesquisadores

A imunologia brasileira tem um papel destacado na produção científica nacional, sendo responsável pela publicação de artigos em revistas respeitadas e com fatores de impacto de médio a elevados. Via de regra, a publicação nestas revistas tem requerido mais e mais a caracterização de mecanismos moleculares, o que depende de expertise, instrumental e insumos. É fundamental investirmos em estudos que visam o esclarecimento de mecanismos. Neste sentido, observamos claramente um abismo entre a imunologia que fazemos e aquela feita em diversos centros de pesquisa mundo a fora. Alguns aspectos que dificultam ou impedem atingir patamares de qualidade elevados tem sido freqüentemente discutidos. Há consenso quanto à importância da maior agilidade nos processos de importação, de biotérios que forneçam animas selvagens e transgênicos livres de patógenos específicos (SPF), do financiamento de projetos individuais de maior monta e com maiores prazos, e do estabelecimento e manutenção de estruturas multiusuários nas instituições de pesquisa. Também estamos vendo uma discussão mais intensa nas nossas pós-graduações, no CNPq e na CAPES, sobre enfatizar a qualidade das publicações e não tanto o número de artigos. Me parece razoável supor que dada a importância destes aspectos e a natureza consensual do diagnóstico, em um prazo não muito distante, estes e outros pontos serão atacados de forma mais eficiente.
Uma questão em particular parece menos consensual, o sistema de contratação e principalmente de dispensa de professores e pesquisadores. Nos últimos anos temos observado que os concursos são cada vez mais disputados, havendo indiscutivelmente um grande número de pessoas muito bem qualificadas disputando as vagas nas diversas instituições publicas brasileiras. Em geral, os concursos são corretos, com bancas altamente qualificadas e pouca ingerência institucional no trabalho das bancas. Podemos questionar se o sistema de avaliação com provas e aulas teóricas e avaliação do Curriculum Vitae/memorial é o mais adequado para a contratação de professores/pesquisadores. Apesar da idoneidade do processo de avaliação, ainda há no Brasil uma grande tradição endogenista. A contratação de pesquisadores egressos das próprias pós-graduações ou que tenham feito pós-doutorado nestas instituições é uma prática comum ou talvez até hegemônica. Acredito que evitar esta prática aumentaria a independência dos pesquisadores recém-contratados. Considerando a grande competição destes concursos, tem havido uma mudança gradual no perfil dos aprovados. Cada vez mais vemos que pesquisadores que retornam de pós-doutorados no exterior são mais competitivos nestes concursos. Com isso vemos uma tendência de reduçao da endogenia.
Ao entramos nas instituições públicas recebemos um aval de 30 à 35 anos de estabilidade como funcionários públicos. É verdade que existe um período probatório de 3 anos. Entretanto, este período é absurdamente curto para avaliar o desempenho de um pesquisador se estabelecendo em uma instituição de pesquisa. Esse período é ainda mais irrisório ao considerarmos que a maioria das instituições não oferece um enxoval para os pesquisadores recém-contratados (laboratório, equipamentos e insumos). As instituições solicitam vagas, contratam mais professores, mas não oferecem condições de trabalho adequadas. Talvez em função disso, as instituições também não cobrem desempenho. Uma solução seria o investimentos em laboratórios intermediários. Neste sistema, as instituições disponibilizam laboratórios coletivos e equipados, que permitam aos novos pesquisadores o estabelecimento precoce de suas linhas e grupos de pesquisa próprios. O financiamento destes laboratórios viria da própria instituição em parceria com as agências de fomento federais e estaduais. O período probatório deveria ser estendido para algo como 5 anos, com a possibilidade de uma renovação. Portanto, apos cerca de 10 anos haveria uma avaliação para a fixação definitiva do pesquisador. Nos próximos anos o Brasil vai ter mais recursos, mais profissionais capacitados e mais instituições de pesquisa. É hora de pensar mais seriamente não questão da estabilidade do emprego no funcionalismo público em instituições de ensino e pesquisa que se pretendem de excelência.

Um comentário:

  1. Marcelo,
    Você toca em três pontos fundamentais: endogenia, sistema de concurso e a fase de estabelecimento dos jovens pesquisadores. Gostei muito das suas sugestões no terceiro tópico.
    Quanto à endogenia, a situação é bem crítica. Mesmo no pós-doutoramento é muito alta a taxa de permanência com no mesmo grupo. A mim me parece que a nossa comunidade não acredita, na prática, nos problemas da endogenia, embora continue a repetir este discurso. Se for este o caso (distância entre discurso e prática) a situação é muito difícil de reverter, afinal são os pesquisadores que tomam decisão sobre a concessão de bolsas nas agências.
    Os concursos são um problema ainda maior, mesmo porque inclui a endogenia e soma vários outros fatores. Os pontos são tantos que creio inapropriado para um comentário, merece um post inteiro e específico. Alguns aspectos, como o estabelecimento de perfis vagos, pois não há um planejamento e visão de futuro dos departamentos e grupos de pesquisa e o formato medieval dos concursos, precisam ser revistos logo.

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